Por Marcelo Leite
Folha de São Paulo
Há barulho demais com essa história de a
Noruega cortar pelo menos R$ 167 milhões em doações para o Fundo Amazônia (e
mesmo assim chegando a um total de mais de R$ 3 bilhões encaminhados desde 2009
para financiar projetos sustentáveis na região).
O acordo sempre foi desembolsar o
dinheiro de acordo com reduções no desmatamento. Se a devastação cresce desde
2014, era inevitável que os pagamentos encolhessem.
Os noruegueses acreditam no cumprimento
de acordos. Ao escolher o momento da visita do presidente Michel Temer (PMDB)
ao país nórdico para confirmar (mais que anunciar) o corte, tornam claro que
também não se deixam enganar facilmente.
Temer e seu ministro do Meio Ambiente,
José Sarney Filho (PV), parecem ter acreditado que conseguiriam enrolar o ministro
ambiental da Noruega, Vidar Helgesen.
Anunciaram na segunda-feira (19), três
dias antes de desembarcar em Oslo, o veto presidencial integral às medidas
provisórias 756 e 758. Elas haviam sido modificadas pelo Congresso para ceifar
nacos ainda maiores de unidades de conservação (UCs) como a Floresta Nacional
do Jamanxim (PA).
Helgesen já havia escrito uma carta
constrangedora a Zequinha Sarney antes mesmo do veto. Diplomaticamente,
elogiava a redução do desmate até 2014, mas se dizia preocupado com a retomada
da destruição.
"Essa questão também determinará o
futuro de nossa parceria baseada em resultados", avisava o texto que vazou
ainda no domingo (18). "Na tendência atual, as contribuições baseadas em
resultados que podem ser recebidas pelo Fundo Amazônia [...] já estão
significativamente reduzidas. Mesmo um incremento bem modesto [no desmatamento]
levará esse número para zero."
O papel mais bisonho coube ao ministro
Sarney Filho. Ao armar a reapresentação do talho em Jamanxim na forma de um
projeto de lei, deu a entender que o problema estava no aumento da área cortada
pelo Congresso.
Não. O problema é o governo Temer
considerar que não há problema em diminuir o nível de proteção de 3.000
quilômetros quadrados de uma floresta nacional (categoria de UC que veda a
ocupação humana) apenas para satisfazer alguns pecuaristas e grileiros do Pará.
Como esse é o objetivo do projeto de lei
combinado no Planalto, parece evidente que Zequinha já se dispõe a engolir o
sapo cevado na Casa Civil de Eliseu Padilha (PMDB). O Congresso do senador
Flexa Ribeiro (PSDB-PA) só confirmou seu DNA ruralista ao elevar o corte para
4.800 km².
Chega a ser risível o ministro do Meio
Ambiente atribuir a Dilma Rousseff (PT) o repique na devastação dos últimos
anos, como fez sem corar em Oslo. E não só por ser um truísmo.
Dilma sempre desdenhou a preservação
ambiental, desde seus tempos nas Minas e Energia e na Casa Civil. Ela só
começou a abrir a porteira de concessões à bancada ruralista –por exemplo nos
sucessivos adiamentos de prazos para que fazendeiros regularizem seu cadastro
ambiental rural (CAR)– que Temer e Padilha agora escancaram.
Em dezembro de 2006, o texto "Sai
daí, Marina" na pág. 2 desta Folha recomendava à então ministra petista
Marina Silva (hoje na Rede) abandonar o governo Lula, coisa que ela só fez 16
meses depois. Sarney Filho talvez não possa esperar todo esse tempo.
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