Editorial do Jornal Pequeno
A saga da agiotagem no Maranhão,
enquanto aparenta ser um crime marcado apenas pelos desvios de personalidade de
seus protagonistas, esconde uma história de dores profundas, de muito
sofrimento. Não apenas os ocasionados pela eliminação física de concorrentes e
inadimplentes, mas o sofrimento de multidões roubadas em alimento, saúde,
educação, segurança e quase tudo que depende da ação do poder público.
Os clientes preferenciais dos agiotas no
Maranhão não eram particulares; eram, principalmente, os cofres públicos dos
mais paupérrimos municípios do Maranhão. Deles, foi desviado o dinheiro do
asfalto ou do calçamento, o dinheiro dos remédios nos hospitais e postos
médicos, os recursos destinados à educação de crianças e adultos mantidos
analfabetos, os recursos da segurança pública, da merenda escolar de gente em
tese faminta porque vivendo com cerca de R$ 70 por mês. Esse foi o crime maior
da agiotagem e o mais incrível foram os dias, anos, quase meio século em que
esses agiotas e prefeitos viveram na impunidade.
Somente agora o Estado, com a chegada do
governador Flávio Dino ao poder, conseguiu ou teve forças para punir a
agiotagem. Empresários com cheques em branco de prefeituras, os valores que
deveriam mitigar a fome de crianças abandonadas pelo poder público, meninos e
meninas tentando se educar em escolas de taipa, de palha, em galpões, sem
material didático, sem lanche, postos médicos vazios e uma gente aos gritos
transportada em ambulâncias para distâncias que doíam ainda mais.
E
a polícia estadual não agia para punir esse banditismo cruel. Não agia porque
não podia agir, posto que esses eram recursos do poder político, afinal no
comando de um modelo que privilegiava toda e qualquer forma de corrupção. Para
que esses homens vivessem como nababos, uma rede de proteção estava armada,
sendo este um assunto sobre o qual não se conversava, sobre o qual se temia
dizer, pois acima de qualquer dor ou vida humana estava, para muitos, a próxima
eleição a ser vencida, a qualquer custo, a todo preço, contribuindo para que
fosse o do Maranhão o povo mais pobre deste país.
Dessa miséria coordenada em gabinetes do
poder, nasciam jovens marginais porque permanentemente, desde a infância,
marginalizados, comendo o pão que o diabo amassou enquanto o diabo comemorava com
os melhores vinhos e champagnes passeando em jatos particulares. O contributo
da agiotagem para a violência que assolou o Maranhão não foi, portanto, apenas
territorial. A agiotagem ajudou a explodir a natureza social do crime quando
roubou, por tanto tempo impunemente, o futuro de sucessivas gerações.
Em apenas quatro meses do governo Flávio
Dino, duas operações policiais, sob comando também do Ministério Público,
mandaram para o lugar devido, a cadeia, empresários de alto coturno, políticos
destacáveis na sociedade, responsáveis pela extrema pobreza em dezenas de
municípios do Estado, réus sem julgamento da exploração humana mais cruel.
O garoto que foi com fome para aquela
escola de palha sem banheiros e, também, o outro, que voltou para uma casa onde
não tinha o que comer, todas essas gerações que tiveram seus futuros roubados,
vão crescer sabendo que, se houver honestidade política, o destino terrível que
lhes foi traçado por mãos criminosas pode mudar. E vai mudar.
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