Delatores afirmam que ex-governador usava dinheiro de esquema de
corrupção para pagar aula de equitação para filho e mesada para ex-sogra
Constança Rezende
O Estado de S.Paulo
O Estado de S.Paulo
RIO - O Ministério Público Federal (MPF)
conseguiu decodificar parte de uma planilha de despesas do ex-governador do Rio
Sérgio Cabral (PMDB) pagas pelo suposto esquema de corrupção que o peemedebista
teria chefiado durante seu governo, apreendida pela Polícia Federal durante a
Operação Eficiência.
Na tarefa, procuradores da República que
acompanham o caso contaram com a colaboração dos irmãos Marcelo e Renato
Chebar, ex-operadores do esquema que fecharam acordo de delação premiada. Eles
detalharam gastos prosaicos do ex-governador, de custos médicos a recolhimento
de impostos – tudo bancado com dinheiro sujo.
Em seus depoimentos, os irmãos Chebar
revelaram que uma das anotações codificadas refere-se a despesa de R$ 1.500
para o tratamento psicológico da “mulher ou sogra” de Cabral, em uma clínica de
psiquiatria no Leblon, zona sul do Rio.
Também é listado o pagamento mensal de
R$ 3.250 em aulas de equitação para um dos filhos do ex-governador, na
Sociedade Hípica. Somadas todas as vezes em que o nome do instrutor de
equitação aparece na planilha, a organização teria repassado R$ 19,5 mil para
este fim.
Mesada
A ex-sogra e a ex-cunhada de Cabral,
Angela e Nina Neves, respectivamente, também aparecem como receptadoras dos
recursos. O documento traz referências a elas, ao lado dos bancos nos quais têm
conta, com anotações de depósitos mensais de R$ 7.500 para cada uma – no total,
elas teriam recebido R$ 37,5 mil do esquema. Os pagamentos teriam ocorrido
entre agosto de 2014 e fevereiro de 2015. Elas ainda não foram citadas em
nenhuma denúncia.
Os irmãos apontaram ainda o pagamento do
cartão de crédito da ex-mulher de Cabral, Susana Neves, em um valor que iria de
R$ 40 mil a R$ 50 mil. No depoimento, Marcelo diz que entende por “elevados” os
valores.
Os lançamentos que levavam o nome de
“boleto” na planilha, segundo os delatores, correspondiam a pagamentos das
contas corriqueiras do clã, como IPVA, luz, gás e escola. Contam que também
houve um gasto de R$ 11.588 com uma empresa de turismo e outros com uma viagem de
Cabral para Londres.
A força-tarefa da Lava Jato do Rio
trabalha agora para decodificar todos os 1.500 itens listados na planilha.
Segundo procuradores, esses gastos podem motivar novas denúncias. A planilha já
serviu para outras denúncias da Operação Eficiência, desdobramento da Calicute,
que apontou outros receptadores de recursos anotados no documento, como o
publicitário Francisco de Assis Neto, o “Kiko”, que está preso.
Sigiloso
e complexo
Os Chebar relataram aos procuradores que
o esquema dos repasses era sigiloso e complexo. Um dos operadores mais próximos
de Cabral, Carlos Miranda, que está preso, entregava para a dupla boletos
bancários, para que efetuasse os pagamentos.
Com o tempo, os irmãos passaram a fazer
pagamentos por meio de depósitos e, mais tarde, entregaram valores em espécie.
Segundo Marcelo Chebar, Miranda fazia os pedidos por meio de um programa que
transmite mensagens criptografadas.
Como, por vezes, os irmãos tinham de se
ausentar do País para tratar do dinheiro da organização no exterior, foi criado
um e-mail em que os operadores se comunicavam pela pasta de rascunhos, para
evitar o envio de mensagens eletrônicas.
Quando se encontravam na rua, Marcelo
disse que ele e Miranda conversavam andando, por medida de segurança, e que
podiam sentar ao fim da conversa para tomar um café, “mas já nesta ocasião só
tratavam de assuntos casuais”.
Os Chebar trocaram as delações por
futuras penas menores (seis meses de prisão domiciliar e seis meses de
prestação de serviços). Cabral está preso no Complexo Penitenciário de
Gericinó, em Bangu, zona oeste do Rio, desde novembro.
Acusados
A defesa de Carlos Miranda declarou que
“todos os fatos relatados na denúncia serão esclarecidos”. Os advogados de
Susana Neves disseram desconhecer a planilha e não se manifestaram. Angela e
Nina Neves não constituíram advogados. Procuradas pela reportagem, as defesas
de Sérgio Cabral e dos irmãos Chebar não se manifestaram.
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