No pedido ao
Supremo Tribunal Federal para abertura de inquérito criminal contra quadros
históricos do PMDB, procurador-geral da República atribui aos aliados do
presidente Michel Temer 'atuação planejada' contra a Lava Jato
Valmar Hupsel
Filho, Mateus Coutinho e Fausto Macedo
O Estado de
São Paulo
Ao pedir
autorização do Supremo Tribunal Federal para a instauração de inquérito
destinado a apurar o crime de embaraço à Operação Lava Jato – formalmente embaraço
à Justiça – supostamente cometido pelo ex-presidente José Sarney, os senadores
do PMDB Renan Calheiros (AL) e Romero Jucá (RO), e o ex-presidente da
Transpetro, Sérgio Machado, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, se
refere ao grupo como ‘quadrilha’ e ‘organização criminosa’.
“Está em curso
um plano de embaraço da investigação por parte de integrantes da quadrilha e
seus associados. Como só acontece em organizações criminosas bem
estruturadas, o tráfico de influência é apenas uma das vertentes utilizadas por
esses grupos”, afirma Janot.
No documento,
Janot afirma que a atuação da Lava Jato, que resultou na prisão de dezenas de
pessoas e recuperação de milhões em dinheiro desviado, gerou “grande
preocupação de todos os integrantes da organização criminosa”. “Esse temor, no
caso do núcleo político, gestou um plano para obstrução da Operação Lava Jato,
com a utilização desvirtuada das funções e prerrogativas do Poder Legislativo,
cooptação do Poder Judiciário e desestruturação, por vendita e preocupação
contra futuras atuações, do Ministério Público”, afirma o procurador no
documento.
Segundo o
procurador-geral, houve uma “atuação planejada e concentrada de congressistas”
para, entre outras coisas, dificultar que investigados e réus celebrem acordos
de colaboração premiada, rever e reduzir os poderes do Ministério Público e
anistiar agentes públicos envolvidos. Janot também descreve a atuação do grupo
para tentar exercer tráfico de influência junto ao então ministro relator das
ações penais no Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki.
O pedido se
fundamentou no termo de colaboração premiada assinado por Machado, no qual são
transcritos trechos de mais de seis horas de conversas gravadas com Sarney,
Jucá e Renan. Para o procurador, as conversas “demonstram a motivação de
estancar e impedir, o quanto antes, os avanços da Operação Lava Jato em relação
a políticos, especialmente do PMDB, do PSDB e do próprio PT, por meio de acordo
com o Supremo Tribunal Federal e da aprovação de mudanças legislativas'”.
Segundo o
procurador-geral, o objetivo dos congressistas era ‘construir uma ampla base de
apoio político para conseguir, pelo menos, aprovar três medidas de alteração do
ordenamento jurídico em favor da organização criminosa’ – 1) proibição de
acordos de colaboração premiada com investigados ou réus presos; 2) a proibição
de execução provisória da sentença penal condenatória mesmo após rejeição dos
recursos defensivos ordinários, o que redunda em reverter pela via legislativa
o julgado do STF que consolidou esse entendimento; 3) e a alteração do
regramento dos acordos de leniência, permitindo celebração de acordos
independente de reconhecimento de crimes.
Janot
argumenta que há ‘elementos concretos de atuação concertada entre
parlamentares, com uso institucional desviado, em descompasso com o interesse
público e social, nitidamente para favorecimento dos mais diversos integrantes
da organização criminosa”.
COM A PALAVRA,
O SENADOR RENAN CALHEIROS (PMDB/AL)
Por meio de
sua assessoria, o senador afirmou.
“O senador
Renan Calheiros esclarece que não fez nenhum ato para embaraçar ou dificultar
qualquer investigação e que sempre foi colaborativo, tanto que o Supremo
Tribunal Federal já manifestou contrariamente à pedido idêntico.”
COM A PALAVRA,
O CRIMINALISTA Antônio Carlos de Almeida Castro Kakay, defensor do senador
Romero Jucá e do ex-presidente José Sarney
O criminalista
Antônio Carlos de Almeida Castro Kakay, defensor do senador Romero Jucá e do
ex-presidente José Sarney, avalia que se houve crime este teria sido praticado
pelo ex-diretor da Transpetro Sérgio Machado, autor das gravações que dão
sustentação ao pedido de inquérito do procurador-geral da República Rodrigo
Janot, que atribui aos peemedebistas suposta obstrução à Operação Lava Jato.
“Eu acho que
esse pedido é um pouco consequência, quase que natural, daquele pedido de
prisão (dos peemedebistas) que foi feito (por Rodrigo Janot) e que foi um
fiasco. Nas gravações realizadas por Sérgio Machado não tem nenhum sinal de
qualquer tentativa de obstrução. Temos que fazer uma reflexão mais profunda
sobre essa hipótese de tudo ser obstrução à Lava Jato.”
“Quando se
discutia a Lei de Abuso da Autoridade os procuradores foram ao Congresso e
alardearam que estava havendo obstrução da Lava Jato. Ora, o projeto é de 2009,
a Lava Jato nem existia. Depois, quando se criticava a prisão (de condenados)
em segunda instância também vieram os procuradores e alegaram que isso iria
paralisar a Lava Jato. Quer dizer, a Lava Jato é importantíssima, seus
resultados são fantásticos, mas o País existe também fora da Lava Jato.”
“Pegar
senadores discutindo modificação legislativa, que é a função deles, e dizer que
estão tramando contra a Lava Jato é o mesmo que três ou quatro advogados
criticarem a operação e, por isso, serem acusados de obstruírem a Justiça. Se
algum jornalista fizer um olhar mais crítico à Lava Jato vão dizer que ele quer
obstruir a Lava Jato.”
“Vivemos um
momento crítico. É coisa grave. Virou um país monotemático.”
“Não existe
naquelas gravações (de Sérgio Machado) qualquer tentativa de obstrução à Lava
Jato. Passa mais perto do crime a atitude de Sérgio Machado, de gravar
ilegalmente (as conversas com Jucá, Sarney e Renan). Não vejo no conteúdo das
gravações nenhuma tentativa de obstrução. Primeiro, tem que contextualizar as
conversas. O Sérgio Machado puxava. dirigia as conversas, criticava, xingava o
procurador-geral da República. Falava que tinha medo que baixassem o processo
para a primeira instância (Sérgio Moro). Não vejo obstrução ao processo.”
“Eu tenho
muita preocupação que tudo passe a ser tentativa de obstrução, de forma que não
possamos mais criticar absolutamente nada.”
“Reconheço o
valor da Lava Jato, mas não aceito essa alegação frequente de que tudo é uma
forma de obstruí-la.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário