O Globo
Ter parente na política pode ser um bom passaporte para o pretendente a um cargo público eletivo. Como o Núcleo de Dados mostrou, mais de 52% do atual Congresso Nacional é formado por políticos que têm familiares na política. Mas será que ter parente na política também é um bom começo para conseguir fundos para a campanha eleitoral?
O cientista político e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Emerson Cervi analisou essa questão. Para isso, utilizou a base de dados do DNA do Congresso criado pelo Núcleo do GLOBO. Emerson ampliou a base, incluindo os recursos declarados de campanha dos candidatos eleitos em 2014, considerando aqueles que têm e não têm algum parente na política.
O estudo, ainda preliminar, mostra que o parentesco na política pode ser também uma boa forma de os políticos mobilizarem recursos para as suas campanhas. Os candidatos que têm parente na política apresentam sempre uma maior média de recursos declarados quando comparado com aqueles que não têm parente na política. Forma-se assim um ciclo vicioso que envolve o poder político das famílias que controlam os partidos e a capacidade que essas famílias têm de obter mais financiamento de campanha. O Blog conversou com Cervi, veja abaixo.
Blog: Com esses dados, podemos dizer que existe uma certa hereditariedade no modus operandi de financiar as campanhas?
Emerson Cervi: Os dados mostram que quem vem de família de políticos tende a ter maior financiamento. Poderíamos complementar as informações com outros dois dados: por partido, para saber se isso também serve para todos os partidos. E em segundo, talvez mais interessante, identificar o tipo de doador. Se os que têm parentes recebem mais recursos de partido político, podemos falar em ocupação dos partidos para favorecimento familiar
Será que os dados não indicam o contrário, ou seja, que os financiadores percebem haver mais chance de vitória nos políticos com parentes na política?
Cervi: De fato, não dá para saber o que vem antes. Se financia porque tem parente ou se tem parente porque é financiado. Me parece racional do ponto de vista do "investidor" em campanhas que ele queira depositar seus recursos, que são escassos, em agentes políticos que indiquem ter melhores condições de representação de interesses. Nesse caso, linhagem familiar leva a conhecimento das estruturas e processos políticos.
Se a hereditariedade parece ser um fator importante na vitória de certo grupo político e, como os dados indicam, o financiamento de campanha desse grupo hereditário também, tudo indica que temos um sistema bem resistente à renovação dos não hereditários e com baixos recursos. Como avalia essa questão?
Cervi: Sim, tudo indica que assim como outros sistemas sociais, o sistema político desenvolve mecanismos para perpetuar seus agentes, limitando ao máximo a renovação. No caso da política: familismo mais dinheiro mais inexistência de limitações formais (número de mandatos, por exemplo) é igual à continuidade.
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