Ele lista episódios que demonstrariam 'desconfiança'
da presidente com ele.
Assessoria do vice disse que ele se surpreendeu com
divulgação da carta.
Andréia Sadi
Da GloboNews, em Brasília
Presidente nacional do PMDB, o vice-presidente da
República, Michel Temer, enviou uma carta à presidente Dilma Rousseff nesta
segunda-feira (7) na qual apontou episódios que demonstrariam a
"desconfiança" que o governo tem em relação a ele e ao PMDB.
A mensagem, segundo a assessoria da
Vice-Presidência, foi enviada em "caráter pessoal" à chefe do
Executivo e, nela, ele não "não propôs rompimento" com o governo ou
entre partidos, mas defendeu a "reunificação do país".
Temer havia passado os últimos dias sem se
pronunciar sobre o acolhimento pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), de pedido de abertura de processo de impeachment. Nesta
segunda-feira, ele participou de evento público em São Paulo, mas não se
manifestou sobre o caso. O PMDB, principal partido da base, está dividido em
relação ao apoio ao processo de impeachement.
Num dos trechos da carta, Temer escreve que passou o
primeiro mandato de Dilma como um "vice decorativo", que perdeu
"todo protagonismo político" que teve no passado e que só era chamado
"para resolver as votações do PMDB e as crises políticas". Depois,
lista fatos envolvendo derrotas que sofreu com atos da presidente.
Na carta, ele cita inclusive o caso de Eliseu
Padilha, ex-ministro da Aviação Civil que pediu demissão nesta segunda-feira
após dias de especulação. Na coletiva de imprensa na qual explicou os motivos
da saída do governo, Padilha mencionou, entre outros fatores, a indicação de um
técnico para o comando da Agência Nacional de Aviação Civil, feita por ele e
barrada pelo governo. Temer citou o caso na carta.
Leia
abaixo a íntegra da carta.
São Paulo, 07 de Dezembro de 2.015.
Senhora Presidente,
"Verba volant, scripta manent" (As
palavras voam, os escritos permanecem)
Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso
noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas
no Palácio.
Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já
deveria ter feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é preciso alardear
publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes
cinco anos.
Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da
Constituição Federal. Sei quais são as funções do Vice. À minha natural
discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.
Entretanto, sempre tive ciência da absoluta
desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB.
Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e
partidário ao seu governo.
Basta ressaltar que na última convenção apenas 59,9%
votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, por que era eu o
candidato à reeleição à Vice.
Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo
usando o prestígio político que tenho advindo da credibilidade e do respeito
que granjeei no partido. Isso tudo não gerou confiança em mim, Gera
desconfiança e menosprezo do governo.
Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.
1. Passei os quatro primeiros anos de governo como
vice decorativo. A Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que
tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado
para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.
2. Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir
formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios,
secundários, subsidiários.
3. A senhora, no segundo mandato, à última hora, não
renovou o Ministério da Aviação Civil onde o Moreira Franco fez belíssimo
trabalho elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma indicação
minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato no dia
seguinte, ao telefone.
4. No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele
deixou o Ministério em razão de muitas "desfeitas", culminando com o
que o governo fez a ele, Ministro, retirando sem nenhum aviso prévio, nome com
perfil técnico que ele, Ministro da área, indicara para a ANAC. Alardeou-se a)
que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque faz parte de uma suposta
"conspiração".
5. Quando a senhora fez um apelo para que eu
assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava muito
desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema
difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários. Não
titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que
fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não
foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de lideres e bancadas ao longo
do tempo solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar
aquela coordenação.
6. De qualquer forma, sou Presidente do PMDB e a
senhora resolveu ignorar-me chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um
acordo sem nenhuma comunicação ao seu Vice e Presidente do Partido. Os dois
ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a menor
preocupação em eliminar do governo o Deputado Edinho Araújo, deputado de São
Paulo e a mim ligado.
7. Democrata que sou, converso, sim, senhora
Presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no
Parlamento. Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças
aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi
aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do
nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que
deveríamos reunificar o país. O Palácio resolveu difundir e criticar.
8. Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve
reunião de duas horas com o Vice Presidente Joe Biden - com quem construí boa
amizade - sem convidar-me o que gerou em seus assessores a pergunta: o que é
que houve que numa reunião com o Vice Presidente dos Estados Unidos, o do
Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da "espionagem"
americana, quando as conversar começaram a ser retomadas, a senhora mandava o
Ministro da Justiça, para conversar com o Vice Presidente dos Estados Unidos.
Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança;
9. Mais recentemente, conversa nossa (das duas
maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica sem nenhuma
conexão com o teor da conversa.
10. Até o programa "Uma Ponte para o
Futuro", aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas
para recuperar a economia e resgatar a confiança foi tido como manobra desleal.
11. PMDB tem ciência de que o governo busca promover
a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que,
como Presidente do PMDB, devo manter cauteloso silencio com o objetivo de procurar
o que sempre fiz: a unidade partidária.
Passados estes momentos críticos, tenho certeza de
que o País terá tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais.
Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em
mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã. Lamento, mas esta é a minha convicção.
Respeitosamente,
\ L TEMER
A Sua Excelência a Senhora
Doutora DILMA ROUSSEFF
DO. Presidente da República do Brasil
Palácio do Planalto
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