José Antunes Sobrinho, do Grupo Engevix, relata ao juiz Sérgio Moro que em reunião na casa do então senador Gim Argello, em 2014, ouviu pedido de 'contribuição' de R$ 5 milhões para não ter que depor na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do Congresso.

POR RICARDO BRANDT, JULIA
AFFONSO E FAUSTO MACEDO
O Estado de São Paulo
O empresário José Antunes
Sobrinho, sócio do Grupo Engevix, declarou ao juiz federal Sérgio Moro que
durante uma reunião, em 2014, na casa do então senador Gim Argello (PTB/DF), em
Brasília, ouviu pedido de ‘doação’ no valor de R$ 5 milhões em troca de não ter
que depor na CPI Mista da Petrobrás, em curso no Congresso naquele ano.
Sobrinho definiu a estratégia de
pressão adotada por Gim Argello que agia supostamente em nome da CPI Mista da
Petrobrás, chantageando empreiteiros. “Pagou não seria chamado”, disse
Sobrinho. “Deixando de pagar seria chamado”.
O empreiteiro depôs na
sexta-feira, 24, como testemunha na ação penal contra Gim Argello, preso na
Operação Vitória de Pirro, desdobramento da Lava Jato.
José Antunes Sobrinho também é
réu da Lava Jato, mas em outro processo na Justiça Federal do Rio – decorrente
da Operação Radioatividade, que em julho de 2015 prendeu o almirante Othon
Pinheiro, ex-presidente da Eletronuclear acusado de recebimento de R$ 4,5
milhões em propinas nas obras da usina de Angra 3.
Na audiência do processo contra
Gim Argello, realizada sexta na Justiça Federal de Curitiba – base da Lava Jato
– Sérgio Moro indagou do empreiteiro se o então senador cobrou R$ 5 milhões de
cada empresa ou R$ 5 milhões de todas as empresas citadas na CPI Mista da
Petrobrás.
“Cinco milhões pra cada empresa
que viesse a participar, ou seja, se são oito empresas seriam R$ 40 milhões”,
respondeu enfaticamente Sobrinho.
A Operação Vitória de Pirro
descobriu que a UTC Engenharia, do empreiteiro Ricardo Pessoa – condenado nesta
sexta a oito anos e dois meses de prisão – atendeu à solicitação de Argello e
repassou R$ 5 milhões. A OAS, outra empreiteira alvo da Lava Jato, pagou R$ 350
mil que foram parar na conta de uma igreja de Taguatinga, no Distrito Federal,
frequentada pelo ex-senador.
Sobrinho disse que ouviu o
pedido, mas afirma que a Engevix não contribuiu com nada. Nem por isso ele e
seu sócio Gérson de Mello Almada foram chamados para depor na CPMI da
Petrobrás.
Ele contou que soube da pressão
da CPMI durante um encontro em um restaurante no Aeroporto Juscelino
Kubtscheck, em Brasília, com o empreiteiro Léo Pinheiro, dono da OAS. “Ele (Léo
Pinheiro) disse da preocupação muito grande das empresas envolvidas na Lava
Jato e que gostaria de saber do interesse da Engevix, se nós tínhamos interesse
de participar de um grupo de empresas que faria uma colaboração para que a CPMI
fosse barrada, de forma que os executivos não fossem chamados a prestar
depoimento.”
O procurador da República que
participou da audiência perguntou. “Qual o valor que ele (Léo Pinheiro)
sugeriu?”
“O valor sugerido para cada
empresa era de R$ 5 milhões”, respondeu Sobrinho.
O procurador indagou sobre as
empresas que teriam sido ‘convidadas’ a contribuir para se verem livres da
CPMI. “Além da OAS, a Toyo Setal, a UTC, a Camargo Corrêa, a Odebrecht. Não sei
se Galvão ou Queiroz Galvão. Ele (Léo Pinheiro) disse que nós (Grupo Engevix)
estávamos convidados a participar. A ideia colocada é que seria paga uma
quantia em dinheiro de alguma maneira, sob a coordenação do ex-senador Gim
Argello. Ele (Léo Pinheiro) teria conversado já com o dr. Gim no sentido de
que, com base nessa colaboração, as empresas não fossem chamadas pela CPI
Mista.”
O procurador quis saber o que
decidiu a Engevix. “Nessa época tinha eclodido a Lava Jato.Eu disse ao Léo que
não era eu que cuidava (de pagamentos para a CPMI). Eu passei o assunto para o
meu sócio Gérson de Mello Almada. Internamente tínhamos um consenso de não
atender (à chantagem). Eu, pessoalmente, me retirei do tema. Entre maio e junho
fiquei internado em São Paulo. Nunca mais falamos.”
O empresário disse que, em
julho, recebeu ligações de assessores de Gim Argello cobrando uma definição.
Quem o procurou tamnbém foi o lobista Júlio Camargo, delator da Lava Jato que
revelou pagamento, em 2011, de US$ 5 milhões em propinas para o presidente
afastado da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ).
“No início de julho (2014) fui
procurado por Júlio Camargo. Ele disse ‘vocês não estão dando nenhum retorno’
para o Gim Argello. Expliquei ao Júlio da decisão de não me envolver com isso,
com essa situação. O Júlio me pediu que desse uma satisfação (a Gim Argello).
Depois, o Júlio me ligou e pediu que eu escutasse o senador pelo menos.”
A prova sobre o recado do
lobista-delator ao empresário foi encontrada no WhatsApp do próprio José
Antunes Sobrinho – uma mensagem que Júlio Camargo dizia para ele procurar o
‘Gim tônica’, em referência a Gim Argello.
Sobrinho contou na audiência com
o juiz Sérgio Moro que, enfim, foi à residência do então senador, em Brasília.
“O encontro foi num fim de tarde, uns 40 minutos”, relatou o sócio da Engevix.
“Nessa reunião estavam ele (Gim Argello) e dois assessore dele, Paulo Roxo e
Valério Neves. Um filho do Gim Argello apareceu na sala, nos cumprimentou e não
ficou. O assunto foi a possível participação da Engevix nesse cluibe de
empresas dispostas a repassar R$ 5 milhões.”
Segundo o empresário, Gim Argello
‘comentava que tinha boas relações com o relator da CPMI e com o presidente da
Comissão, (senador) Vital do Rêgo (hoje ministro do Tribunal de Contas da
União)’. “Ele disse que imaginava que poderia ser do nosso interesse e queria
contar com a participação da Engevix.”
Foi perguntado ao empresário
sobre ‘o tom de Gim Argello nesse pedido’.
Segundo José Antunes Sobrinho, o
então senador explicou que várias empresas haviam concordado em contribuir.
“Ele disse que ‘naturalmente eu podia ficar à vontade’, se eu não quisesse
participar outra empresa poderia entrar no nosso lugar.”
“Não foi um tom agressivo, em
todo caso de certa forma se não cooperássemos algum tipo de problema poderia
ter…Ele disse que era um ‘privilégio’ poder participar…”
Sobrinho afirma ter dito ao
então senador que ‘seria muito difícil’ a Engevix participar. “Na verdade, a
partir daí, recebi uma série de telefonemas, uns quinze telefonemas. Não
respondi. Tínhamos decisão já tomada, o assunto morreu por si.”
Em uma ligação que diz ter
atendido, Sobrinho conta que Paulo Roxo, um dos assessores de Gim Argello,
‘pedia os valores, se a Engevix iria contribuir’.
“A Engevix nunca pagou”,
declarou Sobrinho ao juiz Moro. “Ninguém foi convocado (pela CPMI).”
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