João Dias afirmou que nenhuma gravação dos áudios que
entregou à PF contém a voz do ministro, mas que seria impossível ele não
conhecer o esquema
Vannildo Mendes, de O Estado de S.Paulo
Em novo depoimento, que durou mais de quatro horas, o
policial militar João Dias informou ontem à Polícia Federal que pelo menos
vinte Organizações Não Governamentais (ONGs) estão dispostas a delatar o
esquema de arrecadação de propina que o PC do B teria montado no Ministério do
Esporte, junto a entidades conveniadas com o programa Segundo Tempo. Os
representantes das entidades, segundo ele, vão depor nos próximos dias.
Como havia prometido no primeiro depoimento, semana
passada, Dias entregou documentos, 13 áudios, um celular e mídias que, a seu
ver, comprovam os desvios de recursos públicos da pasta no programa. O material
será submetido à perícia da PF. Entre as mídias estão dois áudios, publicados
pela revista Veja esta semana, nos quais dirigentes do ministério instruem o
policial a fraudar documentos de prestação de contas de convênios firmados
entre a pasta e duas ONGs que ele dirige.
Segundo o policial, nenhum dos áudios contém a voz do
ministro Orlando Silva, assim como nenhuma das provas o atinge diretamente. Mas
ele observou que seria impossível que Silva não soubesse do esquema. "Se
ele não sabia, como alega, não devia se considerar ministro porque as
exigências eram feitas por assessores diretos, dentro do Ministério e em nome
dele", afirmou. "O próprio secretário executivo dele me atendeu para
dar instruções em seu nome", garantiu.
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João Dias deixa a superintendência da PF após prestar depoimento |
O esquema, detalhou Dias, incluía o pagamento, pelas
ONGs conveniadas, de um pedágio de 10% a 20% para um escritório de consultoria
e a contratação dos serviços de um cartel de seis empresas indicadas pela
cúpula do Ministério, ligadas ao PC do B. Pelo menos 20% de todo o dinheiro dos
convênios firmados com 300 ONGs, conforme o policial, eram desviados e parte ia
para financiar a estruturação do partido e campanhas de candidatos.
"Fui vítima de chantagem e retaliações porque
não aceitei as condições absurdas que me exigiam", afirmou o delator, em
entrevista. Além destas ONGs, ele deu à PF os nomes de outras dez entidades
que, segundo garante, aceitaram condições espúrias para obterem recursos do
programa. As ONGs, para não serem molestadas na prestação de contas, tinham de
comprar produtos e serviços de um pool de seis empresas.
Ele deu à PF os nomes das empresas. Todas serão
intimadas a prestar esclarecimentos. Além das ONGs que se propõem a depor
espontaneamente, Dias citou outras dez que ele diz ter certeza de que aceitaram
pagar o preço ao PC do B para obterem contratos. Entre essas, cinco seriam de
Brasília.
Sua lista inclui ainda uma ONG do Rio e uma de Santa
Catarina. Inclui também três entidades da Bahia. O esquema seria operado dentro
do Ministério por assessores diretos de Silva, entre os quais, o chefe de
gabinete, o secretário executivo, o secretário nacional de esportes
educacionais e os chefes de áreas técnicas e jurídica.
No front externo, os operadores da arrecadação,
segundo ele, seriam o ex-presidente regional do PC do B, Apolinário Rebelo,
irmão do deputado Aldo Rebelo (SP) e o dirigente Fredo Eberling. Ambos já negam
a acusação. A PF não divulgou o teor do depoimento e informou, pela assessoria,
que ainda não fechou o calendário de intimações.
Silva tem negado sistematicamente as acusações,
feitas a seu ver por um "bandido" e "desqualificado". Dias
retrucou no mesmo tom: "Estou provando quem é o bandido
desqualificado". Disse também que, após a devassa que a PF fará nos
convênios, haverá um efeito dominó. "Fui prejudicado porque não quis rezar
na bíblia deles e não aceitei as fraudes, mas agora não vou parar. Isso aqui é
só um pedacinho dessa caixa preta que nós estamos abrindo", prometeu.
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