Procuradoria-Geral da República disse haver indícios de constituição e
participação em organização criminosa do presidente, do senador Aécio Neves
(PSDB-MG) e do deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR)
Breno Pires e Rafael Moraes Moura
O Estado de São Paulo
O presidente da República, Michel Temer (PMDB), será investigado por,
pelo menos, dois crimes: corrupção passiva e obstrução à investigação de
organização criminosa. No pedido de abertura de inquérito contra Temer, o
senador Aécio Neves (PSDB) e o deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR),
a Procuradoria-Geral da República disse haver indícios de constituição e
participação em organização criminosa, por parte das autoridades, mas não
especificou se todos os três serão investigados por isso neste inquérito
específico.
A PGR não respondeu ao questionamento feito pela reportagem sobre se Temer
também está incluído como investigado pelo suposto crime de participação em
organização criminosa.
Um quarto crime descrito no inquérito é o de corrupção ativa, neste caso,
atribuído apenas a Joesley Batista, pelo pagamento de R$ 2 milhões acertada
para Aécio Neves para pessoas de confiança do senador.
O despacho em que autorizou a investigação de Temer foi no dia 2 de maio
de 2017 mas a abertura de inquérito só noticiada nesta quinta-feira (18), após
a Polícia Federal realizar busca e apreensão em diversos locais para trazer
mais elementos à investigação contra Temer, Aécio e Rocha Loures.
Fachin destacou entre os fatos que podem configurar crimes descritos pela
PGR a conversa entre Joesley Batista e Michel Temer. Um dos trechos é o em que
Joesley e Temer falam sobre Eduardo Cunha.
“Joesley afirma que tem procurado manter boa relação com o ex-deputado,
mesmo após sua prisão. Temer confirma a necessidade dessa boa relação: ’tem que
manter isso, viu’. Joesley fala de propina paga ‘todo mês também’ ao Eduardo
Cunha, acerca da qual há a anuência do presidente”, disse Janot no pedido de
abertura em trecho citado por Fachin. O ministro também destacou trechos sobre
Temer indicando o deputado Rodrigo Rocha Loures “como pessoa de sua extrema
confiança para tratar dos temas de interesse do Joesley”, nas palavras da PGR.
Janot também narrou trechos de diálogos de Rocha Loures com Joesley.
No depoimento prestoado à PGR, Joesley Batista falou mais sobre atitudes
que vinha tomando para manter em silêncio Eduardo Cunha e Lucio Funaro,
operador do ex-parlamentar. Batista disse ter pago R$ 5 milhões em saldo de
propina a Cunha. O delator também disse no depoimento “que continua pagando ao
Funaro R$ 400 mil para garantir o silêncio dele e de Cunha” e “que sempre
recebeu sinais claros que era importante manter financeiramente ambos e as
famílias, inicialmente por Geddel Vieira Lima e depois por Michel Temer”.
Sem imunidade
O pedido de abertura de inquérito foi feito inicialmente em 7 de abril,
mas o ministro Edson Fachin autorizou apenas em parte, deixando de fora o presidente,
pedindo uma “manifestação expressa por parte da Procuradoria-Geral da
República” sobre se a regra da imunidade temporária à persecução penal se
aplicaria a Temer neste caso. Janot defendeu que é inaplicável a regra de
imunidade.
“Em casos anteriores postos à análise desta Procuradoria-Geral da
República, como é de conhecimento público – inclusive já em relação ao próprio
atual detentor do mandato de presidente da República – reputou-se aplicável a
regra excepcional do parágrafo 4º do Art. 86 [da Constituição] forte no
entendimento de que os fatos em análises naqueles casos não estavam diretamente
ligados ao exercício do mandato. A regra excepcional, contudo, não se coaduna
no presente caso”, disse Janot.
“Como também se depreende do relato e das circunstâncias fáticas de
tempo, modo e lugar descritas na petição de instauração, os fatos estão
diretamente relacionados ao exercício da função [grifo da PGR]. Nesse sentido,
importante registrar que um dos delitos em tese cometidos é o de corrupção
passiva, o qual, como é sabido, pressupõe justamente o exercício de cargo,
emprego ou função pública por parte do agente”, disse Janot.
Fachin, então, concordou que é possível haver investigação de presidentes
mesmo em atos estranhos ao mandato. “Mesmo na hipótese (a de atos estranhos ao
exercício das funções) caberia, em tese, proceder a investigação a fim de, por
exemplo, evitar dissipação de provas, valendo aquela proteção constitucional
contra a responsabilização apenas, e não em face da investigação criminal em
si”, disse — em um posicionamento diverso do que Janot apresentou ao pedir
arquivamento de citações a Temer feitas por delatores da Odebrecht.
“No presente caso, o Procurador-Geral da República apresenta pedido para
instaurar investigação por atos que entende diretamente vinculados ao exercício
das funções”, acrescenta Fachin.
O ministro disse que é neste caso um dever “acolher o intento ministerial
de investigar”, para “colher elementos, inquirir, enfim reunir dados que
ensejem a formação da opinio delicti, levando, ulteriormente, ao pedido de
arquivamento do próprio inquérito ou a propositura de ação penal com oferta da
respectiva denúncia”. “O que se põe, por agora, é apurar fatos sob suspeição”,
disse.
Áudio
Fachin também disse que é válida a gravação de quatro áudios feita por
Joesley e entregues ao Supremo como parte do acordo de delação premiada. Um
áudio foi com Temer, outro com Aécio Neves e dois com Rocha Loures.
“Convém registrar, ainda e por pertinência, que a Corte Suprema, no
âmbito de Repercussão Geral, deliberou que ‘é lícita a prova consistente em
gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do
outro’. Desse modo, não há ilegalidade na consideração das quatro gravações em
áudios efetuadas pelo possível colaborador Joesley Mendonça Batista, as quais
foram ratificadas e elucidadas em depoimento prestado perante o Ministério
Público (em vídeo e por escrito), quando o referido interessado se fez,
inclusive, acompanhado de seu defensor”, afirmou Fachin no seu despacho.
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