Nas últimas semanas, como todos sabem, é a minha intimidade, de minha esposa e meus filhos, dos meus companheiros de trabalho que tem sido violentada por meio de vazamentos ilegais de informações que deveriam estar sob a guarda da Justiça.
FOLHA DE SÃO PAULO
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva publicou carta aberta nesta quinta-feira (17) em que afirma que a
gravação e divulgação de conversas telefônicas suas com aliados violentaram a intimidade
de sua família.
No texto, Lula também se defende das
críticas que recebeu depois que foram tornados públicos trechos em que afirma
que o STF (Supremo Tribunal Federal) e o STJ (Superior Tribunal de Justiça)
estão "acovardados".
Na manhã desta quinta, o ministro do STF
Celso de Mello disse que as conversas de Lula mostravam uma reação "torpe
e indigna, típica de mentes autocráticas e arrogantes que não conseguem
esconder o temor pela prevalência do império da lei"
Sem citar o ministro, Lula disse na
carta que não admite que conversas pessoais divulgadas "ilegalmente"
sejam usadas para fazer julgamentos sobre seu caráter ou consideradas uma
"ofensa pública".
"Não me conformo que, neste
episódio, palavras extraídas ilegalmente de conversas pessoais, protegidas pelo
Artigo 5o. da Constituição, tornem-se objeto de juízos derrogatórios sobre meu
caráter. Não me conformo que palavras ditas em particular sejam tratadas como
ofensa pública, antes de se proceder a um exame imparcial, isento e corajoso do
processo arbitrário e ilegal que levou ao vazamento ilegal de tais
conversas.", afirma o ex-presidente.
Lula ainda diz que, durante seu mandato
como presidente, sempre mostrou respeito pelo Poder Judiciário. Como prova,
lembra que chegou a afastar a direção da Polícia Federal após surgirem
evidências de que o então presidente do STF Gilmar Mendes havia sido vítima de
uma escuta ilegal.
"Nos oito anos em que exerci a
presidência da República, por decisão soberana do povo –fonte primeira e
insubstituível do exercício do poder nas democracias– tive oportunidade de
demonstrar apreço e respeito pelo Judiciário", diz o texto.
Leia a íntegra da carta:
Creio nas instituições democráticas, na
relação independente e harmônica entre os Poderes da República, conforme
estabelecido na Constituição Federal.
Dos membros do Poder Judiciário espero,
como todos os brasileiros, isenção e firmeza para distribuir a Justiça e
garantir o cumprimento da lei e o respeito inarredável ao estado de direito.
Creio também nos critérios da
impessoalidade, imparcialidade e equilíbrio que norteiam os magistrados
incumbidos desta nobre missão.
Por acreditar nas instituições e nas
pessoas que as encarnam, recorri ao Supremo Tribunal Federal sempre que
necessário, especialmente nestas últimas semanas, para garantir direitos e
prerrogativas que não me alcançam exclusivamente, mas a cada cidadão e a toda a
sociedade.
Nos oito anos em que exerci a
presidência da República, por decisão soberana do povo –fonte primeira e
insubstituível do exercício do poder nas democracias– tive oportunidade de
demonstrar apreço e respeito pelo Judiciário.
Não o fiz apenas por palavras, mas
mantendo uma relação cotidiana de respeito, diálogo e cooperação; na prática,
que é o critério mais justo da verdade.
Em meu governo, quando o Supremo
Tribunal Federal considerou-se afrontado pela suspeita de que seu então
presidente teria sido vítima de escuta telefônica, não me perdi em
considerações sobre a origem ou a veracidade das evidências apresentadas.
Naquela ocasião, apresentei de pleno a
resposta que me pareceu adequada para preservar a dignidade da Suprema Corte,
e afastei a direção da Polícia Federal, para que as suspeitas fossem livremente
investigadas e se chegasse, assim, à verdade dos fatos.
Agi daquela forma não apenas porque
teriam sido expostas a intimidade e as opiniões dos interlocutores.
Agi por respeito à instituição do
Judiciário e porque me pareceu também a atitude adequada diante das
responsabilidades que me haviam sido confiadas pelo povo brasileiro.
Nas últimas semanas, como todos sabem, é
a minha intimidade, de minha esposa e meus filhos, dos meus companheiros de
trabalho que tem sido violentada por meio de vazamentos ilegais de informações
que deveriam estar sob a guarda da Justiça.
Sob o manto de processos conhecidos
primeiro pela imprensa e só depois pelos diretamente e legalmente interessados,
foram praticados atos injustificáveis de violência contra minha pessoa e de
minha família.
Nesta situação extrema, em que me foram
subtraídos direitos fundamentais por agentes do estado, externei minha
inconformidade em conversas pessoais, que jamais teriam ultrapassado os limites
da confidencialidade, se não fossem expostas publicamente por uma decisão
judicial que ofende a lei e o direito.
Não espero, nem seria republicano
esperar, que ministros e ministras da Suprema Corte compartilhem minhas
posições pessoais e políticas.
Mas não me conformo que, neste episódio,
palavras extraídas ilegalmente de conversas pessoais, protegidas pelo Artigo
5o. da Constituição, tornem-se objeto de juízos derrogatórios sobre meu
caráter.
Não me conformo que se palavras ditas em
particular sejam tratadas como ofensa pública, antes de se proceder a um exame
imparcial, isento e corajoso do processo arbitrário e ilegal que levou ao
vazamento ilegal de tais conversas.
Não me conformo que o juízo
personalíssimo de valor se sobreponha ao direito.
Não tive acesso a grandes estudos
formais, como sabem os brasileiros. Não sou doutor, letrado, jurisconsulto. Mas
sei, como todo ser humano, distinguir o certo do errado; o justo do injusto.
Os tristes e vergonhosos episódios das
últimas semanas não me farão descrer da instituição do Poder Judiciário. Nem me
farão perder a esperança no discernimento, no equilíbrio e no senso de
proporção de ministros e ministras da Suprema Corte.
Justiça, simplesmente justiça, é o que
espero, para mim e para todos, na vigência plena do estado de direito
democrático.
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