Magistrados colocaram à venda por R$ 115
mil, sem autorização, sala comercial da Associação de Juízes Federais em
Brasília para pagar empréstimos deles próprios; procurador pede perda de cargo
Fausto Macedo, de O Estado de S.Paulo
O Ministério Público Federal (MPF) em
Brasília denunciou criminalmente, por apropriação indébita, os juízes federais
Moacir Ferreira Ramos e Solange Salgado da Silva Ramos de Vasconcelos - ex-presidentes
da Associação dos Juízes Federais da 1.ª Região (Ajufer), entidade que reúne
magistrados do Distrito Federal e de 13 Estados.
Ramos (presidente da associação entre
2008-2010) e Solange (presidente por dois mandatos, de 2002 a 2006) são
acusados de terem vendido, em fevereiro de 2010, sem autorização de assembleia
da Ajufer, a única sala comercial da entidade, no edifício Business Point,
Setor de Autarquias Sul, em Brasília. O dinheiro da venda, R$ 115 mil, segundo
o MPF, foi usado para abater dívidas de empréstimos que os dois magistrados
tinham com a Fundação Habitacional do Exército (FHE/Poupex).
Ramos é autor de representação criminal
no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a ministra Eliana Calmon, corregedora
nacional da Justiça, que o afastou liminarmente da função em novembro de 2010.
O ministro Marco Aurélio Mello, do STF,
cassou a decisão de Calmon, mas, por maioria de votos, os desembargadores do
TRF-1 restabeleceram a ordem de afastamento do juiz Moacir Ramos. A juíza
Solange continua exercendo suas funções.
Em outra acusação, o Ministério Público
Federal atribui crime de receptação a um terceiro juiz federal, Charles Renaud
Frazão de Moraes, que também presidiu a Ajufer.
Perda do cargo. A denúncia criminal,
protocolada em dezembro, é subscrita pelo chefe da Procuradoria Regional da
República-1, Juliano Villa-Verde de Carvalho. Em dez páginas, ele descreve a
ação dos juízes Moacir Ramos e Solange e requer a condenação de ambos inclusive
à perda do cargo de juiz federal.
O procurador pediu, preliminarmente, o
deslocamento do processo ao STF, alegando impedimento da maioria dos
desembargadores do TRF-1, já que 17 deles são associados à Ajufer "e,
portanto, direta ou indiretamente interessados na causa". O TRF-1 deve
decidir no início de fevereiro se recebe a denúncia ou se remete os autos ao
Supremo.
"Da documentação trazida percebe-se
que foram os próprios denunciados, à revelia da assembleia geral de associados
e sem mesmo sequer obter autorização expressa da diretoria executiva, que
deliberaram pela venda do único imóvel de propriedade da Ajufer", assinala
o procurador Juliano Villa-Verde.
Segundo a denúncia, os magistrados
"infringiram normas estatutárias da entidade, o que revela a intensidade
do dolo com que se houveram, premeditadamente, criando a disponibilidade
financeira à custa do patrimônio da entidade, na intenção de se apropriar de
recursos que passariam a deter em nome do ente jurídico".
O procurador destaca que o imóvel foi
negociado a um valor muito reduzido. Avalia que a venda poderia chegar a R$ 350
mil. "O que se verifica é que a pressa em alienar o bem, para dar destino
ilícito no produto do negócio, foi o que justificou sua venda por preço
inferior ao de mercado."
Fraude em empréstimos. Relatório do
corregedor do TRF-1, desembargador Cândido Ribeiro, aponta contratos de
empréstimos supostamente fraudulentos, entre 2000 a 2009, contra 182 juízes
federais. Ele propôs abertura de Processo Administrativo Disciplinar contra
eles.
Solange afirmou nos autos que as
despesas cotidianas da Ajufer eram reunidas para o pagamento semanal e/ou mensal
e quitadas diretamente na agência da Caixa Econômica Federal, mediante a
emissão de um único cheque com o valor total, e que tal procedimento tinha por
objetivo dar maior praticidade.
Mas o desembargador Cândido Ribeiro
anotou em seu voto: "A relação dos 21 cheques assinados pela referida
magistrada (Solange) para o seu sobrinho, totalizando R$ 491.673,89, não aponta
para pagamento de despesas cotidianas da Ajufer".
A Ajufer é alvo de ação de cobrança da
Fundação Habitacional do Exército, que alega ser credora de R$ 21 milhões.
"Conseguimos suspender a ação de cobrança e identificar todos os que
retiraram os empréstimos, por volta de 40 juízes, e também identificar cerca de
180 em cujos nomes foram feitos contratos fraudulentos", declarou o atual
presidente da associação, Roberto Carvalho Veloso. "A própria fundação não
sabia que estava sendo fraudada."
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