“Essa conduta de Jair Bolsonaro representa o ato desumano de infligir dor intencional e sofrimento mental sobre as vítimas do coronel Ustra e aos membros da família dessas vítimas, assim como a toda a comunidade brasileira” disse o presidente da UBE, Durval de Noronha Goyos.
Heloisa Cristaldo
Repórter da Agência Brasil
A União Brasileira de Escritores (UBE)
pediu hoje (27) ao Tribunal Penal Internacional, sediado em Haia, na Holanda, a
abertura de uma investigação criminal contra o deputado federal Jair Bolsonaro
(PSC-RJ) por crimes contra a humanidade. A Corte Internacional de Justiça é o
principal órgão judiciário da Organização das Nações Unidas (ONU).
O pedido foi motivado pelo discurso do
deputado na votação da abertura de processo de impeachment da presidenta Dilma
Rousseff, no último dia 17, na Câmara dos Deputados. Na ocasião, Bolsonaro
homenageou o ex-coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos mais conhecidos
torturadores da ditadura militar brasileira, que chefiou o Destacamento de
Operações de Informações/Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi) de
São Paulo.
Segundo a UBE, ao homenagear Ustra e
suas práticas, Bolsonaro cometeu apologia “evidente” ao crime de tortura.
“Essa conduta de Jair Bolsonaro representa
o ato desumano de infligir dor intencional e sofrimento mental sobre as vítimas
do coronel Ustra e aos membros da família dessas vítimas, assim como a toda a
comunidade brasileira” disse o presidente da UBE, Durval de Noronha Goyos.
Para a entidade, Bolsonaro, além de ser
apologista do regime militar, “se autodeclara preconceituoso, racista,
homofóbico e opositor aos direitos indígenas e homossexuais, bem como um
debochado proponente de um sistema de quotas para congressistas negros.”
De acordo com a UBES, assim que o
Tribunal de Haia receber o pedido irá julgar a admissibilidade da ação. Caso
processo seja admitido, Bolsonaro será intimado a comparecer à Corte para
prestar esclarecimentos.
OAB
Na última segunda-feira (25), a Ordem
dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro (OAB/RJ) protocolou na Câmara dos
Deputados e na Procuradoria-Geral da República requerimento denunciando o
deputado por quebra de decoro parlamentar e apologia à tortura.
Na representação, de 24 páginas, a OAB
pede a cassação do deputado por “diversas violações à Constituição brasileira,
ao Regimento Interno da Câmara e ao Código de Ética parlamentar”. Na avaliação
da entidade, “não cabe a essa Casa do Povo outra postura senão a cassação do
mandato do representado, uma vez que sua presença macula e desrespeita o
parlamento brasileiro”.
Resposta
Em nota, Bolsonaro informou que
"não há qualquer sentença condenatória por crimes de tortura transitada em
julgado em desfavor do coronel Carlos Alberto Brilhante Ulstra" e que
opiniões, votos e palavras são garantias constitucionais, "mesmo em Estado
de Sítio". Para Bolsonaro, sua aceitação perante a opinião pública tem
despertado a vontade de alguns setores de cassar seu mandato "a qualquer
custo".
Leia
a íntegra da petição da União Brasileira de Escritores ao Tribunal de Haia
Ao Tribunal Penal Internacional Haia Países
Baixos
Ref.: Deputado Federal Brasileiro Jair Messias
Bolsonaro
Caros Senhores,
O objetivo desta comunicação é solicitar
que o Tribunal inicie uma investigação criminal próprio motu por crimes contra a humanidade, contra o deputado
brasileiro Jair Messias Bolsonaro, pelos motivos expostos abaixo.
Jair Messias Bolsonaro, nascido 21 de março
de 1955, é um cidadão brasileiro que atualmente exerce o sexto mandato como
Deputado Federal, representando o Estado do Rio de Janeiro e membro do Partido
Social Cristão (Partido Cristão Social).
Bolsonaro, um nacionalista de direita e conservador,
com orgulho se auto declara preconceituoso, racista, homofóbico e apologista
implacável do regime militar, que governou o Brasil entre 1964 e 1985. É
oponente público e feroz dos direitos dos homossexuais, dos direitos dos povos indígenas
e debochado proponente de um sistema de quotas para congressistas negros.
Algumas de suas mais controversas declarações públicas são estabelecidas no
Anexo 1 da presente.
Um reservista militar, Bolsonaro tem continuamente
elogiado a ditadura militar no Brasil, especialmente a prática de tortura
contra pessoas consideradas dissidentes, posição que culminou com um elogio
público ao torturador mais famoso do Brasil, numa sessão pública do Congresso
Nacional no domingo 17 de abril de 2016.
Neste 17 de abril de 2016 o Congresso Nacional
votou uma moção para iniciar um processo de destituição contra a presidente
brasileira, Dilma Rousseff.
No processo, transmitido ao vivo por quase
cinco horas em todo o Brasil, cada um dos 513 parlamentares (com exceção de
dois ausentes) se aproximaram do microfone no Congresso e após alguns breves e,
geralmente, vagos comentários, votaram a favor ou contra a destituição.
O parlamentar Bolsanoro, no entanto, escolheu
o momento para elogiar um dos mais notórios torturadores da época da ditadura
militar. Em seu breve comentário, Bolsonaro proferiu o seguinte discurso:
"Nesse dia de glória para o povo
brasileiro tem um nome que entrará para a história nessa data, pela forma como
conduziu os trabalhos nessa casa. Parabéns, presidente Eduardo Cunha. Perderam
em 1964. Perderam agora em 2016. Pela família e pela inocência das crianças em
sala de aula que o PT nunca teve (sic!), contra o comunismo, pela nossa
liberdade, contra o Foro de São Paulo, pela memória do coronel Carlos Alberto
Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff, pelo Exército de Caxias, pelas
nossas Forças Armadas, por um Brasil acima de tudo e por Deus acima de todos, o
meu voto é sim."
Carlos Alberto Brilhante Ustra, que morreu
em 2015, era um coronel do Exército Brasileiro e, de setembro de 1970 a janeiro
de 1974, foi chefe de um departamento conhecido como DOI-CODI do II Exército,
em São Paulo. O principal objetivo deste órgão foi a repressão dos grupos que
se opunham à ditadura militar e grupos de esquerda que atuavam em São Paulo.
Estima-se que, sob sua liderança neste departamento,
pelo menos 60 pessoa desapareceram (dadas como mortas) e mais de 500 casos de
tortura foram cometidos, muitos pelo próprio coronel, dentro dos limites do
DOI-CODI.
Em 2008, num caso ajuizado perante a 23ª
Vara Cível de São Paulo, Ustra tornou-se o único oficial militar a ser
considerado culpado por rapto e tortura e publicamente reconhecido pelos
tribunais como um torturador. Em 2012, o Tribunal de Justiça de São Paulo negou
a apelação de Ustra e confirmou a sentença anterior.
Em maio de 2013, Ustra apareceu em uma sessão
da Comissão da Verdade de São Paulo e, mesmo quando confrontado com um
documento produzido pelo próprio Exército afirmando que 50 pessoas tinham morrido
dentro dos limites do DOI-CODI durante o tempo em que o comandou, ele negou as
acusações e afirmou que ele estava lutando contra o "terrorismo".
Existem numerosos depoimentos testemunhas
que confirmam os ultrajes perpetrados por Ustra, não menos do que os
sobreviventes da tortura infligida tanto por Ustra pessoalmente quanto por pessoas
sob seu comando.
É este indivíduo, portanto, o não
saudoso coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um torturador, a quem o
parlamentar "dedicou" seu voto em favor do impedimento diante de toda
a nação brasileira em 17 de Abril de 2016.
O Estatuto de Roma da Corte Internacional
Criminal define "crime contra a humanidade", no seu artigo 7 da seguinte
forma:
Artigo 7: Crimes contra a humanidade
1. Para efeitos do presente Estatuto, "crime
contra a humanidade" significa qualquer dos seguintes atos, quando cometidos
como parte de um ataque generalizado ou sistemático, contra qualquer população
civil, com conhecimento do ataque:
(a) Homicídio;
(b) Extermínio;
(c) Escravidão;
(d) Deportação ou transferência forçada de
uma população;
(e) Prisão ou outra forma de privação da
liberdade física grave, em violação das normas fundamentais de direito internacional;
(f) Tortura;
(g) Violação, escravatura sexual, prostituição
forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de
violência sexual de gravidade comparável;
(h) Perseguição de um grupo ou coletividade
identificável por razões políticas, raciais, nacionais, étnicos, culturais,
religiosos, de gênero, tal como definido no parágrafo 3, ou outros critérios
universalmente reconhecidos como inaceitáveis no direito internacional, relacionados
com qualquer ato referido neste parágrafo ou com qualquer crime da competência
do Tribunal;
(i) Desaparecimento forçado de pessoas;
(j) O crime de apartheid;
(k) Outros atos desumanos de caráter semelhante,
causando intencionalmente grande sofrimento ou ofensas graves à integridade
física ou à saúde mental ou física.
Aqueles que foram torturados e mortos pelo
já mencionado coronel Ustra foram vítimas de crimes contra a humanidade nos
itens (a); (b); (e) (f); (g) e (h) acima.
A União Brasileira de Escritores (UBE) respeitosamente
entendemos que, pela homenagem ao coronel Ustra, e, por extensão, às suas obras
e ações voltadas à prática da tortura, o deputado Jair Bolsonaro é um
apologista evidente do crime de tortura.
A União Brasileira de Escritores (UBE) acredita,
ainda, que tal conduta de Jair Bolsonaro representa o ato desumano de infligir
dor intencional e sofrimento mental sobre as vítimas do coronel Ustra e os
membros da família dessas vítimas, assim como a comunidade brasileira e as pessoas
em geral. Em nossa opinião tal conduta deve ser qualificada como crime contra a
humanidade sob item (k) do artigo 7 anterior, pelo qual o deputado Jair Bolsonaro
deve ser investigado e chamado a prestar contas a este Tribunal.
Atenciosamente,
Durval de Noronha Goyos Jr.
Presidente da União Brasileira de
Escritores (UBE)
Ricardo de Medeiros Ramos Filho
Vice-Presidente da Diretoria
Cássia Janeiro
Secretaria Geral da UBE
Daniel H. C. Alvarenga
Diretor Jurídico da UBE
Nenhum comentário:
Postar um comentário