O principal editorial do jornal Folha de
S.Paulo desta quarta-feira (10) aponta “informações contraditórias ou
inconsistentes” de um delator da Odebrecht contra o governador Flávio Dino. O
assunto já tinha sido manchete do jornal paulista do último domingo e agora
volta a ser abordado.
Diversas contradições já haviam sido
apontadas na delação de José de Carvalho Filho. Tanto na reportagem de domingo
como no editorial desta quarta, a Folha trata de duas delas.
O delator disse que, em 2010, quando era
deputado federal, Flávio Dino teria atuado em favor da Odebrecht por meio de um
projeto de lei. Mas Dino jamais atuou na proposta, como comprovam documentos
oficiais. “Por que a verba seria concedida em troca do avanço de um projeto de
lei que acabou arquivado?”, pergunta o editorial da Folha.
Outro ponto inconsistente é em relação
ao suposto pagamento que teria sido feito. O editorial traz nova pergunta:
“Flavio Dino (PC do B), governador do Maranhão, teria recebido R$ 200 mil, como
disse um delator, ou R$ 400 mil, como consta da peça elaborada pela
Procuradoria-Geral da República?”
Confira o editorial
Muito a investigar
Em que pese a expectativa geral de depuração dos quadros políticos do
país, suscitada pelos feitos inauditos da Operação Lava Jato, não se pode
perder de vista que, no plano judicial, a maior parte das investigações mais
chamativas ainda ensaia seus primeiros passos.
Exemplos fartos a ilustrar essa constatação básica encontram-se em
levantamento, publicado no domingo (7) por esta Folha, de informações
contraditórias ou inconsistentes prestadas por delatores ligados à construtora
Odebrecht.
Tais depoimentos embasam a vasta relação de inquéritos e petições que,
desde o mês passado sob a guarda do Supremo Tribunal Federal (STF) e de cortes
inferiores, cobriu de suspeitas as cúpulas do Executivo, do Legislativo e dos
principais partidos nacionais.
Em comum, as dezenas de políticos mencionados receberam recursos da
empreiteira, sócia confessa do esquema de corrupção revelado na Petrobras.
Daí a averiguar se sabiam da origem do dinheiro — e se proporcionaram
vantagens à doadora, o que caracterizaria a corrupção—, há longo caminho a
percorrer. Delações precisam ser corroboradas por evidências, mas a imprecisão
dos testemunhos já mostra que nem todos serão comprováveis.
O governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), teria obtido por caixa
dois R$ 200 mil, R$ 500 mil ou R$ 2 milhões em 2010, conforme três versões
distintas?
Flavio Dino (PC do B), governador do Maranhão, teria recebido R$ 200 mil,
como disse um delator, ou R$ 400 mil, como consta da peça elaborada pela
Procuradoria-Geral da República? E por que a verba seria concedida em troca do
avanço de um projeto de lei que acabou arquivado?
Todos os casos demandarão apuração adicional mais complexa, que nem
sempre será conclusiva –ou que, muitas vezes, apontará a inocência de
suspeitos.
Tais desdobramentos, corriqueiros em qualquer processo judicial,
certamente vão frustrar expressivas camadas da opinião pública, que acompanha
com compreensível desconfiança o jogo de pressões que se disputa em Brasília.
Entre seus protagonistas estão o ministro Gilmar Mendes, do STF, que
emite sucessivas críticas públicas à condução da Lava Jato, e o
procurador-geral, Rodrigo Janot, que pediu à corte o impedimento de Mendes no
julgamento que encerrou a prisão preventiva do empresário Eike Batista.
Haverá arrazoados, decerto, para sustentar este ou aquele posicionamento.
Quaisquer que sejam seus motivos, entretanto, autoridades que deveriam
demonstrar discrição e equilíbrio erram ao tensionar ainda mais o ambiente.
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