O Judiciário e o Ministério Público não
barraram as ofensas contra a democracia porque eram parte da conspiração
![]() |
Unidos pelo golpe: Temer na posse de Gilmar Mendes na presidência do TSE |
Por Maria Inês Nassif
A estratégia do golpe institucional, com
papel ativo do baixo clero do Legislativo e de instâncias judiciárias (o juiz
de primeira instância Sérgio Moro e o
Supremo Tribunal Federal), e ação publicitária dos meios de comunicação
tradicionais (TV Globo e a chamada grande imprensa) começou a ser desenhada no chamado Escândalo
do Mensalão. Um ano antes das eleições presidenciais que dariam mais um mandato
ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o país foi sacudido por revelações de
que o PT usara dinheiro de caixa dois de
empresas para pagar as dívidas das campanhas das eleições municipais do ano
anterior, suas e de partidos aliados. O tesoureiro do partido, Delúbio Soares,
era o agente do partido junto a empresários e a uma lavanderia que até então operava
com o PSDB de Minas, a agência de publicidade DNA, de Marcos Valério. Delúbio
tornou-se réu confesso. Outro dirigente do partido, Sílvio Pereira, foi
condenado por receber um Land Rover de presente de um empresário.
Em torno do episódio – crime de captação
de caixa dois pelo partido que está no governo e recebimento de presentes em
troca de favores – se iniciaria a maior ofensiva institucional contra um
partido político jamais ocorrida em períodos democráticos do país. Toda a
máquina midiática tradicional foi colocada a serviço de provar – com fatos
amplificados, versões ou falsificações – que o governo de Lula estava corroído
pela corrupção, que o PT aparelhara a máquina pública para auferir ganhos
desonestos para o partido ou para os seus aliados, que o governo corrompera os
aliados – ironia das ironias, os “corrompidos”, os partidos da base aliada,
eram o PMDB, o PTB, o PP, o PR.... – com mesadas para os parlamentares,
destinadas a garantir as maiorias em plenário necessárias para aprovar matérias
de interesse do Executivo. O termo “mensalão” foi criado nessa jogada de
marketing, destinada a transformar um escândalo de caixa dois, no qual todos os
partidos estavam envolvidos (a lavanderia de Marcos Valério não tinha
restrições ideológicas à adesão de qualquer um deles), em um modo peculiar de
corrupção do PT, a compra direta do parlamentar, sem que em nenhum momento
houvesse sido provado o pagamento regular a deputados e senadores da base
aliada. Afinal, o dinheiro da lavanderia de Marcos Valério foi direto para o
caixa dois de outros partidos políticos, no período pós-eleições municipais – e
o “denunciador” do mensalão, o presidente do PTB, Roberto Jefferson, chegou a
confessar, quando se viu em tribunal, que
dinheiro era para pagamento de dívidas de campanha.
Para ser corrupção, todavia, era preciso
que se caracterizasse o dinheiro do caixa dois como originário dos cofres
públicos. O Ministério Público, então presidido pelo procurador Antônio
Fernando de Souza, hoje advogado do deputado tardiamente afastado da
presidência da Câmara, Eduardo Cunha, inventaria a ficção de um dinheiro
desviado da empresa Visanet pelo diretor de Marketing do Banco do Brasil,
Henrique Pizzolatto. A Visanet era uma empresa privada, do grupo internacional
Visa, e esse dinheiro foi tratado indevidamente como produto de desvios do
Banco do Brasil, estatal, num julgamento na maior instância judiciária do país,
que não poderia se dar ao luxo de um erro deste tamanho. Pizzolatto não tinha
autonomia para assinar uma única ação de marketing sozinho. A “prova” que Souza
apresentaria contra ele, aceita pelo relator Joaquim Barbosa, do STF, foi
assinada por outras três pessoas e submetida a um comitê, e depois à diretoria
de um banco – a ação publicitária, ao final, fora autorizada por mais de uma
dezena de pessoas. Não existia possibilidade de que Pizzolatto tivesse desviado
o dinheiro: para isso, teria que ter
mais de dez cúmplices, e ainda assim atuaria sobre dinheiro privado, que não
era do Banco do Brasil.
O Supremo Tribunal Federal, nas vésperas
da eleição de 2014, julgou midiaticamente o caso e perpetrou barbaridades
jurídicas nunca antes vistas na história desse país. O relatório do ministro
Joaquim Barbosa transformou um crime de captação de caixa dois em desvio de
dinheiro público, e jogou as provas de que o dinheiro definitivamente não havia
sido desviado do Banco do Brasil para um inquérito paralelo. Por fim, decretou
segredo de Justiça. Sequer os advogados de defesa tiveram acesso a elas. Também
não tiveram acesso a provas da origem do dinheiro lavado por Marcos Valério: a
transferência de fartos recursos do caixa de um empresário interessado em
decisões de governo (que não foram tomadas, inclusive por oposição do ministro
José Dirceu, condenado sem provas), repassados aos partidos da base aliada. O
empresário em questão chegou a aparecer no início do escândalo na mídia e sumiu
como um fantasma das páginas dos jornais e dos inquéritos policiais e
judiciais.
Com a opinião pública dominada por uma
campanha diária de nove anos, o STF legitimou sua decisão de avalizar as
conclusões de Barbosa, acatou o estranho instrumento do “domínio do fato” e, a
partir disso, a pretexto de ouvir a voz das ruas, aceitou as barbaridades que
seriam praticadas pelo Ministério Público e pela justiça de primeira instância
na Operação Lava Jato, nos últimos três anos.
O STF transformou um crime de caixa dois
em crime de corrupção, de formação de quadrilha, etc. etc. sem provas. Dos réus
que foram condenados, alguns cometeram crimes, mas não os que os levaram para a
prisão; outros eram inocentes de quaisquer crimes e foram condenados assim
mesmo. Poucos foram condenados por crimes que efetivamente cometeram. A Agência
DNA foi punida por atuar como lavanderia do PT e dos partidos aliados, mas tardiamente
responsabilizada pelo Mensalão do PSDB (que vai deixar todos os implicados
soltos até a prescrição do crime, o mesmo que levou o PT e seus aliados à
cadeia). O deputado José Genoíno, então presidente do PT, foi preso por um
empréstimo efetivamente feito pelo partido e quitado no prazo estipulado em
contrato. Dirceu foi eleito o vilão nacional e encarcerado – e de novo
encarcerado no Lava Jato – sem nenhuma prova contra si. E Pizzolatto, depois de
uma fuga sensacional, amarga cadeia porque, junto com um comitê de dezenas de
pessoas, autorizou uma campanha publicitária do Banco do Brasil paga pela Visa
Internacional. Alguns membros do mesmo comitê respondem a um processo na
primeira instância que está esquecido na gaveta de um juiz da capital federal.
Desde então, o Ministério Público
Federal e o Supremo Tribunal Federal se constituem em peças fundamentais nas
articulações contra os governos petistas, iniciadas em 2005 e que tiveram
desfecho no golpe institucional deste 2016. Eduardo Cunha e Michel Temer não
existiriam sem a cumplicidade das duas instituições e a inexplicável
ingenuidade do PT: o mesmo partido que em determinado momento se dispôs a jogar
com as armas da política tradicional, indo à cata de dinheiro de caixa dois das
empresas para financiar campanhas eleitorais, não entendeu a natureza da elite
que o financiava, nem a impossibilidade de acordo com a política tradicional e
com instituições de vocação conservadora que mantiveram seu perfil conservador
e corporativo, apesar de seus membros terem sido majoritariamente escolhidos
pelos presidentes petistas. O PT não entendeu que jogava as suas fichas, a
nível institucional, numa política de conciliação de classes num quadro onde as
próprias políticas do governo davam as bases para uma acirrada luta de classes,
que se tornou explícita quando o golpe começou a mostrar sua cara. Essa foi uma
contradição inerente aos governos petistas. Na campanha eleitoral de 2014, a
presidenta Dilma Rousseff venceu no segundo turno porque rapidamente as forças de
esquerda se articularam em torno dela, em reação à onda de comoção criada pela
direita, que se utilizou do clima proporcionado pelo julgamento político levado
a termo pelo Supremo Tribunal Federal (STF) poucos meses antes do início do
processo eleitoral, no chamado caso do mensalão; e pela entrada em cena do juiz
de primeira instância Sérgio Moro que, aproveitando-se das licenças jurídicas a
que se permitiu o STF em 2013, fez o seu próprio tribunal político, fechando o
cerco ao PT por um esquema de corrupção na Petrobras que – basta ler com
atenção as delações premiadas – era enraizado na empresa e mantinha em
diretorias protegidos de partidos que estavam aliados aos governos petistas
depois de 2002, mas igualmente aos governos anteriores, do PSDB e do PMDB e do
governo Collor.
Já são 11 anos de massacre, com armações
com grande similaridade. O Ministério Público encontra um escândalo qualquer e
começa a investigar, considerando provas basicamente de um lado. Sem
consistência para pedir um inquérito, vaza os dados para um órgão de imprensa,
que os publica como grande escândalo, desconhecendo o fato de que as provas não
existem. Imediatamente, a matéria do jornal, baseada em vazamentos do próprio
MPF, vira o indício que o MPF usa para pedir ao juiz – a Moro, ou ao STF, ou a
algum outro – para abrir o inquérito. No
caso de Moro, seguem-se prisões sem base legal e coações à delação premiada.
Chovem no Youtube reproduções de interrogatórios presididos pelo próprio juiz
Moro onde ele deixa claro ao interrogado – normalmente um velho com problemas
de saúde -- que será libertado apenas se delatar; e de advogados protestando
contra ele por não considerar sequer uma prova apresentada pela defesa antes de
condenar um implicado. Nesses vídeos, é claro que Moro está investido da
intenção de condenar antes de ouvir a defesa. Para ele, não existem inocentes
em um campo político. No outro campo político, suas intenções são dóceis. O
justiceiro é bastante permissivo com o campo político da direita.
Nada justifica que um juiz de um
tribunal de exceção sobreviva numa democracia com amplos poderes, acima
daqueles que a Constituição lhe confere, sem a aquiescência da maior instância
judiciária. Moro existe e faz o que quer porque o sistema jurídico está
contaminado pelo partidarismo. Moro não existiria sem um Barbosa que o
precedesse. Moro não existiria sem o ministro Gilmar Mendes, que impunemente
transformou o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) em palanques contra os governos do PT. Não existiria sem o ministro Dias Toffoli,
que se tornou moleque de recados de Mendes; sem a tibieza das duas ministras
mulheres; sem o conservadorismo ideológico de Teori Zavascki (que contamina o
seu discernimento jurídico); sem a falsa objetividade jurídica de Celso Melo;
sem a frouxidão de Edson Fachin; sem a excessiva timidez de Ricardo
Lewandowisk. A Justiça não evitou o golpe porque é parte do golpe. O Ministério
Público não reagiu ao golpe porque era um dos conspiradores.
Gilberto, não sou de partido nenhum, torço para que o Brail vá pra frente, até que você é um cara legal, mas o Brasil tem um novo presidente, para de postar essas coisas de "golpe", você é inteligente e aceite isso, Flavio Dino se queimou, votei nele, mas quando ele apoiou dilma publicamente, perdeu meu voto e de meus familiares, cara,será que 90% dos brasileiros que queriam o pt fora estavam errados?
ResponderExcluirum abraço.