Doação
feita pela Andrade Gutierrez seria referente ao pagamento de propinas
disfarçado de doação eleitoral
GIL ALESSI
El País
Um
cheque no valor de 1 milhão de reais pago pela construtora Andrade Gutierrez em
nome de Michel Temer (PMDB) durante a campanha de 2014 coloca o presidente mais
uma vez no raio da Operação Lava Jato. O documento pode complicar seu desejo de
desvincular suas contas como candidato a vice das apresentadas por Dilma
Rousseff em uma ação que pede a cassação da chapa no TSE (Tribunal Superior
Eleitoral).
De
acordo com Otávio Azevedo, ex-presidente da empreiteira, o repasse de 1 milhão,
feito em 10 de julho de 2014, seria referente ao acerto de propina por acordos
firmados pela empresa com o Governo. O empreiteiro também ficou em uma situação
delicada, uma vez que o cheque em nome de Temer, divulgado nesta quinta-feira
pelo jornal O Estado de São Paulo, contradiz um de seus depoimentos prestados à
Justiça em setembro. Na ocasião ele afirmou que o montante equivalia a uma
propina de 1% referente a contratos e que a doação teria sido feita ao
diretório nacional do PT, e não ao peemedebista. Ele também havia dito que parte
dos recursos repassados ao PMDB teriam relação com propinas relativas a
contratos da hidrelétrica de Belo Monte.
Para a
defesa de Dilma no TSE, que questionou a declaração, o empreiteiro prestou
falso testemunho. Diante das versões conflitantes, o TSE chegou a determinar
uma acareação entre Azevedo e tesoureiro da campanha petista, Edinho Silva,
alvo de processo na Justiça por seu suposto envolvimento com o esquema de
corrupção da Petrobras. O encontro acabou sendo cancelado e só Azevedo será
ouvido.
Em
nota o PMDB afirmou que “sempre arrecadou recursos seguindo os parâmetros
legais em vigência no país”, e que “todas as contas do PMDB foram aprovadas não
sendo encontrados nenhum indício de irregularidade”. A reportagem não conseguiu
entrar em contato com os advogados de Azevedo. Já o porta-voz de Temer,
Alexandre Parola, disse que não há nenhum problema com o cheque. "Trata-se
de um cheque nominal do PMDB, repassado para a campanha do então
vice-presidente Michel Temer na data de 10 de junho de 2014. Basta ler o
cheque. Reitere-se, não houve qualquer irregularidade na campanha do então
vice-presidente Michel Temer", disse ele.
Risco e dólar
O
episódio só reforça os holofotes direcionados para o TSE, que deve analisar,
ainda sem data, uma ação do PSDB, de 2014, que pede a cassação da chapa
Dilma-Temer por, entre outros motivos, supostamente ter recebido propinas
disfarçadas de doações de campanha. Antes mesmo do impeachment da presidenta
Dilma Rousseff, em abril, a defesa do PMDB havia alegado que as contas de Temer
deveriam ser julgadas em separado, tese que ainda deverá ser analisada pelo
tribunal. Os defensores de Dilma, reforçados pelo cheque, querem derrubar a
interpretação, argumentando que foi Temer e o PMDB que centralizaram parte da
arrecadação para o fundo comum da campanha.
No
Planalto existe o temor de que o ministro Herman Benjamin, que é relator das
ações contra a chapa no TSE, recomende a cassação sem separar as contas. Se a
cassação da chapa ocorrer após janeiro de 2017, serão realizadas novas eleições
diretas. Caso o processo ocorra antes, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia
(DEM), assumiria e convocaria eleições indiretas. O aparecimento do cheque foi
mais um fator de incerteza nesta quinta-feira para o mercado no Brasil, que
reverberava fortemente a eleição de Donald Trump nos EUA. O tema foi arrolado
por analistas entre os que contribuíram para que o dólar fechasse com a maior
alta em oito anos nesta quinta-feira, ao disparar mais de 4,5 por cento, indo
acima de 3,35 reais.
Para o
especialista em direito eleitoral Alberto Rollo, mesmo que o PMDB consiga que o
tribunal julgue as contas separadamente, se comprovado o pagamento de propina
como doação para Temer, na Lava Jato, o presidente também pode se ver em
dificuldades. “Se o cheque realmente tem origem ilícita, o crime de abuso de
poder econômico vale para ele também”, afirma.
Gilmar
Mendes, presidente do TSE, já fez acenos contraditórios quanto à separação das
contas de Dilma e Temer. No início do ano ele afirmou que não há “base
jurídica” para a desvinculação, mas depois citou o citou o caso do
ex-governador de Roraima José de Anchieta Júnior, que conseguiu que o tribunal
analisasse sua prestação de contas separadamente. Em palestra realizada em
Washington nesta semana Mendes afirmou que o tribunal nunca analisou um caso
como esse, e que se trata de um momento “histórico”. “O que vai acontecer no
caso atual, eu não sei. Mas o tribunal terá que fazer a avaliação levando em
conta um quadro de grande responsabilidade institucional", afirmou. Outro
ministro do TSE, Luiz Fux, também mencionou a possibilidade de separar as contas
da petista e do peemedebista em entrevista no mês passado.
Com
informação de Afonso Benites, de Brasília.
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