O
candidato de extrema direita já anunciou medidas que vão abrir a Amazônia ao
desmatamento.
Bolsonaro
já garantiu aos grandes fazendeiros e grileiros que vai “segurar as multas
ambientais”. "Não vai ter um canalha de fiscal metendo a caneta em
vocês!”, discursou em julho. “Direitos humanos é a pipoca, pô!”
Por Eliane Brum
El País
Jair Bolsonaro, chamado nas redes
sociais de “o coiso”, não é uma ameaça apenas ao Brasil, mas ao planeta. O
candidato de extrema direita, que liderou o primeiro turno das eleições no
Brasil, com o voto de quase 50 milhões de brasileiros, pode vencer no segundo
turno, em 28 de outubro. Se ele se tornar presidente do Brasil, já avisou que
pretende seguir Donald Trump e anunciar a retirada do Brasil do Acordo de
Paris.
Ele e seus apoiadores também já
anunciaram várias medidas que abrirão a Amazônia ao desmatamento. A floresta,
que já teve 20% de sua cobertura vegetal destruída, está perigosamente perto do
ponto de virada. A partir dele, a maior floresta tropical do mundo se tornará
uma região com vegetação esparsa e baixa biodiversidade. E o combate ao
aquecimento global se tornará quase impossível.
O ultradireitista que flerta com o
fascismo já anunciou que pretende fundir o ministério do Meio Ambiente com o da
Agricultura e que o ministro desta aberração será “definido pelo setor
produtivo”. O que Bolsonaro chama de “setor produtivo” é tanto o agronegócio
quanto os grileiros, criminosos que se apropriam de terras públicas na base da
pistolagem. No Brasil, parte do agronegócio se confunde com a grilagem e é
representado no Congresso pelo que se chama de “bancada do boi”.
Essa frente, que reúne parlamentares de
diferentes partidos conservadores, tem atuado fortemente nos últimos anos para
avançar sobre as áreas protegidas da Amazônia. Querem transformar terras
indígenas e áreas de conservação, hoje as principais barreiras contra a
devastação da floresta, em pasto para boi, latifúndio de soja e mineração.
Nesta eleição, anunciaram seu apoio a Jair Bolsonaro. O Partido Social Liberal
(PSL) de Bolsonaro, que deverá engordar a “bancada do boi”, passou de um para
52 deputados, tornando-se o segundo maior partido da Câmara a partir de 2019.
Bolsonaro já garantiu aos grandes
fazendeiros e grileiros que vai “segurar as multas ambientais”. "Não vai
ter um canalha de fiscal metendo a caneta em vocês!”, discursou em julho.
“Direitos humanos é a pipoca, pô!” Também já disse que não haverá “nem um
centímetro a mais para terras indígenas” e defendeu que as já demarcadas possam
ser vendidas. Entusiasta da ditadura que controlou o Brasil entre 1964 e 1985,
ele também já declarou que vai “colocar um ponto final no ativismo xiita
ambiental”. O candidato, que exalta a tortura, afirma que “as minorias têm que
se curvar à maioria” ou “simplesmente desaparecer”.
Apenas a possibilidade de ser eleito tem
funcionado como uma espécie de autorização para desmatar a floresta e matar
aqueles que a protegem. Vários casos de violência contra lideranças e
assentamentos de camponeses ocorreram na Amazônia nesta eleição. O Brasil já é
o país mais letal para defensores do meio ambiente. Com Bolsonaro, os conflitos
devem explodir.
Em 8 de outubro, autores do relatório do
Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (IPCC)
alertaram que o aquecimento global não pode ultrapassar 1,5°C. Meio grau a mais
multiplicaria os riscos de seca, inundações, calor extremo e pobreza para
centenas de milhões de pessoas. Alertaram também que só há 12 anos para
reverter esse processo. Doze anos. A floresta amazônica é essencial para
controlar o aquecimento global. E Bolsonaro já anunciou medidas que vão
colocá-la abaixo.
Como o debate foi sequestrado no Brasil,
o maior risco quase não é mencionado ou é simplesmente ignorado. Dentro do
país. E também fora, onde o silêncio de governos e parlamentos da maioria dos
países sobre a ameaça que assombra o Brasil é uma vergonha de dimensões globais.
Se não for por posicionamento
humanitário, representado pelo risco de um defensor da ditadura, da tortura e
do extermínio dos diferentes se tornar o presidente do maior país da América do
Sul, que pelo menos seja por cálculo: o Brasil pode estar se tornando um país
cada vez mais periférico em vários sentidos, mas a Amazônia é central no debate
mais importante deste momento histórico e que atravessa todos os outros temas:
o climático.
Quem acredita que a possibilidade de o
Brasil ser governado por um homem declaradamente racista, misógino e homofóbico
é apenas mais uma bizarrice da América Latina não compreendeu que, em tempos de
aquecimento global, a ameaça alcança a sua porta.
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