IstoÉ
Vigor aos 78 anos

Aos 78 anos de idade e 53 de vida política, ele sabe quanto se exporia se admitisse desde já que deseja presidir o Senado, inserindo-se numa disputa franca com o senador acreano Tião Viana, do PT, que também aspira à vaga. Como aconteceu às vésperas de todas as suas principais conquistas políticas, Sarney deixa a ribalta para mergulhar de cabeça nas ações de bastidores. Sem declarar sua aspiração, torna-se o favorito para suceder Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) no comando do Congresso. Ou, pelo menos, faz com que a conclusão do jogo político na Câmara e no Senado passe necessariamente por ele, tirando os maiores proveitos disso. "Ele não perde nunca. Se o Brasil instituísse um regime comunista, no dia seguinte o Sarney virava um comissário do povo", comenta o senador Gerson Camata (ES), um dos seus adversários no PMDB.
Principal aliado de Sarney no projeto para a presidência do Senado, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) espanta-se com a disposição que o homem de quase 80 anos ainda demonstra para a articulação política. "É impressionante que ele, com a idade que tem, ainda tenha tanta vontade de fazer política", comenta Renan. Na terça-feira 18, por exemplo, Sarney viajou a São Paulo para acompanhar a mulher, Marly, e a filha, senadora Roseana Sarney (PMDB-MA), em exames médicos. À noite, porém, ele já estava de volta a Brasília, para uma reunião que definiu nova artimanha no jogo contra Tião Viana.
Comandados por Sarney, os caciques peemedebistas no Senado resolveram negociar com os demais partidos os outros cargos de direção na Mesa, deixando o PT de fora. Assim, se Tião insistir em ser candidato, vai para o tudo ou nada: se não virar presidente, o PT ficará sem nenhum cargo de importância. O PMDB crê que os senadores petistas, assustados com essa hipótese, começarão a considerar o abandono da candidatura de Tião para articular uma saída negociada. O principal trunfo de Sarney está nas conversas que teve com o presidente Lula nas últimas quatro semanas. Por três vezes, Lula repetiu: "Se você quiser ser o presidente do Senado, está resolvido o problema. Eu não apenas não me oponho como apóio a solução." Nas três vezes, Sarney repetiu uma variação da frase dúbia que tem dito nas conversas com os peemedebistas: "Eu não quero, mas o PMDB quer a presidência do Senado."
Os peemedebistas imaginam que o que daria força à campanha de Sarney é o ambiente confl agrado que hoje envolve os três Poderes. "O Parlamento precisa de alguém que tenha uma clara compreensão do papel do Poder Legislativo", defende Renan Calheiros. Na verdade, porém, há além das intenções nobres uma disputa interna de poder no PMDB. No primeiro governo de Lula, toda a negociação com os peemedebistas passava primeiro por Sarney. O senador foi o primeiro aliado de Lula no partido. O presidente não apenas tornou-se grato a isso como passou a admirar a experiência de Sarney, transformando- o num dos seus principais conselheiros. No segundo governo, houve uma formalização da aliança com o partido, e as conversas passaram a ser institucionais, aumentando o poder do presidente do PMDB, Michel Temer (SP), e dos deputados do partido. Sarney e renan querem retomar a primazia do diálogo nos próximos dois anos que vão levar à definição do sucessor de Lula na Presidência da república.
Numa avaliação que é compartilhada com os analistas de Lula no Palácio do Planalto, sabem que se o PMDB conquistar o Senado os partidos reagirão e não elegerão Michel Temer na Câmara. "O comando das duas casas pelo PMDB é inaceitável", afi rma o senador Renato Casagrande (PSB-ES). Na gangorra que se seguirá, Sarney e Renan voltarão a dar as cartas. Para Sarney, representará um novo fôlego. Ele não se saiu bem nas eleições municipais nem no Maranhão nem no Amapá. Ainda vive o dissabor de ver os negócios de seu fi lho Fernando no Maranhão investigados pela Polícia Federal, no que considera uma ação política do ministro da Justiça, Tarso Genro, para desestabilizá- lo. No poder no Senado, terá mais possibilidades de recuperar o que perdeu de seu cacife político. Além disso, Sarney poderá, então, pavimentar o caminho que deseja para se tornar um dos principais personagens de um ciclo da República que se encerra. Ele considera que Lula fecha o ciclo da redemocratização do País. À frente do Congresso, Sarney dará posse ao presidente que iniciará a nova etapa da história brasileira.
Condenação para todos
Investigações policiais feitas de forma atrapalhada, carregadas de irregularidades e arbitrariedades são as ferramentas prediletas dos advogados criminalistas para evitar a condenação de seus clientes. A Operação Satiagraha, conduzida pelo delegado Protógenes Queiroz e tendo como alvo principal o banqueiro Daniel Dantas, se encaixa nessa categoria. Mas, ao contrário de suas congêneres, nada indica que seu destino será o de engordar as estatísticas da impunidade.
Na última semana, delegados e procuradores ouvidos por ISTOÉ afirmaram que o Ministério Público e a Polícia Federal já traçaram a estratégia para punir os acusados e também os responsáveis pelas trapalhadas, irregularidades e arbitrariedades. Para tanto, o ponto de partida está no processo que trata de tentativa de corrupção - um dos subprodutos da Satiagraha. Dantas e seus auxiliares Humberto Braz e Hugo Chicaroni são acusados de oferecer US$ 1,2 milhão a um delegado da PF para que não fossem indiciados por Protógenes. Essa investigação é composta por interceptações telefônicas, escutas ambientais e buscas e apreensões feitas com autorização judicial e sem nenhum tipo de abuso das autoridades.
Na quarta-feira 19, Dantas e os demais acusados, acompanhados por um grupo de 12 advogados, entregaram ao juiz Fausto De Sanctis, da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, as alegações finais de suas defesas - mais de 400 páginas no total -, pediram que novas testemunhas fossem ouvidas e que outras provas fossem anexadas ao processo. O juiz poderia julgar o processo na hora, mas pediu prazo para analisar as solicitações e depois disso vai usar os dez dias que a lei lhe confere para anunciar sua decisão. A amigos, no entanto, De Sanctis afirmou que o processo reúne todas as provas para condenar Dantas e seus auxiliares por corrupção ativa. A con denação, que pode variar de dois a 12 anos de prisão, deverá ser anunciada no início de dezembro. "Há elementos que permitem a pena máxima", avalia o procurador da República, Rodrigo De Grandis, que acompanha o caso desde o início.
Veja
O horror diante dos olhos
Na era das grandes navegações, a palavra "procela" entrou para o vocabulário da língua
portuguesa. Procelas são as fortes tempestades que se formam em alto-mar. Na semana passada, uma procela se adensou, não sobre o oceano, mas nos céus da próspera Santa Catarina. Quando ela despencou sobre as cidades, foi com uma fúria e constância jamais vistas, mesmo numa região historicamente sujeita a precipitações caudalosas e enchentes.

Apenas na Blumenau dos laboriosos imigrantes alemães, caíram, em cinco dramáticos dias, 300 bilhões de litros de água. Sim, bilhões – o suficiente para abastecer a cidade de São Paulo durante três meses. Outra comparação é ainda mais impressionante: se esse volume hídrico fosse despejado dentro de uma torre com uma base de 1 metro quadrado de área, a construção teria de ter 300.000 quilômetros de altura – quase a distância entre a Terra e a Lua. A primeira das mais de 100 vidas ceifadas por tamanho horror foi a da menina Luana Eger, de 3 anos.
No sábado 22, um barranco deslizou sobre a casa em que ela morava, soterrando-a. A mãe de Luana, Virgínia, e seus irmãos Juan, de 7 anos, e Rafael, de 5, escaparam da morte. Seu pai, o comerciário Evandro Eger, estava fora da cidade quando soube do desastre. Restou-lhe comprar num supermercado o vestido cor-de-rosa com o qual enterrou a filha no dia seguinte. "Era a cor preferida dela", disse ele. Evandro e Virgínia ainda conseguiram dar um funeral razoavelmente digno à menina. Muitas das vítimas foram enterradas em caixões improvisados, e nem sempre em cemitérios, mas em quintais.
Até sexta-feira, dezenove pessoas continuavam desaparecidas. Boa parte delas pode ter sucumbido em decorrência de afogamentos e dos 4.000 deslizamentos registrados no estado. Somados, desabrigados e desalojados chegam a 79.000. Dos 293 municípios do estado, 49 foram atingidos. Catorze deles decretaram estado de calamidade pública. Nessas cidades, os sobreviventes lutam contra a fome e doenças pestilentas. E, como se não bastasse a desgraça, tentam evitar saques no que sobrou de suas casas e negócios. Foi a maior calamidade já ocorrida em Santa Catarina, que registra grandes enchentes desde 1852.
O rosto clandestino da Abin
Os espiões figuram no imaginário coletivo como pessoas discretas, misteriosas, dotadas de habilidades especiais e normalmente envolvidas em missões perigosas e secretas. Exceto em relação ao último quesito, o tenente Antônio Leandro de Souza Júnior, que aparece na foto ao lado, pouco tem a ver com esse perfil. Policial militar de São Paulo, em seus registros funcionais consta que ele foi requisitado em 2005 pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI), no Palácio do Planalto, para integrar a equipe de segurança do presidente Lula.
Recentemente, porém, seu nome apareceu na lista dos 84 espiões da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) que atuaram na operação que investigou o ex-banqueiro Daniel Dantas. O que apenas um círculo muito restrito do poder sabe é que foi graças a um descuido do tenente Leandro que eclodiram as primeiras pistas sobre a ação clandestina dos agentes do estado e, por conseqüência, a revelação da existência de uma rede de espionagem ilegal que monitorava políticos, jornalistas e autoridades, entre elas o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, que teve seus telefones criminosamente grampeados pelos espiões a serviço da Abin. VEJA localizou o tenente Leandro de Souza em Jundiaí, cidade distante 63 quilômetros de São Paulo.
Para entender seu papel no episódio é preciso retroceder a 27 de maio passado. Naquele dia o tenente Leandro foi flagrado por policiais da Delegacia Anti-Seqüestro do Rio de Janeiro em "atividade suspeita" numa avenida da Zona Sul da cidade. Estava a bordo de um Astra prata de propriedade da Abin, estacionado em frente a um prédio de apartamentos. Inquirido sobre o que fazia ali, o militar exibiu uma identidade funcional da Presidência da República e se identificou como "tenente Marcos". E, seguindo a versão oficial divulgada pela Abin na ocasião, respondeu que estava em missão sigilosa de acompanhamento de "espiões russos".
Mudança de rumo
Contendas diplomáticas entre nações amigas são comuns, e o Brasil e seus vizinhos da América do Sul não estão imunes a elas. No governo Lula, porém, aliado incondicional do populismo desbragado que viceja no continente, esses atritos estão se tornando, paradoxalmente, muito freqüentes. Há dois anos, o presidente boliviano Evo Morales produziu uma confusão de bom tamanho ao expropriar refinarias da Petrobras. O venezuelano Hugo Chávez vive insuflando seus aliados para agir da mesma forma contra outras empresas brasileiras.
O novo governo paraguaio quer rever o contrato da hidrelétrica de Itaipu e já anunciou que pretende confiscar terras de brasileiros no país. Diante de tantas fanfarronices, o presidente equatoriano Rafael Correa deu sua contribuição e anunciou festivamente que estava pendurando uma dívida de 250 milhões de dólares. Esperava contar com a mesma condescendência dispensada pelo governo brasileiro aos colegas bolivarianos. Não foi o que aconteceu. Numa ação inusitada, o Itamaraty convocou o embaixador em Quito, anunciou o fim das parcerias em obras de infra-estrutura e ameaçou recorrer a organismos internacionais para cobrar a dívida. Rafael Correa recuou.
No governo por liminar
O governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima, do PSDB, ganhou uma sobrevida. Dez dias atrás, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) havia decidido por sua cassação sob a acusação de compra de votos com dinheiro público. Uma semana depois, a mesma corte resolveu conceder a Cunha Lima o direito de permanecer no cargo enquanto todos os seus recursos não fossem julgados. Desde a eleição de 2006, o governador tucano responde por uso da máquina em sua campanha de reeleição. Ele teria utilizado a Fundação de Ação Comunitária, uma repartição do governo estadual, para distribuir 3,5 milhões de reais em 35 000 cheques cujos valores variavam entre 100 e 36 500 reais.
Oficialmente, o objetivo do programa era atender a população pobre, mas até o chefe da Casa Civil de Cunha Lima acabou sendo agraciado com um quinhão. Um professor, Rômulo de Araújo Lima, ficou com 56 500 reais. Tanto o secretário quanto Araújo Lima doaram dinheiro para a campanha eleitoral do tucano. Cunha Lima parece ter sete vidas. Ele foi julgado culpado desse crime pela primeira vez em julho de 2007, pelo Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba. Desde então, vem recorrendo de sucessivas decisões contrárias. O governador já sabe até o que fará se o TSE cassá-lo de uma vez por todas. Nesse caso, antecipará sua campanha para conquistar uma vaga no Senado. Poderá candidatar-se ao posto porque, até lá, terá cumprido sua eventual pena de inelegibilidade.
Primeira grandeza
O presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama, anunciou na semana passada a equipe com a qual enfrentará a mais grave crise econômica mundial desde 1929. Com as finanças americanas assemelhando-se a um barco numa forte tempestade, Obama deixou de lado a fluida bandeira eleitoral da mudança. Deu preferência a segurança e pragmatismo.
Para o cargo de maior peso, o de secretário do Tesouro, foi escolhido Timothy Geithner, 47 anos, atualmente presidente do Federal Reserve (Fed) de Nova York e vice-presidente do comitê de política monetária da instituição. No fim dos anos 90, Geithner notabilizou-se como um talentoso assessor internacional do Tesouro. Ele negociou empréstimos essenciais à solução de diversas crises que atingiram alguns países emergentes. A escolha de Geithner simboliza a garantia de uma transição sem sacolejos. Ele ocupa posição de destaque na hierarquia do Fed e é próximo de Ben Bernanke, o presidente da instituição, cuja permanência no cargo ainda é incerta. Geithner e Bernanke formularam juntos os recentes pacotes que salvaram da falência bancos como o Bear Stearns e o Citigroup, além da seguradora AIG.
Época
É possível evitar uma tragédia dessas?

Presa pela terra até a cintura, Marinéia gritava por socorro. “Me puxa, me puxa”. Foi a última vez que Juliano viu a mulher. Agarrado à filha e quase submerso na lama, ele tentava se equilibrar quando veio uma enxurrada e cobriu tudo de água. “Foi muito rápido, uns dois ou três minutos. Eu consegui segurar a Larissa até fazer assim, ó.” Juliano tomba o tronco para a esquerda com o braço flexionado, como se estivesse carregando a menina. Desvia o olhar. Emudece. Juliano foi resgatado na tarde da segunda-feira, por um helicóptero do Exército. Tinha escoriações nas pernas, nos braços e nas costas.
Para ajudar Santa Catarina, o presidente Lula editou uma medida provisória liberando pouco mais de R$ 1 bilhão. Outros R$ 600 milhões serão destinados a outros Estados atingidos por chuvas. O dinheiro irá para o resgate das vítimas e para a reconstrução de portos e estradas. Tanto a solidariedade como a rapidez do governo em liberar recursos são louváveis. É o que se espera num momento de crise. Mas tão importante quanto essas reações imediatas é traçar um plano de ação para evitar novas tragédias. É possível? A chuva que caiu na região foi sem precedentes. Blumenau recebeu, em 24 horas, entre os dias 22 e 23 de novembro, 283 milímetros de chuva torrencial. É o equivalente à média de todo o mês de novembro. Em Itajaí, este novembro teve 670 milímetros de chuva, o maior volume desde que começaram as medições, em 1980. Esta é a explicação óbvia para a enchente: água demais. Mesmo assim, o desastre não precisava ter essa magnitude.
MP acusa pastor da Universal de pagar funcionárias da Igreja Universal com dinheiro público
O Ministério Público de Goiás entrou na Justiça com uma ação civil contra o ex-vereador de Goiânia Valter Soares (sem partido), acusado de improbidade administrativa. Segundo o promotor de Defesa do Patrimônio Público Fernando Krebs, que assina a ação, Soares empregava em seu gabinete quatro servidoras que, na verdade, prestavam serviços para a Associação Beneficente Cristã (ABC) e a Igreja Universal do Reino de Deus da capital goiana. O ex-vereador, que ocupou o cargo entre 2001 e 2004, é pastor da Universal. “Apesar de terem seu salário pago com dinheiro público, essas funcionárias apareciam pouco no gabinete”, diz Krebs. O prejuízo à Câmara foi calculado em R$ 193.050.
O promotor também acusa Soares de reter o salário de R$ 2,2 mil da assessora Lucinéia Chermant e repassar a ela apenas o equivalente a um salário mínimo, à época entre R$ 151 e R$ 200. De acordo com a ação, o ex-vereador dizia à funcionária que o restante seria revertido para a ABC, entidade da qual ele era presidente. Soares também é acusado de ter obrigado Lucinéia a fazer um empréstimo de R$ 4,5 mil, no Banco do Brasil, sob a alegação de entregar o dinheiro à entidade. A ABC e a Universal aparecem como rés na ação por “receber os serviços (...) sem despender nenhum dinheiro por isso”.
“Fiquei pasmo”, diz Furlan
Quando deixou o comando da Sadia em 2002 para ocupar o posto de ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o empresário Luiz Fernando Furlan estava tranqüilo com o legado que deixava. A Sadia, empresa fundada por seu avô, Attilio Francisco Xavier Fontana, inspirava outras companhias brasileiras com sua eficiência, transparência e poder de fogo no mercado internacional. Já faturava cerca de US$ 700 milhões com exportações.
Por tudo isso, segundo ele, foi um choque a convocação para colocar a empresa de volta no rumo porque havia perdido mais de R$ 600 milhões com derivativos. “Fiquei pasmo”, disse Furlan em entrevista a Época Negócios. “Há quase seis anos afastado da empresa, todas as indicações que eu tinha era que a Sadia passava por uma fase tranqüila.”
Por tudo isso, segundo ele, foi um choque a convocação para colocar a empresa de volta no rumo porque havia perdido mais de R$ 600 milhões com derivativos. “Fiquei pasmo”, disse Furlan em entrevista a Época Negócios. “Há quase seis anos afastado da empresa, todas as indicações que eu tinha era que a Sadia passava por uma fase tranqüila.”
Sua rotina à frente do conselho de administração inclui não apenas reorganizar a diretoria financeira e os instrumentos de gerenciamento de risco. Furlan reviu a agenda de investimentos, prepara o lançamento de novos produtores e tem visitado unidades para motivar a equipe. Tem pela frente a ameaça de processos movidos por acionistas minoritários nos Estados Unidos e uma investigação da Comissão de Valores Imobiliários, que avalia uso de informação privilegiada em negociações de ações às véspera da divulgação das perdas com derivativos. Furlan diz que pretende punir os responsáveis pela perda e não sairá do posto até que a Sadia volte ao azul e reconquiste a confiança dos investidores. “Espero ficar aqui o tempo necessário para que a empresa retome sua trajetória – uns dois ou três anos.”
R$ 104 milhões do Banco Central vão para o beleléu
A PF deu ofi cialmente por encerrada na quarta-feira 19 a Operação Topeira, que visava a prender todos os envolvidos no maior furto já ocorrido no Brasil: R$ 164,8 milhões (notas de R$ 50 usadas e não seriadas) levados em 2005 da agência do Banco Central em Fortaleza (foto). Desse montante, a polícia admite que R$ 104,8 milhões foram para o beleléu - nunca mais se verá a cor desse dinheiro. A ação dos ladrões levou seis horas, com três quadrilhas operando em sociedade (S.A. mesmo). A dinheirama toda pesava 3,4 toneladas e foi levada do cofre para uma empresa vizinha (de fachada) através de um túnel. Foram presas 122 pessoas, entre elas o candidato a prefeito de Boa Viagem Antonio Argeu (fi nanciou o túnel) e alguns policiais que descobriram bandidos envolvidos mas, em vez de prendê-los, passaram a seqüestrá-los para exigir resgate, pago com parte do dinheiro furtado.
O mapa da dengue
O Ministério da Saúde divulgou na quinta-feira 20 o mapeamento das cidades em alerta ou risco de surto de dengue. Pelo menos 33 milhões de pessoas estão ameaçadas. No total, são 76 cidades. Epitaciolândia (AC), Várzea Grande (MT), Itabuna (BA), Camaçari (BA) e Mossoró (RN) são consideradas áreas de surto.
Carta Capital
Um prêmio à impunidade
Antério Mânica, prefeito reeleito de Unaí e suspeito de ser um dos mandantes da chacina de
quatro auditores do trabalho na cidade, quatro anos atrás, acaba de ser condecorado pela Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Recebeu, na segunda-feira 24, a Medalha de Ordem ao Mérito Legislativo, pelos “serviços excepcionais” prestados em 2008. Aplaudido por “mais de mil convidados”, diz o site do Parlamento mineiro. A homenagem irritou entidades engajadas no combate ao trabalho escravo e associações de auditores do trabalho.

Os funcionários foram assassinados numa emboscada, enquanto realizavam uma fiscalização na zona rural de Unaí, no noroeste de Minas. No decurso das investigações da Polícia Federal, os irmãos Norberto e Antério Mânica, que figuravam entre os maiores produtores de feijão do País, foram apontados como os mandantes do crime. Os fazendeiros chegaram a ser presos, depois receberam o benefício de aguardar o julgamento em liberdade. Apenas os executores do crime continuam na cadeia. Meses depois da chacina, Antério foi eleito prefeito da cidade pelo PSDB. Conquistou, dessa forma, foro privilegiado. O motivo do crime seriam as constantes multas aplicadas pela equipe de auditores contra os produtores por descumprimento de leis trabalhistas.
As autuações somaram cerca de 2 milhões de reais. A Associação dos Auditores Fiscais do Trabalho de Minas Gerais divulgou nota de repúdio contra a condecoração de Antério Mânica pelos deputados estaduais. “A homenagem prestada a um dos suspeitos de ser mandante daquela execução afronta a todos os auditores do Trabalho do Brasil.”
Lacerda é o alvo
Há exatos três meses, o delegado Paulo Lacerda vive em um mundo particular de solidão e clausura, à espera de uma possível absolvição de um crime sobre o qual não há nenhuma evidência concreta de que tenha sido cometido. Atualmente, para achar o delegado – uma das estrelas do primeiro mandato de Lula justamente por ter transformado a Polícia Federal em um órgão público eficiente –, é preciso cruzar o subsolo do Palácio do Planalto e passar por um posto de vigia, onde, invariavelmente, dois ou três funcionários ficam a perguntar, um ao outro, quem é Lacerda. Delegado? Onde ele fica? No gabinete do GSI? Na Senad? O GSI é lá em cima, mas a Senad é aqui embaixo. Alguém sabe o ramal? Não é, portanto, fácil encontrar o policial, que passa os dias enfurnado numa sala esquecida da Secretaria Nacional Antidrogas.
Com seus modos franciscanos, escondido no subsolo do mesmo palácio onde diariamente vários de seus adversários circulam na tentativa de removê-lo de vez da direção da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Lacerda tem tentado sobreviver a um mundo em desconstrução, inclusive de forma literal. Em 1º de setembro, o delegado foi afastado temporariamente do cargo de diretor-geral da Abin depois de ter sido acusado de participar de um suposto grampo telefônico de um insosso diálogo entre o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Publicado pela revista Veja, sem que o áudio da tal conversa tenha jamais aparecido, o suposto grampo serviu à tese de que se vive no Brasil um “Estado policial” e um descontrole do aparelho jurídico-policial, representado pela PF, a agência de inteligência, o Ministério Público e juízes de primeira instância que se portariam como justiceiros.
Já houve tempos em que um diretor-geral da Polícia Federal (Vicente Chelotti) foi afastado do cargo por grampear o gabinete de um presidente da República (Fernando Henrique Cardoso). Antes disso, arapongas do extinto Serviço Nacional de Inteligência (SNI) foram identificados como responsáveis pelos grampos ilegais que revelaram os bastidores nada angelicais da privatização da Telebrás (semente da disputa empresarial que desembocaria na Operação Satiagraha). Neste momento, o publicitário Marcos Valério de Souza, que não tem os amigos certos e não tentou subornar um delegado da PF, completa um mês e meio na prisão (na quinta-feira 27, o Supremo Tribunal Federal voltou a negar sua liberdade).
Incrivelmente, nem nos tempos passados e muito menos no caso de Marcos Valério levantam-se vozes para apontar a existência de um “Estado policial” ou para acusar o desrespeito às garantias individuais. Por que a Satiagraha teve o poder de mobilizar tantas forças contra ela? E por que, para muitos no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, tornou-se de vital importância não só afastar Lacerda da Abin, mas aniquilar sua carreira? A imaginária via oblíqua Victor Hugo é o nome do delegado que não só recusou a fortuna que teria sido oferecida por Daniel Dantas, por interpostas pessoas, mas fez apreensões na residência do banqueiro e prendeu, recolhendo provas, os mandatários do consumado crime de corrupção ativa. Apesar de boa parte da mídia usar a expressão tentativa de corrupção, o caso é de um consumado crime de natureza formal.
O crime de corrupção ativa consuma-se quando o oferecimento de vantagem patrimonial indevida chega ao conhecimento do funcionário, independentemente de ele recusar o suborno. Com efeito, coube ao delegado Victor Hugo recolher a informação de que Dantas não tinha um esquema corruptor na primeira instância Judiciária, mas apenas na Superior. No particular, o certo é que Dantas, no Tribunal Federal Regional e no Superior Tribunal de Justiça, só experimentou derrotas. Até agora, apenas obteve sucesso em duas liminares da lavra do ministro Gilmar Mendes, confirmadas pela maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Victor Hugo não é alvo preferencial dos ataques dos defensores contratados por Dantas, que, sob alegação de ilicitudes (sustentam que a prova do suborno virará pó), aproveitam-se para atacar, pesada e pessoalmente, autoridades diversas, da polícia à direção da agência de inteligência, do procurador Rodrigo de Grandis ao juiz Fausto De Sanctis. Mais ainda, eles destilam peçonhas que lograram inocular no STF, em especial no seu presidente Gilmar Mendes. E alguns ministros demonstraram incontida irritação, excesso de linguagem, desejo de punir disciplinarmente magistrados inferiores jurisdicionalmente.
Fora transformar o acessório em principal, contorceram-se para justificar o injustificável salto de entrâncias e o abandono à orientação de súmula da sua jurisprudência. Não bastasse, consagraram, por maioria, o corporativismo muscular, sustentado na força do poder, em vez de na supremacia do racional e do justo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário