Ex-presidente da
República, já condenado por receber valores além do teto constitucional desde
2005, acumula aposentadorias de ex-governador, ex-senador e ex-servidor do
Tribunal de Justiça do Maranhão
POR JOELMA PEREIRA E
EDSON SARDINHA
Congresso em Foco
Enquanto milhões de
brasileiros aguardam com apreensão as mudanças previstas na reforma da
Previdência, o ex-presidente da República e do Senado José Sarney (PMDB) trava
uma batalha judicial para manter sua tripla aposentadoria, que lhe garante uma
renda de R$ 73 mil por mês. O valor representa mais que o dobro do teto
constitucional para o servidor público no país, o salário de um ministro do
Supremo Tribunal Federal (STF), hoje fixado em R$ 33,7 mil.
Sarney foi condenado
pela Justiça Federal em Brasília a devolver aos cofres públicos tudo o que
recebeu acima desse teto desde 2005. O montante anterior não foi cobrado por
ter prescrito o prazo de punção judicial – ou seja, o Estado perdeu o prazo
para reivindicá-lo.
O ex-presidente acumula
uma pensão no valor de R$ 30.471,11 mil como ex-governador do Maranhão, outra
de R$ 14.278,69 mil, que recebe como
servidor aposentado do Tribunal de Justiça maranhense, e mais R$ 29.036,18 mil
como ex-senador.
Para a juíza Cristiane
Pederzolli Rentzsch, da 21ª Vara Federal, que condenou o senador em 25 de
agosto de 2016, a soma desses benefícios não poderia ultrapassar o teto
remuneratório fixado pela Constituição. Sarney recorre da decisão. Além de
determinar a devolução do dinheiro recebido ilegalmente, a juíza mandou o
ex-presidente abrir mão de benefícios para se enquadrar no limite
constitucional. Em sua sentença, Cristiane não fixa o valor a ser ressarcido
aos cofres públicos. Se for aplicada a atual diferença entre o que o
peemedebista embolsa e a remuneração de um ministro do STF, se considerado
desde os cinco anos anteriores à data em que o processo foi autuado no tribunal,
a conta pode passar dos R$ 4 milhões.
Defesa
contesta
O advogado Marcus
Vinicius Coelho, que defende Sarney no processo, argumenta que as remunerações
da ativa – incluídas na ação iniciada quando o político ainda estava no
exercício do mandato – e os “proventos recebidos da inatividade” não podem ser
alcançados pelo teto previsto na Constituição. O ex-presidente da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) alega, ainda, que os proventos são pagos por entes federativos
diversos. “Assim, não há o extrapolar do teto constitucional”, disse Marcus
Vinicius ao site.
No recurso entregue à
Justiça, a defesa afirma que Sarney já recebe como ex-governador antes da
Emenda Constitucional nº 41/2003, que fixou o teto remuneratório, e da própria
Constituição de 1988. Embora tenha controlado a política em seu estado por
cinco décadas, o peemedebista foi governador do Maranhão por um único mandato,
de 1966 a 1970. Tempo suficiente para lhe garantir R$ 30 mil por mês na conta bancária.
O domínio político da
família, também representada pela ex-governadora Roseana Sarney, sua filha, só
foi quebrado temporariamente pelo governo de Jackson Lago (PDT) e, na última
eleição, pelo governador Flávio Dino (PCdoB).
Na folha de pagamento
dos servidores aposentados do Tribunal de Justiça, Sarney aparece como analista
judiciário. Em fevereiro deste ano, último mês em que é possível fazer a
consulta na página do TJMA, seus créditos ficaram em R$ 14.278,69. Feitos os
descontos, a aposentadoria líquida ficou em R$ 11.047,41. O Congresso em Foco
não conseguiu apurar em que período o ex-presidente trabalhou na corte.
Em resposta ao site, a
Secretaria de Gestão e Previdência do Maranhão (Segep-MA) informou que, “até o
momento, não existe no órgão nenhum pedido judicial de suspensão” da
aposentadoria. Como o caso ainda segue na Justiça, a suspensão só deverá
ocorrer após sentença final.
Vantagens
pessoais
Em sua decisão,
Cristiane Pederzolli contesta a tese de que o acúmulo não está sujeito ao teto.
“Na linha de entendimento dos Tribunais Superiores, a partir da edição da EC
(Emenda Constitucional) nº 41/2003, nenhum tipo de subsídio, vencimento ou
provento ultrapasse o teto fixado, estando as vantagens pessoais incluídas no
teto remuneratório”, escreveu.
“Por todo o exposto,
forçoso concluir que os valores relativos aos 03 (três) vencimentos, de que
cuidam o presente caso, recebidos pelo requerido José Sarney incluem-se no
cômputo do teto remuneratório constitucional. Portanto, para a aferição da
obediência ao teto, tais vencimentos devem ser tomados ‘em adição’ e não ‘em
separado’”, reforça a magistrada na sentença.
A denúncia ajuizada
pelo Ministério Público foi baseada em notícia publicada pelo jornal Folha de
S. Paulo, em 6 de agosto de 2009, que mostrou que o então presidente do Senado
recebia pelo menos R$ 52 mil dos cofres públicos por mês. Na ocasião, mais do
que o dobro permitido pela Constituição, que estabeleceu como teto salarial o
subsídio de ministro do Supremo Tribunal Federal, na época de R$ 24.500.
Lava
Jato
Este não é o único
problema que Sarney enfrenta na Justiça. Desde fevereiro ele é investigado na
Operação Lava Jato. O ministro Edson Fachin, responsável pela operação no
Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a abertura de inquérito contra o
ex-senador por tentativa de obstrução da Lava Jato junto com os senadores
Romero Jucá (PMDB-RR) e Renan Calheiros (PMDB-AL), além do ex-diretor da
Transpetro Sérgio Machado. Além de embaraço às investigações, todos são
acusados de organização criminosa, conforme revelações feitas em delação
premiada de Sérgio Machado, que gravou conversas com os políticos.
Dono de uma das
carreiras políticas mais longas da história do país, Sarney exerceu mandatos
por 59 anos. Desses, 38 anos foram passados no Senado – 14 anos pelo Maranhão
(entre 1971 e 1985) e 24 pelo Amapá (de 1991 a 2015). Nesse período, presidiu a
Casa três vezes. Vice-presidente eleito indiretamente na chapa encabeçada por
Tancredo Neves, assumiu o Planalto com a morte do colega, que nem chegou a
tomar posse. Seu governo, o primeiro após a ditadura militar, foi marcado por
tentativas frustradas de planos econômicos, hiperinflação e baixa popularidade.
Mas também é lembrado por marcar a redemocratização do país
Essa carniça além de ser imorrivel é o eterno sugador dos cofres e do povo do Maranhão.
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