Eu conversei com várias pessoas para entender de onde partiu a minha indicação. Eu acho que o ex-presidente Sarney até seria um dos meus algozes, que não queria que eu estivesse sentado nesta cadeira na Polícia Federal. Nos quatro anos em que eu estive no Maranhão, não tive nenhum encontro com ele. Vim conhecê-lo aqui em um congresso, em 2013 ou 2014".
“Nós precisamos hoje ampliar as investigações de combate à corrupção. O Brasil tem que ser passado a limpo, ele todo”
“Nós precisamos hoje ampliar as investigações de combate à corrupção. O Brasil tem que ser passado a limpo, ele todo”
Ana Dubeux, Ana Maria Campos,
Leonardo Cavalcanti e Renato Souza
Correio Braziliense
Assim que o nome do delegado Fernando
Segóvia foi anunciado como o novo diretor-geral da Polícia Federal (PF),
surgiram as especulações sobre os motivos da escolha do presidente Michel Temer
para a função estratégica na condução das investigações da Operação Lava-Jato.
A troca desperta rumores porque
justamente o presidente Temer e vários peemedebistas estão entre os alvos de
investigações de desvios milionários. Segóvia nega vinculações políticas,
promete aprofundar o combate à corrupção e garante que o tempo será a resposta
a essas dúvidas. Mas ele adota um tom afinado com o que pensa Temer em relação
a seu principal algoz, o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot.
Em entrevista ao Correio, diz que a
investigação que levou à denúncia contra Temer, no caso JBS, foi açodada e
poderia ter sido muito mais bem-feita com tempo e sem vazamentos. Segóvia
critica vaidades de procuradores, mas não quer briga com o MP. Pelo contrário.
Defende união no trabalho com a equipe da procuradora-geral atual, Raquel
Dodge, com quem já se reuniu.
O novo diretor-geral da PF, aliás,
também está em sintonia com uma outra diretriz de Dodge, a de que os órgãos de
fiscalização devem se dedicar aos casos de corrupção, sem se descuidar dos
demais temas da segurança pública, que estariam renegados em tempos de
Lava-Jato.
O
que muda na sua gestão?
Na troca de diretorias, coloquei pelo
menos dois delegados da geração de 2001, ou seja, que ingressaram naquele ano.
Agora estamos tentando colocar mais mulheres nos cargos de diretoria. Mas
percebi que não houve preparação delas ao longo dos anos. São mulheres
supercapacitadas, mas que não tiveram acesso aos cargos de gestão. Temos a
proposta do empoderamento feminino na Polícia Federal. A última informação que
eu tive é que o número de delegadas representa 20% do efetivo atual.
Todas
as diretorias e superintendências serão trocadas?
Não. Estamos avaliando uma a uma. Existe
uma questão fundamental, que é a proposta de trabalho. A afinidade com o
programa que vamos implementar no Brasil, nas mudanças, é muito importante.
Principalmente de filosofia de trabalho. E é lógico que vem a questão da
confiabilidade. É um cargo de absoluta confiança. Dependendo do que ocorrer na
superintendência regional, pode representar até a queda do diretor-geral.
Então, tem que estar alinhado com a filosofia nova, com a perspectiva que a
gente vai dar. A cerimônia de transmissão do cargo será na segunda-feira pela
manhã. Então, segunda à tarde e terça-feira serão de reuniões com os
superintendentes regionais.
O
que muda em relação à filosofia anterior?
Na verdade, são diretrizes que vamos
tentar implementar dentro da PF. A polícia está um pouco desfocada. E qual
seria essa falta de foco? Essa miopia dentro da segurança pública como um todo.
A gente está olhando muito para baixo. Quando se fala em combate ao tráfico de
armas, estamos lá em baixo, olhando para o fuzil com o traficante do Rio de
Janeiro. O ministro da Justiça pediu que a gente implementasse o combate ao
crime transnacional, que é o grande problema no Brasil. As últimas políticas
eram voltadas para problemas mais caseiros, sem uma visão mais ampla de
segurança pública.
Como
assim?
Se hoje você perguntar sobre segurança
pública para 100 brasileiros, todos vão dizer que é um problema. É uma área no
país que está de mal a pior. Então, se a gente não criar parcerias com as
polícias militares, polícias civis, fizer escritórios de força-tarefa, como
vamos implementar agora no Rio de Janeiro, ficará difícil. Será criada uma
força-tarefa federal, para, aí sim, criar um ambiente para enfrentar o problema
em cada um dos estados. Uma ótica federal em que a gente teria uma parceria com
o Ministério Público nos crimes federais e com o MP estadual nos crimes
estaduais.
O
ministro da Justiça falou de corrupção na polícia do Rio de Janeiro. Concorda
com as afirmações dele?
Olha, eu acho que existem problemas na
segurança pública no país inteiro. A questão de corrupção dentro da polícia é
fato. É algo que está sendo combatido pelas corregedorias. As corregedorias
funcionam. Algumas mais fortes, outras mais enfraquecidas. Dentro da Polícia
Federal, é um pilar. Ao longo desses últimos 20 anos, isso tem dado todo um
diferencial no nosso trabalho. Quando você não tem corregedoria forte, a
corrupção e a quebra de hierarquia começam a se instalar.
A
corregedoria é a única direção que tem mandato efetivo. O corregedor será
trocado?
Não. Conversei com o atual corregedor. O
que está no cargo atualmente é excelente. Ele concordou em permanecer no cargo.
A
estrutura da Lava-Jato será alterada?
A estrutura da operação vai se manter.
Algumas pessoas podem ser substituídas por questão de confiabilidade e questão
de alinhamento com o pensamento que vamos implementar nessas operações. Nós
precisamos hoje ampliar as investigações de combate à corrupção. Mas isso será
feito em conjunto com o Ministério Público Federal. A reunião que tive com a
doutora Raquel Dodge, que durou mais de três horas, foi justamente para a gente
alinhar alguns pensamentos iniciais. Na verdade, era uma visita da cortesia, um
café, um aperto de mão, que acabou se tornando uma reunião de trabalho por
conta dos temas palpitantes.
Na
era Janot, a Polícia Federal manteve uma relação conflituosa com o MP nas
investigações que tramitavam no STF?
Sim, totalmente conflituosa. Esse
conflito cria problemas para as investigações. Essa parceria tem que ser
afinada a tal ponto que os dois, que são os pilares dessa investigação
preliminar, trabalhem em conjunto. Despindo-se da vaidade, de alguns problemas
até interpessoais e pensando no público. No momento em que você para, afasta
essa questão da vaidade e realmente entra na atuação profissional, o trabalho
flui.
O
Janot é vaidoso?
Não sei. Só sei que ele aparecia muito
na mídia e dava a impressão de que queria realmente aparecer. Agora se ele é
vaidoso ou não…
Mas
não era importante que a liderança do MP mostrasse ao país o que estava
ocorrendo?
Era importante, sim, se houvesse
investigações concluídas. Eu acredito que houve uma certa pressa ao se encerrar
algumas investigações. E a gente conclui isso de uma maneira bem simples. Só de
observar, mesmo não estando dentro da investigação. Para quem tem 20 anos de
polícia, como eu que dou aula dentro da Academia Nacional de Polícia. Alguns
fatos chamam bastante atenção.
Que
fatos são esses?
Por exemplo, no dia do anúncio, em que a
Rede Globo expõe ao país as vísceras da investigação, que era numa
quarta-feira, você vê que o Wesley e o Joesley saem do Brasil na segunda-feira,
dois dias antes, aplicando dinheiro, fazendo negociatas do mercado…Para quem
foi realmente arrumada essa data dessa operação? A quem interessava tanto você
colocar uma data tão exata para que tudo isso fosse engendrado dessa tal
maneira?
Precisava
continuar?
Lógico. Eu acredito que uma investigação,
especialmente essa, da maneira como estava sendo conduzida… Era uma única mala.
A primeira das malas, sem rastreador. Se fosse uma investigação da Polícia
Federal, sem interferência nenhuma, eu garanto que não seria uma investigação
de um mês, com uma única mala.
Mas
a impressão que passa é de que quem vazou foi o próprio Joesley…
Mas este tipo de vazamento pode anular
uma delação. Existem hoje ministros do STF que dizem que se houver, pode ser
anulado. As pessoas perguntam se a PF está blindada. E está, pois é arantido o sigilo do inquérito. Se mantiver o
sigilo das investigações, a PF continuará blindada e era isso que deveria ter
acontecido.
Qual
foi o motivo desse açodamento que o senhor aponta?
Exatamente o que ocorreu, não tenho
informações. Mas com toda estranheza do mundo, uma operação foi realizada de
forma rápida, precipitadamente. Em uma rapidez que seria incomum para uma
investigação dessa natureza, com esse tipo de sensibilidade, do qual o senhor
Joesley sabia as datas. Ele sabia porque investiu (no mercado de valores). Você
vê que existe uma precipitação, um jogo todo está ali por trás, que está
havendo alguma coisa que não era natural.
Até
que ponto isso não era natural? Essas declarações são gravíssimas…
Não é uma declaração. São os fatos que
aconteceram. Estou falando de fatos que aconteceram que têm que ser
investigados. O Brasil tem que ser passado a limpo, ele todo. Não é uma questão
de uma pessoa ou outra. Não é porque o doutor Janot fez ações em prol do país,
que estavam certas, eram um momento político delicado e que precisavam ser
feitas. Mas eu acredito que ele tem que esclarecer esses fatos também. O
acusador tem que ser transparente, mais do que todos.
O
procurador Marcelo Miller saiu do Ministério Público e foi trabalhar em um
acordo de delação premiada da JBS. O senhor acha que isso contaminou o trabalho
do procurador-geral?
Olha, as ações da procuradoria também
precisam ser verificadas. Há investigações sendo feitas agora e tudo isso vai
aparecer futuramente. Neste exato momento, prefiro aguardar as investigações
porque não gosto de fazer especulações.
O
presidente Michel Temer especulou que o procurador-geral Janot teria recebido
dinheiro. Quando o senhor foi convidado, houve um pedido para que isso seja
investigado?
Eu acredito que o presidente queira
soluções para todos os casos. O brasileiro quer que todos esses fatos sejam
esclarecidos. O presidente não me perguntou sobre esse assunto. Falamos de
outros fatos, sobre segurança pública, sobre uma polícia forte e republicana. O
principal papel da Polícia Federal é não ter nenhum tipo de atuação política.
Qualquer desvirtuamento de uma
investigação, para qualquer lado que seja, é perigoso para a democracia e
perigoso para o país. Esse foi o teor da conversa com o presidente Michel
Temer. Ele disse que nós precisamos reestruturar a Polícia Federal e colocá-la
nos trilhos da constitucionalidade e da legalidade, sempre com foco na busca da
verdade real. E é isso que vamos fazer, doa em quem doer.
Na
última gestão, não era assim?
Foi um pedido que ele fez acreditando
que essa é a Polícia Federal de que o Brasil precisa. Nós não trabalhamos com
fatos e ilações. Todos os fatos que vierem e suscitarem investigações para
qualquer tipo de desvio serão apurados.
Se chegar a notícia de influências
políticas, nós vamos apurar. Nós temos muito trabalho a ser feito. Nós temos
tráfico de armas no país, temos tráfico de drogas, temos ameaças terroristas no
mundo inteiro. Nós temos que nos preparar para coisas maiores. A corrupção é um
problema gigantesco que temos que enfrentar. Mas não vamos correr atrás de
suposições, de teorias de conspiração.
A
Polícia Federal tem estrutura para todas essas ações atualmente? Precisa de
mais gente?
Quanto mais gente tiver, melhor. Desde
quando eu era superintendente, caminhamos com objetivos claros e dentro da
capacidade de trabalho. É impossível combater todos os crimes com 11 mil
homens. Temos que cuidar de diversas áreas, fora as atividades administrativas,
como passaporte e segurança privada.
Na
Lava-Jato, os delegados e agentes reclamavam que estavam sem condições de pagar
diárias para viagens das investigações. Isso vai ser resolvido?
Na verdade, a PF não tem esse problema.
Na reunião de transição, foi passado que o orçamento para este ano está
resolvido e para o ano que vem, já foi recomposto.
Então
isso é alguma pressão de grupos dentro da PF?
Acredito que seja alguém querendo
desestabilizar de alguma maneira a relação entre a Polícia Federal e o governo
federal. A nossa transparência com o Ministério da Justiça e com a Presidência
da República será a maior possível. Eu até cheguei a fazer uma declaração de
que precisamos de concurso público. Temos um déficit dentro da corporação e
seria necessário contratar mais para melhorar nossa capacidade. Tem pessoal
nosso que está na fronteira há mais de cinco anos, algo que é muito
desgastante.
E
esse pedido será atendido?
Ele disse que pensaria. É um bom sinal,
pois abrimos um canal de diálogo.
No
Rio de Janeiro, vemos o ex-governador Sérgio Cabral preso e agora a operação da
PF contra membros da Assembleia Legislativa. Muita gente acredita que as
afirmações do ministro da Justiça, Torquato Jardim, são reais. Realmente o
poder no Rio está contaminado pelo crime organizado?
Nosso trabalho dentro dessa investigação
é sério. Temos profissionais de alto gabarito realizando esse trabalho no Rio
de Janeiro. Se vemos que estão sendo investigados membros do Tribunal de
Contas, com prisões, tendo aval da Justiça, realmente existem indícios de crimes
neste momento.
O
deputado Picciani chegou a desafiar o ministro da Justiça e acabou preso. Foi
uma resposta?
Não trabalhamos com essas briguinhas.
Trabalhamos com fatos. Temos que trabalhar construindo provas. Não adianta
chegar com suposições na Justiça.
O
caso do reitor da Universidade de Santa Catarina, Luiz Carlos Cancellier, que
foi preso sem ter sido indiciado e acabou se matando, foi um erro da PF?
Infelizmente foi um caso trágico. Foi
muito mais do que uma lição para membros da polícia e do Poder Judiciário.
A delegada (Erika Marena) que estava
conduzindo a investigação é experiente e respeitada dentro da PF.
Inclusive
ela foi a mais votada na lista tríplice dos delegados para a direção-geral...
Houve uma votação dentro da associação
dos delegados, da qual ela foi a mais votada. Mas foi uma votação totalmente
atípica, pois não tinha nenhum dos delegados da administração. Foi mais uma
eleição sindical.
A
delegada Erika Marena errou neste caso do reitor?
Eu acredito que ela está pensando muito se
eram necessários todos aqueles passos. Mas, se houver qualquer tipo de
questionamento quanto à conduta dela, vamos apurar dentro da corregedoria.
Qualquer outra afirmação agora é especulação. Mas qualquer dúvida que seja
levantada pela família ou advogado será investigada.
Por
que o Brasil chegou a esse cenário de corrupção que temos hoje?
Talvez por justamente não ser de praxe
investir na transparência, especialmente dentro do serviço público. Vários
mecanismos que vemos em outras democracias poderiam ser aplicados no Brasil. Um
exemplo é o financiamento de campanha, que chegou a se discutir, mas agora
afundou.
Quando
o senhor fala em ampliar as investigações, seria em nível internacional?
Sim. Inclusive tive contato com alguns
embaixadores. Vamos fazer reuniões aqui no Brasil e no exterior. Vamos ampliar
o trabalho de inteligência. Não adianta prender, desmantelar quadrilha sem
trabalho de inteligência.
O
senhor disse que o foco está voltado para baixo. O que o senhor pensa em
relação à descriminalização das drogas? O Estado perde tempo investigando
traficantes menores e acaba não indo na origem do problema?
Estamos fazendo uma operação no Paraná
prendendo justamente uma grande quadrilha de entorpecentes. Esse é o foco da
PF. Se você me pergunta se eu sou a favor ou não da descriminalização, digo que
sou um servidor público, um policial, que tem o dever de cumprir a lei. Se a
sociedade disser que é crime, nós vamos combater. Se não for crime, vão
continuar fazendo o que quiserem.
O
crime organizado é o maior desafio da PF hoje?
Sim. Tanto o combate às organizações
criminosas nacionais quanto às internacionais. Drogas que vão para a Europa e
para outros continentes passam por aqui. Somos um corredor para escoamento da
droga e o segundo maior consumidor de drogas.
O
nome do senhor foi uma indicação do ex-presidente José Sarney ou do ministro
Eliseu Padilha? Foi uma indicação política?
Eu conversei com várias pessoas para
entender de onde partiu a minha indicação. Eu acho que o ex-presidente Sarney
até seria um dos meus algozes, que não queria que eu estivesse sentado nesta
cadeira na Polícia Federal. Nos quatro anos em que eu estive no Maranhão, não
tive nenhum encontro com ele. Vim conhecê-lo aqui em um congresso, em 2013 ou
2014. Quando eu cheguei ao estado, o governador era o Jackson Lago.
Ao chegar no Maranhão, o doutor Luiz
Fernando, que me convidou na época, me chamou para conversar e com o Leandro
Daiello que era chefe da Coordenação-Geral de Polícia Fazendária, aqui em
Brasília. O Daiello foi convidado para assumir São Paulo e eu, a PF no
Maranhão. Aquela unidade estava com problemas de estrutura e com profissionais
desmotivados. Eu aceitei como um desafio. Missão dada é missão cumprida. Foi a
mesma coisa que eu falei agora.
Em São Luís, o senhor morou em uma casa de um amigo
de Sarney?
Eu fiquei procurando casa quando cheguei
em São Luís, em duas imobiliárias que me apresentaram. Olhei um monte de casas
e, no fim, gostei de uma, assinei o contrato, paguei normalmente o boleto
bancário.
Foi
um aluguel normal?
Eu já forneci até a cópia do contrato,
tenho o extrato de todos os pagamentos. Isso é coisa de quem tenta me destruir,
meus inimigos internos que não querem a Polícia Federal unida. Fico tranquilo.
São
influências políticas?
Com certeza. O enfraquecimento da
Polícia Federal ajudaria muita gente.
Como
será a relação da PF com o Ministério da Justiça agora?
Maravilhosa.
Mas
nem sempre foi assim…
Eu acredito nas palavras do próprio
ministro da Justiça, que é professor de direito constitucional da UnB, da qual
eu sou egresso, que a Polícia Federal tem uma independência muito grande na
questão judicial. É a Polícia Judiciária da União. E faz parte da política de
segurança pública na qual o Ministério da Justiça é o grande gestor. Existem campanhas
e políticas de segurança que o ministério tem que gerir.
O
senhor é a favor da PEC 412, que prevê a autonomia da PF?
Assim que fui nomeado, eu me reuni com
diversas associações e sindicatos. Ficou acertado que todas as propostas que
forem unanimidade entre essas entidades serão apoiadas pela direção da Polícia
Federal.
Mas
a PEC é uma bandeira dos delegados que é combatida por agentes e escrivães…
Se você perguntar aos agentes,
papiloscopistas e peritos existem pessoas que acham que a autonomia é boa e
viável. Talvez eles não gostem desse projeto. Então penso que o que tem que se
discutir são as ideias.
Existe
uma dificuldade em se unir os integrantes da PF. É possível colocar agentes,
escrivães e delegados do mesmo lado?
Eu acredito que houve uma intenção, até
pré-ordenada de haver essa cisão interna. Algumas pessoas foram plantadas para
fazer essa divisão.
Plantadas
no sindicato ou na própria direção?
Não gosto de especular. Mas existem
pessoas que acreditavam que, se houvesse esse tipo de cisão, seria uma forma de
dividir para governar. E conseguiram, de certa forma. Houve um tempo que
conseguiram desunir as carreiras.
Essas pessoas, hoje, tenho sentido
dentro da Polícia Federal, que, se não entrarem em um processo correto de
realinhamento e união, vão ficar escanteadas.
A
PF sempre foi uma instituição respeitada. O combate à corrupção ajudou a
estabelecer a confiança da sociedade na instituição. Mudar o foco agora não
poderá ser visto como um recuo nos objetivos da polícia?
Eu acredito que não, porque nós não
vamos recuar. Essa é a grande diferença. Inclusive, vamos ampliar. Os críticos
falam: “Duvido, colocaram ele lá para acabar com a Lava-Jato”. O que você mais
vê em mídia social é esse tipo de comentário. Eu falo que não tenho que responder
nada a ninguém. Vou responder com ações e as ações é que vão dizer o que a
Polícia Federal é e o que vai ser daqui para frente.
Dá,
então, para unir a classe?
Mais de 90% do nosso pessoal, inclusive
aposentados, estão mandando mensagens dizendo que querem voltar a trabalhar, só
de eu acenar essa campanha de união, trabalho em conjunto, equipe, de respeito
interno de todos. Essa rixa foi aumentando a tal ponto que, na campanha para a
associação dos delegados, em 2013, da qual resolvi participar, percebemos que
isso estava indo para um lado de acirramento interno. A conversa que se tinha
dentro da Polícia Federal era de que uma hora haveria um desastre, uma troca de
tiros entre delegados e agentes.
Como
o senhor avalia a decisão do STF de autorizar a prisão a partir de condenação
em segunda instância?
Todo mundo fala que eu sou muito
político, extremamente envolvido na política, mas eu não sou político. Eu não
faço política e não gostaria de me manifestar até porque o STF vai decidir esse
assunto. A gente vai cumprir a lei e vai continuar prendendo, executando os
mandados conforme as determinações judiciais.
Em
relação ao poder de investigação do MP, o senhor acha que, quando o MP atua
sozinho, a investigação pode falhar? É importante que exista a participação da
Polícia Federal?
Com certeza. A PF é especializada em
investigação criminal. É o nosso cerne, nosso âmago, nós nascemos policiais. O
cara que faz concurso para promotor, procurador tem outro viés muito mais
jurídico do que o nosso. O policial tem que ter aquela veia investigativa, você
sente que o policial foi feito para aquilo, é muito maior do que uma veia
jurídica. A vocação é a diferença. Quando você vê um policial vocacionado,
percebe a dinâmica. É o que a gente brinca lá dentro, tem 30% da polícia que
não para. Você fala e o cara não para, está virando noite, ouvindo (escutas).
Mas há os vocacionados em qualquer
profissão.
Policiais
dizem que o MP prioriza investigações de repercussão e as outras, igualmente
importantes, mas sem repercussão, deixam para a polícia investigar...
À época, inclusive, da discussão da PEC
37, da qual eu era representante da PF, no Congresso Nacional, e depois na mesa
de negociação do Ministério da Justiça, esse era um dos pontos que a gente
levantava. A gente falava: nós não temos
gente suficiente para investigar todos os crimes que acontecem no país, vocês,
muito menos. Nem quantidade, nem equipe, mas nós é que temos as equipes de
investigação. Querer brincar com o filé mignon e largar o osso para a Polícia
Federal não é justo. Eu acho que não é nem por questão de quem quer escolher
investigação. Eu acho que é parceria, essa parceria tem que acontecer em todos
os estágios, em todas as investigações.
Não
ter sido o primeiro nome do ministro da Justiça criou uma saia justa para o
senhor?
Sinceramente, não. Foi uma escolha
pessoal do presidente. Ele me chamou para conversar, me ouviu, no Palácio do
Planalto por mais de duas horas. A gente conversou sobre segurança pública,
pois ele foi secretário de segurança pública. Ele queria saber minha visão da
PF, o que eu achava que precisava fazer e qual seria o foco da segurança
pública. O que eu poderia fazer pela instituição. Depois, o ministro da Justiça
me ligou falando para ir ao gabinete dele.
Eu fui e também conversamos por mais de
duas horas. No fim, ele falou: o presidente da República lhe convidou para
assumir a PF e agora, depois dessa entrevista, o senhor tem o meu aval.
Então,
o presidente da República acha que a Polícia Federal fugiu do foco em alguns momentos?
Sim. Ele pediu para voltar a uma visão
mais republicana.
E
o senhor concorda?
Eu acredito que houve deslizes ao longo
do caminho, que a gente vai trabalhar, intensamente. Será um foco central.
Nas
investigações conduzidas pela PGR, com o foro do Supremo, houve erros da
Polícia Federal?
Isso só apurando caso a caso. Se houver
algum tipo de informação, a gente vai apurar, uma a uma. Em algumas
investigações, a gente tinha participação, em outras, não.
A
Carne Fraca também é exemplo de uma condução midiática?
Eu diria que talvez tenha faltado
avaliação dos riscos da operação. A maneira que foi anunciada por parte da
comunicação... Houve alguns erros.
É
possível que a Polícia Federal atue no combate às “fake news” nas eleições do
ano que vem?
Vamos trabalhar. Nós temos muita gente
capacitada, vários peritos de informática, uma equipe muito grande que trabalha
nessa área. Agora, a gente tem que se preparar. Se é um crime que vai acontecer
no país, nós temos que estar à frente. Temos que nos preparar e se antecipar
para, quando começar o processo eleitoral, nós termos todas as ferramentas para
debelar esse tipo de crime.
O
ex-procurador-geral Rodrigo Janot entrou com ação no STF para impedir a PF de
fechar delações. A PF tem competência para fazer esses acordos?
Tem. Isso inclusive está na lei. Essa
era uma visão do ex-procurador-geral. Nós discordamos disso. Todos nós somos
profissionais do direito e estamos nos defendendo no Supremo. Eu já conversei
inclusive com a doutora Raquel Dodge que essa questão não deveria ser ajuizada.
A PF deveria sentar com o Ministério Público e tratar disso internamente. Todas
as instituições que combatem a criminalidade no Brasil devem se unir.
O
senhor está otimista em relação a isso?
Sim, estou. Eu sou otimista, senão nem
seria policial, não acreditaria no Brasil nem encararia o desafio de combater o
crime organizado.
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