O Brasil tem que acatar essa condenação,
porque assinou tratados que obrigam a isso. Uma condenação internacional dessa
envergadura faria do Brasil um pária na comunidade internacional.
Dino observa também que, embora o
Supremo, até agora, se tenha limitado e contido na tarefa de examinar os
“ritos” do impeachment, em outros casos, como na nomeaçao de Lula para Casa
Civil, o Supremo não se viu obrigado a limitar-se.
Confira a íntegra da entrevista feita
por telefone.
PHA:
Eu vou conversar com o Governador do Maranhão, Flávio Dino (PcdoB). Eu acabo de
publicar no Conversa Afiada uma importante entrevista que o senhor deu ao El
País, da Espanha, em que o senhor se
pergunta se o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, vai comandar um processo
de impeachment da Presidenta da República que a Câmara não autorizou.
Acontece
que o próprio presidente da Câmara em exercício, o Waldir Maranhão, recuou da
decisão de suspender aquela sessão. A sua opinião continua a mesma ou o senhor
mudou?
Flávio
Dino: É claro que estamos diante de um fato novo, que foi
a revogação da decisão anterior do Waldir Maranhão, que enseja que possa haver
algum tipo de questionamento em torno do próprio mérito do recurso, que não foi
apreciado. A Advogacia Geral da União apresentou um recurso à Câmara, esse
recurso foi reiterado ao Senado, que pediu manifestação da Câmara, que decidiu
por intermédio do Presidente e depois voltou atrás.
O fato, portanto, é que, neste instante,
terça-feira à tarde, às 15h30, o que ocorre é que temos uma situação estranha
em que haverá uma votação no Senado sem que uma questão relevante tenha sido
resolvida no âmbito das casas parlamentares. Acho é uma razão suficiente para
haver um questionamento posterior ao STF a cerca dessa omissão: uma tese da
Defesa que até agora não foi apreciada.
PHA:
Ou seja, em última instância, o senhor acredita que o Supremo será obrigado a
arbitrar a questão do impeachment?
Flávio
Dino: Não há dúvida, pois temos questões jurídicas e
aspectos que são discutidos a cerca, por exemplo, do não enquadramento dessas
condutas supostamente atribuídas à Presidenta Dilma a nenhuma das figuras
típicas previstas na Constituição, como o crime de responsabilidade. Ou seja,
haveria, de um lado, uma desproporcionalidade dessas supostas condutas e, de
outro lado, temos fatos que são impossíveis de serem suprimidos do debate.
Um exemplo: a situação em que a
Presidenta Dilma, no que se refere ao Plano Safra, em que supostamente teria
cometido pedaladas, não é autor de um único ato material: ela não autorizou,
não assinou, não permitiu, não mandou. Então, como ela pode ser punida em uma
situação desse tipo, que não tem nenhuma conduta imputável a ela?
Agora se abriu um caminho novo que é
essa possibilidade de a Corte Interamericana se manifestar a partir da
provocação do próprio secretário da OEA.
PHA:
Mas o STF tem mantido uma posição-padrão, como
agora, por exemplo, na decisão do ministro Fux em relação ao pedido do
deputado Paulo Teixeira (PT-SP). Posiçao que eu posso traduzir mais ou menos em
termos leigos: 'isso é problema do Congresso. Não temos nada a ver com isso.
Não traga isso para cá'. É possível que o STF mantenha essa posição nos
próximos passos?
Dino:
O Supremo tem, no que se refere ao processo do impeachment, adotado uma posição
chamada de autocontenção ou autolimitação. É verdade que isso não se refere a
outras temáticas em que o Supremo tem sido extremamente ativista. Por exemplo,
o Supremo concedeu uma liminar para impedir posse de ministro de Estado (Lula
na Casa Civil - PHA). Então, há uma certa oscilação em torno dessas duas condutas
clássicas dos tribunais constitucionais entre autocontenção e ativismo.
Acho que não foi dada a oportunidade de
o Supremo debater a fundo essas questões
mais relativas ao que nós poderíamos chamar de aspectos jurídicos
constitucionais do impeachment. Acho que esse debate será travado no STF em um
momento próprio e adequado e acho que há espaço para que o Supremo ajude a que
as instituições políticas cheguem a um resultado justo. Pois, não podemos
imaginar que em um regime democrático a força da maioria (parlamentar) se
imponha a qualquer preço e a qualquer custo, independente de regras, pois
sabemos que o Judiciário, essencialmente, não é eleito para que possa manter um
nível de imparcialidade e ter a possibilidade de ser contra-majoritário, ou seja,
de ser guardião da minoria política ou social. O Supremo, se fosse apenas
guardião das maiorias, provavelmente não precisaria da sua existência. Bastaria
que o Senado ou a Câmara funcionasse como casa da Justiça.
Com base nisso, eu acho razoável supor
que tanto o Supremo como a Corte Interamericana vão ter algo a dizer sobre esse
estranho e absurdo processo que está em curso no Brasil.
PHA:
Qual o efeito de a Corte Interamericana se manifestar? Aqui, no Brasil, por
exemplo, o Supremo não tomou conhecimento da condenaçao da OEA à posição do
próprio STF sobre a Lei da Anistia.
Dino:
A Corte Interamericana é um tribunal com autoridade nacional, pois é regulado
no Direito Brasileiro. De modo que tem autoridade jurídica formal.
Evidentemente, por hipótese, a Corte emitindo uma decisão, você me pergunta se
é suscetível ser descumprida por um eventual governo (brasileiro). E eu digo que sim, porque essas instâncias
supranacionais têm o problema da execução das suas decisões. Mas, creio, Paulo,
que essa hipótese seria algo inusitado.
Por isso, acho que é necessário
enfrentar o debate no Senado, judicializar aquilo que for urgente, deixar as
questões posteriores para um outro momento no STF e, em última análise,
aguardar o resultado desse prosseguimento
que o próprio Secretário-Geral da OEA disse que vai levar à Corte
Interamericana, pois, de fato, ele tem razão: nós estamos diante de um processo
bastante grave e inusitado, em já que há uma violação flagrante da própria
natureza do Presidencialismo, em que uma maioria parlamentar pode revogar um
governo sem que essa própria maioria parlamentar possa ser sancionada.
No Parlamentarismo, tem a moção de
desconfiança, que revoga o mandato do chefe do governo. Porém, se o Parlamento
usar essa moção de modo desrazoado, o Chefe de Estado dissolve o Parlamento e
convoca eleições gerais.
No Brasil, o que temos é uma anomalia,
uma monstruosidade. Realmente, a opinião jurídica internacional assiste a tudo
isso perplexa e estupefata. Por isso, tenho fé que o Senado ou STF fará esse
debate com mais calma.
Como fica a situação em relação entre o estado e governo federal
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