Um
casal de trabalhadores rurais foi assassinado a tiros, no início da tarde desta
sexta-feira (18), nas proximidades da Comunidade Vilela, em Junco do Maranhão,
a 258 km de São Luís. As vítimas foram identificadas como Reginaldo e Maria da
Luz Benício de França
De
acordo com informações do advogado Diogo Cabral, a área onde ocorreu o crime é
de intenso conflito agrário. Maria de França era suplente da direção do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadores Rurais (STTR) local.
A
filha do casal, uma criança de 3 anos, ficou em cima do corpo da mãe durante
horas. Reginaldo também teve os braços quebrados.
O
advogado acrescenta que esse é o 5º assassinato na região do conflito nos últimos
dois anos. “Nenhuma investigação chegou à autoria dos fatos. Foram quatro
homens e uma mulher assassinada”, diz Diogo Cabral.
“A
Secretaria de Direitos Humanos e Participação Popular e a Secretaria de
Segurança Pública já estão acompanhando o caso. A Polícia Civil já se deslocou
para apurar o duplo homicídio na área. Maiores informações serão divulgadas de
acordo com as investigações”, disse Francisco Gonçalves, secretário de Direitos
Humanos e Participação Popular do Maranhão.
Ameaças de morte em 2020
De
acordo com informações da Agência Tambor, há anos os habitantes do Povoado de
Vilela, na região conhecida como Gleba Campina, no município de Junco do
Maranhão, convivem sob ameaças de um fazendeiro que alega ser o dono legítimo
daquelas terras e pede a reintegração de posse.
Em
dezembro de 2020, 22 pessoas da comunidade estiveram reunidas com o promotor de
Justiça, Haroldo Paiva de Brito, titular da 44ª Promotoria de Justiça Especial,
1a de Conflitos Agrários, em São Luís, e cobraram providências do caso que
tramita na Justiça do Maranhão há anos.
À
época, de acordo com relatos da presidente da Associação de Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Agricultura Familiar da região, Benedita Correa Gomes,
de 41 anos, um fazendeiro apareceu, acompanhado de homens encapuzados, munidos
de um fuzil e uma pistola, ordenando que os moradores se retirassem da
comunidade.
Histórico de ameaças
Vilela
é constituída de cerca de 2.258 hectares divididos entre 66 sócios, e mais de
100 famílias. É neste território que há mais de 20 anos os moradores plantam
legumes, milho, feijão, arroz, produzem carvão, madeira para lenha.
É
com a agricultura familiar que conseguem tirar sustento para sobreviver em uma
região tão precária.
No
entanto, há cerca de 10 anos um fazendeiro solicitou na Justiça a
desapropriação das terras, alegando que são dele, colocando em risco a
população vulnerável que depende delas para sobreviver.
O
território, que supostamente compõem as terras do fazendeiro, faz parte dos
municípios de Junco do Maranhão, Amapá do Maranhão e Boa Vista do Gurupi.
O
suposto proprietário das terras conseguiu na Justiça maranhense a reintegração
de posse, apresentando um título de propriedade que pode ter sido fraudado.
Segundo
o promotor de Justiça, Haroldo Paiva, na documentação há indícios desta suposta
fraude, o que coloca o processo em dúvida.
Diogo
Cabral, advogado que assiste as famílias do Povoado, afirma que os documentos
devem ser investigados.
Mortes na região
O
conflito agrário gera ameaças constantes e coloca a população de Vilela em
alerta, e medo de serem mortos. O que já aconteceu anteriormente.
Três
homens foram assassinados, nos últimos três anos. Antônio, conhecido como
Sergipano, vizinho da comunidade, e que prestava auxílio aos sócios de Vilela,
e os moradores Raimundo e Benilson.
Não
houve conclusão de nenhum dos inquéritos dos três homicídios.
Benedita
Correa relata que o fazendeiro os ameaça afirmando que “mortes continuarão
acontecendo se eles não desocuparem as terras”.
“Estão
todos aterrorizados, com medo. Nós corremos risco há qualquer momento e o medo
é constante”, ressaltou ela.
Por
conta dos últimos acontecimentos, ela e outros moradores fizeram três boletins
de ocorrência na delegacia local, nos dias 25, 27 e 30 de novembro de 2020.
Antônio
Mendes de Oliveira, 61, acompanhou Benedita Correa na audiência com o promotor
de Justiça em São Luís. Ele declarou que a situação não tem sido fácil para
eles. O agricultor teme sair de casa para o trabalho e não mais voltar.
“Eu
peço para as autoridades que resolvam. Essa causa é uma causa que nos pertence.
Se as autoridades não resolverem nosso problema, ninguém vai fazer”, evidenciou
o morador.
Além
disso, eles relatam que há destruição de suas plantações, propriedades, por
ordem deste fazendeiro.
Processos na Justiça
De
acordo com o advogado Diogo Cabral, a disputa do território do Povoado de
Vilela é um caso muito sério de um conflito que se alastra há anos e ainda não
teve a resposta esperada.
Existe
um processo administrativo tramitando há cerca de nove anos, protocolado pela
Federação dos Trabalhadores Rurais do Maranhão (FETAEMA) e o Sindicato do Junco
do Maranhão, solicitando a regularização do território.
Além
deste, também há outro processo pedindo procedências contra as ameaças e
destruição dos patrimônios dos moradores daquela região.
O
advogado explica que a comunidade já esteve na Promotoria de Maracaçumé, que
responde pelo município de Junco do Maranhão, e também na Promotoria de São
Luís, mas ainda não obtiveram respostas concretas para o caso.
Também
esclarece que já foi pedido uma audiência de conciliação, sendo necessário
apenas o deferimento do juiz da Comarca.
“O
Estado precisa dar uma resposta adequada a essas famílias, afinal são 11 anos
de espera sobre a regularização”, destacou.
Cabral
afirma que a Promotoria de São Luís tem o diálogo aberto com o Povoado. No
entanto, Benedita Correa também ressaltou que o mesmo não se pode declarar da
Comarca de Maracaçumé, pois não conseguem falar com o promotor de Justiça
titular, Francisco Hélio Porto de Carvalho.
“Essas
famílias vêm lutando. Elas sempre quiseram viver em paz, tranquilas. A
disposição da comunidade sempre foi pelo diálogo”, atestou o advogado.
Edimilson
Costa da Silva, secretário agrário da FETAEMA, acompanhou Benedita Correa e
Antônio Mendes na audiência com o promotor de Justiça, Haroldo Paiva, em São Luís.
Ele
pontuou que além de assistência jurídica, a federação também auxilia a
comunidade de forma política. Além disso, proporcionou estadia, alimentação e
locomoção aos 22 moradores que vieram do Povoado de Vilela saber do processo no
Ministério Público.
De
tempos em tempos pessoas do Povoado viajam à capital cobrando proteção, rapidez
dos processos, enquanto o conflito se acirra, e não há nenhuma resposta. E,
segundo eles, também não há apoio de outros órgãos públicos.
A
população aguarda o desfecho jurídico, pois quer viver e plantar em suas terras
com segurança, ao mesmo tempo que vive sob o medo constante.
É
naquele ambiente que aprenderam a agricultura familiar e aprenderam a respeitar
o território. “É uma área que é uma mãe!”, pontua o agricultor Antônio Mendes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário