Juiz
da Lava-Jato recebe o benefício desde 2014, mesmo tendo imóvel em Curitiba
POR CLEIDE CARVALHO
O Globo
O auxílio-moradia, que beneficia mais de
17 mil magistrados no país, é defendido pelo juiz Sergio Moro, responsável pela
Lava-Jato em Curitiba, como forma de compensar a falta de reajuste salarial aos
juízes federais. Moro é um dos magistrados que recebe o benefício, cujo teto,
hoje, é de R$ 4.377.
Segundo o jornal "Folha de
S.Paulo", Moro é dono de um apartamento em Curitiba, mas, mesmo assim,
recebe mensalmente o auxílio desde outubro de 2014, um mês após decisão liminar
do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), que estendeu o
benefício a todos os magistrados. O juiz da Lava-Jato argumenta que os
magistrados estão sem aumento há três anos.
— O auxílio-moradia é pago
indistintamente a todos os magistrados e, embora discutível, compensa a falta
de reajuste dos vencimentos desde 1 de janeiro de 2015 e que, pela lei,
deveriam ser anualmente reajustados — afirmou Moro.
Em agosto de 2015, foi apresentado
projeto de lei à Câmara Federal para aumentar o salário dos ministros do
Supremo Tribunal Federal (STF) de R$ 33.293,38 para R$ 39.293,38, o que
representava 16,38% de aumento — a conta incluía perdas salariais acumuladas
desde 2009, com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA),
que não foi aprovado pelo Legislativo. Os vencimentos dos ministros do STF
delimitam o teto salarial do funcionalismo público, e o aumento poderia
provocar reajustes em sequência entre os magistrados.
Em 2016 o presidente Michel Temer
sancionou projeto de lei que reajustou em até 41,5% para servidores da Justiça
- que não incluiu os juízes, apenas os funcionários - e do Ministério Público
da União. O aumento foi criticado, já que o país atravessava dificuldade
financeira. Apenas em 2018, o custo estimado foi de R$ 6,5 bilhões.
Criado em 1972, o auxílio-moradia foi
regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2014, após a decisão
liminar de Fux. O CNJ estabeleceu o valor máximo de R$ 4.377 e determinou que a
verba seja concedida a todos os juizes que moram em locais onde não há imóvel
funcional, mesmo os que tem residência própria.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região
informou que os magistrados da região puderam pedir o auxílio moradia a partir
de outubro de 2014, por meio de formulário interno, obedecendo à decisão do
CNJ, que regulamentou o benefício em setembro daquele ano. Em toda a
jurisdição, que compreende os estados do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa
Catarina, apenas 10 magistrados não recebem o auxílio moradia, que não é
inserido no cálculo do teto de remuneração. No ano passado, o gasto com o benefício
nos três estados somou R$ 21,4 milhões.
AJUFE: PAGAMENTO PREVISTO EM LEI
O presidente da Associação dos Juízes
Federais (Ajufe), Roberto Veloso, afirma que a lei é antiga e deve ser
respeitada até que o Novo Estatuto da Magistratura seja analisado pelo STF.
Perguntado se defende o pagamento do auxílio-moradia a juízes que possuem
imóvel próprio, Veloso respondeu:
— Eu sou juiz. Juiz é treinado para o
respeito à lei, e o pagamento deve ser feito de acordo com a lei. Se está
previsto na lei, não tem como ser diferente — diz o presidente da Ajufe.
Veloso lembra que o benefício não é pago
apenas ao Judiciário, mas também ao Legislativo, e que a Câmara dos Deputados
possui 432 imóveis funcionais em Brasília.
— É um auxílio moradia "in
natura". São imóveis de alta qualidade. Se fossem ver o aluguel, seria
mais de R$ 10 mil por mês — afirmou.
O presidente da Ajufe argumenta que
várias outras carreiras federais, como os advogados da União, tiveram reajuste
salarial no período em que os juízes federais não tiveram e que ainda receberam
novos benefícios.
— O advogado da União agora recebe
honorários advocatícios. Honorários que eram da União e que ela abriu mão. Em
janeiro, cada um deles recebeu R$ 6 mil, e esse valor foi pago até mesmo para
os aposentados. E isso está sendo pago além do teto. Eles vão receber mais do
que os juízes e temos de defender a magistratura. Se a remuneração não
compensar, a carreira deixa de ser atrativa — argumentou.
Veloso lembrou que o STF vai discutir se
a lei está ou não correta ao analisar o Novo Estatuto da Magistratura e que os
juízes vão acatar o que for decidido. Ele não quis comentar se, pessoalmente,
acha correto o pagamento do auxílio moradia mesmo a quem tem imóvel próprio na
cidade onde trabalha.
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