Com o poder econômico alterando a
balança de um voto para cada cabeça, a sociedade não é governada pelas maiorias
que saem das urnas, mas sim pelo dinheiro das grandes empresas, diz jurista
POR LUIZ FLÁVIO GOMES

Nas CPIs, por exemplo, em incontáveis
vezes, os poderosos “compram” a impunidade, sobretudo por meio da omertà (o
silêncio dos mafiosos) em relação às suas falcatruas, impedindo (na esfera
política) a investigação e a descoberta da verdade. Em maio, conforme matéria
do Estadão, na CPI mista da Petrobras, a base aliada do governo e a oposição
(juntos) chegaram ao consenso de impedir ações e quebras de sigilos das
empreiteiras (oito delas doaram em 2014, já nas primeiras apurações, R$ 182
milhões para as campanhas dos parlamentares). Na contabilidade final esse
número será muito maior. Os fornecedores da Petrobras foram “blindados” pelos
integrantes da CPI, em 16 de julho (situação e oposição se uniram uma vez mais
para não descobrir a verdade). No dia 5 de novembro, PT e PSDB deliberaram (na
CPI da Petrobras) não convocar nenhum dos seus “protegidos” para depor. Essas
são algumas maneiras de interferir corruptivamente no funcionamento da
democracia. Mas há outras.
Os financiadores endinheirados, que são
os grandes eleitores, “doam” recursos para os políticos e para os partidos e
depois “cobram” (caro) esse investimento. Eis um primeiro exemplo: algumas
empresas fizeram doações “legais” de R$ 400 mil ao diretório do PMDB de
Alagoas, que repassou o dinheiro para a campanha de Renan Calheiros (de 2010);
três meses depois tais empresas “doadoras” cobraram o retorno dos
“investimentos” feitos e obtiveram contratos suspeitos (de bilhões) com a
Transpetro (que era dirigida por Sérgio Machado, afilhado político de Renan
Calheiros). O grupo vencedor das licitações (ERT) agora está acusado de fraude.
A malignidade dessas operações criminosas produz não somente efeitos
financeiros (enriquecimento sem causa), senão também políticos (porque
corrompem a democracia).
Outro estrondoso exemplo de “compra”
(financiamento) dos parlamentares reside no escândalo tsunâmico da Petrobras
(de efeitos e consequências imprevisíveis), cujas primeiras revelações
(delações) já são mais do que suficientes para desmoronar toda estrutura (historicamente
frágil) da nossa democracia. O dinheiro e seu poder conseguem subornar os
políticos (e seus partidos) e, dessa forma, ditar políticas públicas favoráveis
aos seus “negócios”, fragilizando a própria democracia (que é o pior de todos
os regimes, como sabemos, com ressalva dos demais, como dizia Churchill –
1874-1965). O edifício da democracia, laboriosamente reconstruído nos últimos
três séculos (no Brasil, particularmente nas últimas três décadas), vira pó
quando o voto do parlamentar (corrompido) é resultado não dos seus ideais, das
suas convicções e dos seus compromissos assumidos durante a campanha, sim, do
dinheiro que foi gasto em sua disputa política (“doado legalmente”, se diz) ou
dos recursos dos grandes poderosos (grandes eleitores) que ditam as decisões do
Estado, impedindo que os governos e os parlamentos eleitos deem cumprimento aos
seus projetos eleitorais.
Nas democracias corruptas
(escandalosamente “compradas” pelos endinheirados) a sociedade não é governada
pelas maiorias que saem das urnas (muita gente não tem a mínima ideia disso),
sim, pelo dinheiro das grandes empresas (e/ou dos grandes empresários), que são
(no final) os “governantes” reais do país. A questão de fundo, na verdade, nem
é o dinheiro em si, sim, os interesses, normalmente escusos (quando não
escatológicos), que ele representa. Os exemplos dessa nefasta anomalia política
(que é a democracia corrupta) se multiplicam, no nosso país, infinitamente.
Para citar apenas mais dois deles, basta prestar atenção no que está ocorrendo
atualmente na Câmara dos Deputados, com as discussões do novo Código da
Mineração assim como do PL 3722/12, do deputado Peninha Mendonça, que revoga o
Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03). Em ambos as comissões que estão
discutindo tais assuntos foram majoritariamente “compradas” (financiadas) pelos
respectivos segmentos empresarias (que doam dinheiro para as campanhas
eleitorais e depois cobram o retorno no momento da aprovação de projetos dos
seus interesses). Mais corrupção da democracia que isso é impossível imaginar.
Publicado no site Congresso em Foco
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