Benefício existe em 21 unidades da federação e custa
R$ 47 milhões ao ano.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contesta os estados e move atualmente 11 ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) contra os benefícios locais
POR SIMONE IGLESIAS E CHICO DE GOIS
BRASÍLIA — Levantamento feito pelo GLOBO nas 27
unidades da federação mostra que 157 ex-governadores e ex-primeiras-damas
recebem aposentadorias especiais e pensões vitalícias que variam de R$ 10,5 mil
a R$ 26,5 mil, o que significa um custo anual aos cofres estaduais de R$ 46,8
milhões. É uma casta formada por 104 ex-governadores e 53 viúvas.
Neste mês,
Roseana Sarney (PMDB), que governava o Maranhão e renunciou ao cargo, fez o
pedido da pensão ao tesouro de seu estado e passará a receber R$ 24 mil, além
dos R$ 23 mil que já acumula por ser funcionária aposentada do Senado.
A regalia não tem coloração partidária. O petista
Jaques Wagner, que deixará o governo da Bahia no dia 1º de janeiro, passará a
receber automaticamente R$ 19,3 mil por mês. Este estado foi o último a aprovar
uma lei garantindo o benefício aos seus ex-governadores, em novembro passado. A
lei foi feita sob encomenda para beneficiar o próprio Wagner, que deve virar um
superministro do governo da presidente Dilma Rousseff. Mas um dos mais
emblemáticos líderes da oposição, o presidente do DEM, Agripino Maia (RN),
também recebe R$ 11 mil de pensão pelo seu estado como ex-governador — que
soma-se aos vencimentos de R$ 26,7 mil do Senado.
APOSENTADORIA
RESSUSCITADA NO ACRE
No Acre, estado governado há 15 anos pelo PT, a lei
foi revogada antes dos irmãos Viana chegarem ao poder. Mas assim que assumiu,
em 1999, Jorge Viana ressuscitou a aposentadoria especial. Os tucanos também se
beneficiam das regras locais. O senador Cássio Cunha Lima, que governou a
Paraíba, tem direito a R$ 23,5 mil de pensão, além do seu salário do Senado, de
R$ 26,5 mil. A ex-governadora gaúcha Yeda Crusius é outra tucana que, ao deixar
o cargo, requereu o benefício, que no Rio Grande do Sul é de R$ 26,5 mil.
Os estados agem no vácuo de uma regra federal. Até
1988, os ex-presidentes da República tinham direito ao recebimento de uma
aposentadoria. Os estados, então, replicavam o benefício para os chefes do
poder local. Mas a Constituição Cidadã acabou com o benefício, mas não proibiu
explicitamente a concessão aos governadores. Alguns estados suspenderam então a
regalia aos seus ex-governadores a partir de 1989, quando refeitas as
constituições estaduais. Outros simplesmente ignoraram as mudanças na Carta
Magna e mantiveram ou, ainda, criaram ao longo das últimas duas décadas a concessão
da aposentadoria, casos do Acre e Bahia, entre outros. O entendimento dos
estados é que eles têm “autonomia” pela Constituição para decidirem o que
quiserem.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contesta os
estados e move atualmente 11 ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo
Tribunal Federal (STF) contra os benefícios locais. Os processos estão parados
nas mãos de ministros, o que permite aos governos estaduais manterem os
pagamentos. Neste momento, apenas um estado não está conseguindo pagar os
benefícios, por uma decisão local: Roraima. Uma decisão do Tribunal de Justiça
do estado suspendeu em maio deste ano o repasse da pensão aos ex-governadores e
viúvas. Como não existe jurisprudência, nem uma súmula vinculante sobre esse
tipo de conduta, no momento em que a decisão estadual cair, todos voltam a receber
até que o Supremo se posicione claramente sobre a questão.
Dos 26 estados e o Distrito Federal, 21, uma
esmagadora maioria, pagam as aposentadorias vitalícias. Em 11 deles — Rio
Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Pará, Roraima, Acre, Bahia, Rondônia,
Maranhão, Amazonas e Paraíba — a regra está ativa e vale para os governadores
que deixarão os cargos dia 1º de janeiro. Pelas constituições estaduais, alguns
têm que requerer o benefício; outros passam a receber automaticamente. Em
outros dez estados — Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do
Sul, Pernambuco, Sergipe, Rio Grande do Norte, Alagoas, Ceará e Piauí — as leis
foram revogadas. No entanto, governadores que ocuparam o cargo antes da
revogação das leis e ex-primeiras-damas permanecem recebendo.
DOIS
BENEFÍCIOS PARA EX-COMPANHEIRA
Neste seleto grupo, há dois casos curiosos. Marilia
Guilhermina Pinheiro Martins, reconhecida como companheira do ex-governador
Leonel Brizola, recebe duas pensões, uma pelo Rio de Janeiro e outra pelo Rio
Grande do Sul, já que ele administrou os dois estados. A soma dos vencimentos
de Guilhermina é de R$ 48,3 mil mensais. Outro caso é o de Pedro Pedrossian,
que foi governador do Mato Grosso antes da divisão e, anos mais tarde,
administrou o Mato Grosso do Sul. Pedrossian se beneficia de duas pensões: uma
paga pelos cofres do Mato Grosso e outra paga pelos cofres do Mato Grosso do
Sul. O total da pensão chega a R$ 50 mil.
Como base das ações no STF, a OAB sustenta que a
manutenção do pagamento das aposentadorias é uma agressão e uma ofensa ao princípio
da moralidade, da impessoalidade e da isonomia. Nas ações, a ordem cita o
artigo 37 da Constituição Federal que estabelece os princípios da “legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência na administração pública”.
Segundo a OAB, os estados que mantém ativos os
benefícios nas suas constituições estão descumprindo um preceito constitucional
superior.
Os governadores argumentam que recebem o benefício
porque é um direito legal.
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