O presidente do PCdoB do Maranhão, Márcio Jerry, diz que o partido prometeu “prestigiar” quem apoiasse Dino. “Adotamos uma opção: em 2014 a gente dizia que precisava do apoio para eleger Dino governador e que depois, no momento seguinte, eles seriam prestigiados. Seriam eleitos e teriam espaço na estrutura partidária. Quem entrou, estava alinhado no processo eleitoral”.
Por
Cristiane Agostine/de São Luís
Jornal
Valor Econômico
“Só a China tem mais cidades comunistas do que
o Maranhão”, diz o governador maranhense, Flávio Dino, em tom de brincadeira. O
“comunismo” avançou como nunca nestas eleições no Estado mais pobre do país, o
Maranhão. O PCdoB, partido do governador, atraiu parte da antiga base política
da família Sarney e passou de cinco prefeitos eleitos em 2012 para 46, dois
anos depois da vitória de Dino para a gestão estadual.
A
sigla elegeu o maior número de prefeituras do Estado e tem a maior fatia do eleitorado
sob seu comando. Ao mesmo tempo, o sarneysismo se enfraqueceu depois de quase
cinco décadas do comando da oligarquia no Estado. O PMDB do ex-presidente José
Sarney teve o número de prefeitos reduzido a menos da metade e caiu dos 48
eleitos em 2012, na administração Roseana Sarney, para 22.
No
único Estado comandado pelo PCdoB, o governador construiu um amplo grupo
político, que inclui PT e PSDB, e conquistou sete em cada dez prefeitos do
Maranhão nesta eleição. Das 217 cidades, Dino e seus aliados ganharam em 150
(69,1% do total), pavimentando a candidatura à reeleição do governador, já em
construção.
Os
neocomunistas, como são chamados os prefeitos eleitos recém-filiados ao PCdoB,
não são necessariamente de esquerda. Parte veio da base de antigos aliados dos
Sarney, do PMDB e PV, em uma filiação que segue um padrão semelhante: quase
todos se filiaram nos últimos dois anos, depois da vitória do governador e
foram para o partido em processo liderado por Dino. É o caso, por exemplo, do
prefeito eleito de Bom Jesus das Selvas, Fernando Coelho, cidade a 465
quilômetros da capital. Antes de filiar-se ao PCdoB, Coelho estava no PV e
participou de uma gestão municipal do DEM.
O
convite para entrar no PCdoB e disputar neste ano foi feito àqueles que
ajudaram na eleição de 2014 e tinham potencial eleitoral para concorrer à
prefeitura e reforçar a base governista. Não há nenhum prefeito eleito que
tenha se filiado antes de 2006, quando Dino elegeu-se deputado federal. O
próprio governador está no partido há onze anos.
O
presidente do PCdoB do Maranhão, Márcio Jerry, diz que o partido prometeu
“prestigiar” quem apoiasse Dino. “Adotamos uma opção: em 2014 a gente dizia que
precisava do apoio para eleger Dino governador e que depois, no momento
seguinte, eles seriam prestigiados. Seriam eleitos e teriam espaço na estrutura
partidária. Quem entrou, estava alinhado no processo eleitoral”.
Supersecretário
na gestão estadual, responsável pela articulação política e pela comunicação,
Jerry diz que a identidade nos neocomunistas é mais com Dino e o governo do que
com a ideologia do partido. “Passamos por um longo período de obscurantismo
político e isso reduz muito o espaço para uma filiação por identidade política,
ideológica, programática”, afirma, em meio a críticas às décadas da oligarquia
Sarney no poder. O principal aliado do governador diz que o “comunismo não foi
implantado no Maranhão”. “O projeto político está nos marcos do capitalismo, da
legalidade burguesa”, afirma Jerry, que acompanhou de perto as doações feitas
para as campanhas. “Estamos assegurando o pleno funcionamento do capitalismo”,
ironiza.
O
governador diz que o partido foi flexível ao promover as novas filiações para
fortalecer sua base no Maranhão. “O PCdoB não é um partido marxista-leninista.
A gente não fez prova de quem leu o ‘Manifesto Comunista’, ‘O Capital’ nem
pedimos para cantar a “Internacional’. Não tem esse fechamento e seria errado
se tivesse”, afirma.
Dino,
no entanto, conseguiu aglutinar também a esquerda entre os novatos e atraiu
petistas descontentes com os rumos do PT, que está enfraquecido no Estado e
elegeu apenas sete prefeitos. Fundador e militante por 30 anos do PT, o
ex-deputado Domingos Dutra é um dos mais ferrenhos adversários da família
Sarney no Maranhão e depois de uma breve passagem pelo Solidariedade foi eleito
prefeito pelo PCdoB de Paço do Lumiar, na região metropolitana da capital.
O
número de prefeituras conquistadas pelo PCdoB nesta eleição é semelhante ao
obtido pelo PDT e PMDB nas duas disputas municipais anteriores e mostra o peso
do governo do Estado na definição dos novos prefeitos. Em 2008, o PDT, do então
governador Jackson Lago, falecido em 2011, elegeu 66 prefeitos. Quatro anos
depois, Roseana emplacou 48, dois a mais do que os 46 do partido de Dino.
O
presidente do PCdoB maranhense diz que a estratégia do partido é diferente da
adotada por Lago. Assim que foi eleito, o então governador do PDT promoveu uma
ampla filiação dos prefeitos que disputariam a reeleição, mas isso não garantiu
o apoio desses prefeitos a ele. Parte desse grupo voltou à base sarneysista
assim que o governador pedetista deixou o poder. Já os neocomunistas, diz
Jerry, foram recrutados não só depois da vitória do governador, mas também
durante as campanhas de Dino em 2010 e 2014. “Não fizemos uma abertura
indiscriminada, senão teríamos eleito 120 prefeitos do PCdoB. O critério foi a
participação na vitória”.
Nem
todos neocomunistas se engajaram na campanha de Dino como o dirigente comunista
diz. O prefeito reeleito de Barra do Corda, Eric Costa, evitou envolver-se na
campanha do governador em 2014, por ter relações com o sarneysismo. Em 2012,
foi eleito pelo PSC com forte apoio de Roseana. No entanto, depois da vitória
de Dino, entrou em acordo com o partido do governador e migrou para a base do
comunista. Outro caso é o do prefeito eleito de Poção de Pedras, Julio
Cascaria, que entrou na reta final da campanha de 2014, quando já era prevista
a vitória do candidato do PCdoB.
“Não
vou dizer que hoje o partido é todo de quadros orgânicos. É um partido
comunista de massas, dirigidos por quadros”, diz Jerry. “Mas isso é uma etapa
da disputa de hegemonia do Estado. Organizando um grupo, conseguimos apoios”.
Nesta
eleição, o governador avançou na base tradicional do sarneysismo: pequenos
municípios do interior, com baixo índice de desenvolvimento humano (IDH) e
dependentes da ajuda do Estado. A estratégia de filiação para o PCdoB para
enfraquecer o sarneysismo atingiu em cheio não só o PMDB, mas também o PV do
ministro Zequinha Sarney (Meio Ambiente), filho de Sarney. O partido tinha 20
prefeituras no começo de 2015, mas perdeu 12. Nesta eleição, elegeu 7
prefeitos.
O
PCdoB lançou 103 candidatos a prefeito e elegeu 44% deles. Há quatro anos,
disputou com 25 e emplacou 20%. Neste ano, a legenda elegeu também 27
vice-prefeitos e 213 vereadores. O partido comandará 754 mil eleitores e o
PMDB, 587 mil.
Dino
ajudou também seus aliados, como o PSDB, que ocupa a vaga de vice em seu
governo. O partido elegeu o segundo maior número de prefeituras, com 29. O PDT,
outro aliado antigo do governador, venceu em 28 prefeituras. A soma do
eleitorado das cidades comandadas pelos aliados do governador chega a 2,2
milhões, mais da metade do total do Estado. “Levamos em conta o leque de
alianças. O PSDB multiplicou por três o número de prefeituras. O PDT multiplicou
por dois”, diz Jerry.
A base
do governador também teve vitórias em grandes cidades, como Açailândia, com a
reeleição do neocomunista Juscelino Oliveira. Dos dez maiores municípios,
aliados de Dino venceram em oito.
Na
capital, com 660 mil eleitores (14,3% do total), a disputa foi para o segundo
turno e o governador tenta minimizar um provável desgaste eleitoral caso seu
candidato, o prefeito Edivaldo Holanda Junior (PDT), que tem o PCdoB como vice,
perca. Dino tem afirmado que não vai considerar como sua derrota se o
adversário do prefeito, deputado estadual Eduardo Braide (PMN), ganhar. Braide
foi líder do bloco governista na Assembleia Legislativa em 2015 e Dino diz que
terá boa relação com ele, se eleito.
O
governador cita a vitória em municípios simbólicos para seu grupo contra a
família Sarney: Pinheiro, terra natal do ex-presidente pemedebista; Mirador,
onde o senador Edison Lobão nasceu; Presidente Sarney; Governador Edison Lobão;
Coroatá, onde a atual prefeita, Teresa Murad, cunhada de Roseana, mulher do
ex-secretário Ricardo Murad, foi derrotada, e Peritoró, onde o sobrinho de
Roseana foi derrotado.
O
resultado eleitoral, no entanto, mostra que o sarneysismo ainda tem força no
Estado e ameaça Dino. O governador enfrentou duras derrotas em cidades grandes
como Imperatriz, a segunda maior do Estado, e em Caxias, onde fez parcerias e
destinou recursos. “A corrente liderada por Sarney continua relevante. Eles
mantêm uma presença política e muita força econômica, midiática. Não imagino
que o grupo será dissolvido”, afirma Dino. ”
Apesar
da atração de prefeitos de pequenos municípios com acenos de recursos, o
governo diz que terá uma atuação diferente à do sarneysismo. “Não fizemos uma
relação clientelista, baseado em determinados convênios que serviu mais para
financiar políticas do que para política pública como fez o sarneysismo”, diz
Jerry. No entanto, a filiação de parte expressiva dos neocomunistas está
justamente baseada na expectativa de repasses e benesses.
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