Com o voto do ministro
Dias Toffoli, o Supremo formou maioria contra a prisão após condenação em
segunda instância
Mesmo com a pressão das milícias
bolsonaristas, Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF),
manteve seu entendimento prévio e votou contra a prisão após condenação em
segunda instância e garantiu uma maioria em favor das Ações Declaratórias de
Constitucionalidade (ADCs) nº 43, 44 e 54. Essa decisão pode beneficiar o
ex-presidente Lula, preso em Curitiba sem ter seu processo transitado em
julgado.
“Nós estamos julgando um caso abstrato”,
alertou Toffoli logo no início de seu voto. “O que eu vou analisar é se esse
dispositivo [o artigo 283 do Código de Processo Penal] é compatível com a
Constituição ou não”, acrescentou. “Ante o exposto, voto pela procedência das
ADCs, com o relator”, finalizou.
O artigo diz o seguinte: “Ninguém poderá
ser preso se não em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da
autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória
transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude
de prisão temporária ou prisão preventiva”.
O ministro baseou seu voto em uma
interpretação feita pelo Parlamento sobre o artigo, alterado em 2011 por meio
da Lei 12.403/2011. Toffoli jogou para o Legislativo a responsabilidade de uma
possível liberação de prisão após condenação em segunda instância e disse que
caberia aos parlamentares alterar o CPP, caso seja o entendimento. “A opção
legislativa não se confunde com a presunção da inocência”, disse ainda.
Ao acompanhar o relator Marco Aurélio
Mello, o presidente da Corte se juntou a Rosa Weber, Ricardo Lewandowski,
Gilmar Mendes e Celso de Mello, formando uma maioria em favor da
inconstitucionalidade da execução provisória da pena antes de processo
transitado em julgado. Os outros cinco ministros – Alexandre de Moraes, Edson
Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia – divergiram.
O voto de Toffoli era um dos mais
esperados. Apesar de manter uma posição prévia de contrariedade com relação à
prisão em segunda instância, o presidente da Corte sofria grande pressão do
governo Bolsonaro e seus aliados.
A posição de Rosa Weber também era
aguardada por sempre ter sido contra a prisão em segunda instância, mas, em
2018, ter dado voto contra habeas corpus ao ex-presidente Lula. “Não é dado ao
intérprete ler o preceito constitucional pela metade, como se tivesse apenas o
princípio genérico da presunção da inocência, ignorando a regra que nele se
contém – até o trânsito em julgado”, disse a ministra durante o julgamento das
ADCs.
O ex-presidente é um dos possíveis
beneficiários desta decisão, tendo em vista que o processo do triplex do
Guarujá não foi transitado em julgado. Lula foi condenado pelo ex-juiz federal
Sérgio Moro, em julho de 2017, e foi preso em abril de 2018, após o TRF-4
chancelar a decisão de Moro. Apesar de ter passado pela 5ª turma do STJ, o
processo ainda não foi finalizado e a defesa ainda pode recorrer.
Vaza Jato
A série de reportagens do Vaza Jato,
publicadas pelo The Intercept Brasil em
parceria com uma série de veículos jornalísticos, também foi citada no julgamento.
O ministro Gilmar Mendes leu trechos das matérias, em crítica explícita à
operação Lava Jato e ao Ministério Público.
O voto do relator
Em seu voto, proferido no dia 23 de
outubro, Marco Aurélio Mello acatou os questionamentos levantados pelas ações e
afirmou que a Constituição garante a presunção da inocência. “A Constituição de
1988 consagrou a excepcionalidade da custódia no sistema penal brasileiro,
sobretudo no tocante à supressão da liberdade anterior ao trânsito em julgado
da decisão condenatória”, disse.”O pressuposto da execução provisória é a
possibilidade de retorno ao estágio anterior, mas quem vai devolver a liberdade
ao cidadão?”, completou.
Início do julgamento
O julgamento começou no dia 17 de outubro
com falas dos advogados do Patriota, da OAB e do PCdoB – responsáveis pelas
três ações. Pelo PCdoB, na ADC 54, falou o ex-ministro da Justiça, José Eduardo
Cardozo, que criticou o sistema prisional brasileiro e ainda disse que a
condenação após “trânsito em julgado” não foi escolhida por acaso.
“Ela tem uma lógica sistêmica, ela tem uma
lógica axiológica. A lógica é que esta Constituição Cidadã garante acima de
tudo e de todos a dignidade da pessoa humana e a liberdade. Por isso que se
assegura que a restrição a esses valores só podem ser dados quando a certeza
jurídica alcança o seu grau máximo”, declarou. “Foi essa a Constituição que
juramos defender. Há que se respeitar”, disse ainda.
Com informações da Revista Fórum
Com informações da Revista Fórum
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