PAULO PEIXOTO
DE BELO HORIZONTE
A Justiça de Minas Gerais condenou quatro médicos à prisão em regime
fechado pela participação em comércio de órgãos e tecidos humanos na
cidade de Poços de Caldas (sul do Estado). Cabe recurso à decisão, de
primeira instância.
O médico Alexandre Crispino Zincone foi condenado a 11 anos e seis meses
de reclusão. João Alberto Góes Brandão, Celso Roberto Frasson Scafi e
Cláudio Rogério Carneiro Fernandes foram condenados a oito anos de
prisão, cada um.
Eles formavam a equipe médica de uma entidade clandestina que agia dentro da Irmandade Santa Casa, segundo a Justiça.
A condenação, ocorrida em 11 de janeiro passado e só agora publicada, se
refere a apenas um caso específico de remoção de órgãos (rim, fígado e
córneas). Outros casos ainda poderão vir a ser julgados.
O caso em questão é do então paciente José Domingos de Carvalho, que,
conforme a sentença, chegou ao hospital em bom estado neurológico e
consciente.
Segundo o juiz Narciso Monteiro de Castro, da 1ª Vara Criminal, Carvalho
ficou "praticamente sem assistência e sem nenhuma monitoração" e
"morreu depois de ter ficado vários dias na enfermaria, quando deveria
ter sido levado para o CTI".
Ainda segundo Castro, o mesmo médico que não assistiu adequadamente o
paciente posteriormente declarou a sua morte encefálica, tornando a
vítima "doadora cadáver", o que é proibido.
Pela lei de transplantes, a morte encefálica "deve ser constatada e
registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e
transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos
definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina".
CPI DO TRÁFICO DE ÓRGÃOS
Esse foi um dos casos que em 2002 gerou uma CPI na Câmara dos Deputados e
que teve investigação da Polícia Federal, já que alguns órgãos teriam
sido negociados também em outro Estado. O Ministério Público Federal
acabou passando as investigações para o Ministério Público Estadual.
Na época da CPI, segundo o juiz, auditorias feitas nos hospitais Pedro
Sanches e na Irmandade da Santa Casa de Poços de Caldas identificaram
outros casos suspeitos.
O magistrado disse que pacientes jovens e pobres eram os mais "aptos"
para se "candidatarem a doadores". "Ficavam dias sem nenhum tratamento
ou com tratamento inadequado, sedados, para que os familiares, também na
maior parte dos casos semianalfabetos, não desconfiassem de nada."
Outros dois médicos denunciados não receberam punição porque já
completaram 70 anos. Entretanto, o juiz encaminhou a denúncia aos
conselhos federal e regional de medicina, para eventuais apurações
disciplinares.
Os réus poderão recorrer em liberdade, mas estão com os passaportes
apreendidos, não podem deixar Poços de Caldas sem autorização e foram
afastados do ambiente hospitalar, ficando proibidos de atuar pelo SUS.
OUTRO LADO
A reportagem não localizou nenhum dos quatro médicos. A Folha deixou recado nos escritórios dos advogados de cada um deles, mas não teve resposta.
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