O
encontro entre pastores evangélicos e a política é uma invenção americana – que
pegou bem no Brasil. Com retórica moralista, a bancada evangélica tem quase 40%
dos assentos do Congresso.
O
que a experiência da direita cristã dos Estados Unidos ensina sobre o Brasil de
Eduardo Cunha, Jair Bolsonaro e Marco Feliciano, expoentes do conservadorismo
no País?
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Pastor e deputado Marco Feliciano é acusado de tentar estuprar uma jornalista |
A
jornalista investigativa americana Sarah Posner, especialista na relação entre
política e religião, explica o poder de atração desse grupo e por que
escândalos financeiros e sexuais não abalam sua reputação
O Estado de S.Paulo
Mas o tele-evangelismo produziu uma
forma de varejo religioso que frequentemente ocorre fora de denominações protestantes
tradicionais, e atrai um tipo de charlatanismo que convive com a democracia
norte-americana de maneira intrigante. A jornalista investigativa Sarah Posner
é uma das maiores conhecedoras da direita evangélica nos Estados Unidos. Ela é
autora do livro God's Profits: Faith, Fraud, and the Republican Crusade for
Values Voters (Lucros de Deus: Fé, Fraude e a Cruzada Republicana pelos
Eleitores de Valores Morais), uma exposição da aliança republicana com
tele-evangelistas corruptos que exploram os chamados value voters, eleitores
cujo voto é motivado por questões como aborto e homossexualismo.
Posner tem analisado esta mais incomum
das campanhas presidenciais e narrado o racha que ocorre entre os evangélicos
tradicionais e os que dão apoio maciço a Donald Trump. O apelo de Trump para um
nicho demográfico – trabalhadores brancos de indústrias em declínio, com pouca
educação, cada vez mais excluídos pela economia globalizada, se completa com
sua mensagem: “Restaurar a América” (e a brancura) a um período de glória e
dominação. É a volta a um paraíso que, tanto esses eleitores, como os fiéis de
certos tele-evangelistas, nunca conheceram.
Quanto procurei a autora Sarah Posner
para conversar com o Aliás, ela soltou uma exclamação sobre este dado: 38% do
Congresso brasileiro é constituído por políticos evangélicos, um crescimento
extraordinário, se levamos em conta que não passavam de 9% no começo do
milênio. O censo do IBGE, em 2010, apontou que 22,4% dos brasileiros se
declaravam evangélicos e 65% da população se declarava católica. Como explicar
esse peso político desproporcional da chamada bancada da Bíblia? Na conversa
com Sarah Posner, ela oferece uma análise da situação norte-americana que ajuda
a explicar. Os indignados – os que são contra a legalização do aborto, por
exemplo – se mobilizam mais para se organizar e ir às urnas, especialmente num
país onde o voto não é obrigatório. Quando uma sociedade se liberaliza e se
torna mais secular, o zelo religioso tende a se tornar mais vocal. Uma década
antes de a Suprema Corte Americana confirmar o casamento entre pessoas do mesmo
sexo, grupos religiosos conseguiram passar leis definindo o casamento como
instituição entre um homem e uma mulher em 13 estados – uma discussão que vemos
hoje no Brasil, com o estatuto da família defendido massivamente pela frente
parlamentar evangélica.
Como a emergência de moralistas
políticos vai marcar o Brasil dos deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Marco
Feliciano (PSC-SP)? E como a experiência da direita cristã, agora desafiada pela
evolução demográfica de um país cada vez mais diverso como os Estados Unidos,
pode jogar luz sobre o momento brasileiro? No século 18, o filósofo alemão
Immanuel Kant, em seu ensaio clássico “Paz Perpétua” expressou confiança no
político moral. Mas o moralista político, escreveu, forja a moralidade de forma
a moldá-la para obter vantagens. A seguir, a conversa com Sarah Posner.
O
que marcou a emergência recente da direita cristã nos Estados Unidos?
O fenômeno não é tão recente como
pensam. O fim da segregação racial nas escolas e a proibição de oração e
bíblias em escolas públicas foram catalisadores da insatisfação de brancos
cristãos. Lembro também que, durante a Guerra Fria, a direita religiosa foi
ativa na luta anticomunista. Mas, com a decisão da Suprema Corte, em 1973, que
legalizou o aborto, a direita cristã se aliou de maneira mais organizada ao
Partido Republicano. A eleição de Ronald Reagan, em 1980, marca o primeiro
engajamento maciço dos evangélicos em uma campanha presidencial. Agora temos o
marco da passagem do casamento entre pessoas do mesmo sexo, na Suprema Corte.
Eles não esperavam isso, especialmente após ter obtido vitórias, na eleição de
2004, passando leis estaduais contra o casamento gay. Como estão reagindo?
Cerram fileiras em torno da “liberdade de religião”. É um slogan que se refere
à liberdade de religião garantida pela Constituição, mas quer promover a ideia
de que, se um comerciante cristão não quiser atender encomendas para um
casamento gay, poderia fazê-lo porque estaria exercendo seu direito, acima da
lei civil. Mesmo sabendo que vão se tornando minoria, querem demarcar
território para seu conservadorismo.
Por
que escândalos financeiros e de natureza sexual não parecem abalar a reputação
dos tele-evangelistas?
É uma subcultura com veia autoritária. O
pastor foi ungido para falar em nome de Deus. Ele é o mensageiro da verdade.
Quem se coloca contra o pastor é acusado de estar contra Deus ou seu apóstolo.
E críticas que vêm de fora são caracterizadas como coisa do demônio, inclusive
as que partem da mídia. É um mundo binário, do bem contra o mal, e os fiéis se
veem no papel de combater o mal. Sabemos que há temor de denunciar líderes de
uma igreja. Entrevistei vários ex-membros de igrejas que descrevem o mesmo tipo
de intimidação, seja para denunciar uma falcatrua financeira ou um malfeito
sexual. Mas note também que há circulação de fiéis entre as igrejas. Como quem
vai às compras eles podem trocar de pastor, em busca de uma mensagem que melhor
lhes convém.
O
seu trabalho expôs a demagogia de pastores de igrejas que não têm denominação
protestante tradicional, pregadoras do ‘evangelho da prosperidade’. Por que
continuam impunes?
Eles convencem os fiéis de que o dízimo
é prova de sua devoção a Deus. Há tanta gente em dificuldades financeiras que
continua a doar, enquanto vê seus pastores em carros de luxo, em mansões
milionárias. A reação frequente é achar que o pastor fez algo certo. Quando
reclamam, ouvem críticas à força de sua fé, e que é preciso doar mais para ter
“retorno” no investimento. Conversei com uma mulher da igreja do controverso
pastor John Hagee. Trato dele no livro. A igreja disse a ela que sua obrigação
era pagar o dízimo antes de pagar o aluguel. É o que evangélicos chamam de
“primeiros frutos”, a obrigação primordial é com a igreja.
Seu
livro narrou casos de exploração de fiéis com perfil bem escolarizado. Como se
deixam enganar?
A psicologia desta dinâmica é
complicada. Nos povos que valorizam sucesso material, a atração pela teologia
da prosperidade é maior, pela sensação de certeza que ela traz. A TV é um
instrumento forte de propagação. Redes cristãs como a Trinity e a Christian
Broadcasting Network têm público internacional e são imitadas no exterior. O
público vê um estilo de vida afluente, celebridades e diz: não é ganância, é a
vontade de Deus. Mesmo na Igreja Católica, não vejo disposição da Conferência
Nacional dos Bispos para promover frugalidade como prega o Papa Francisco.
Sabemos de bispos com estilo de vida muito abastado. Em 2014, tivemos uma
explosão de indignação com o arcebispo de Newark, que usou US$ 500 mil da
igreja para transformar sua casa de fim de semana numa mansão.
Os
escândalos de pedofilia na Igreja Católica vê o fim da impunidade garantida.
Como evangélicos lidam com seus escândalos sexuais?
Eles apareceram em várias igrejas,
especialmente sem denominação protestante tradicional, inclusive nas suas escolas.
E o jornalismo investigativo está expondo os casos, como no escândalo da Bob
Jones University. É uma escola fundamentalista cristã, que lidou com denúncias
de estupro e abusos durante décadas acusando as vítimas de ser responsáveis
pelos ataques que denunciavam. Há essa cultura de culpar vítimas e proteger
homens no poder. Mas a cultura de proteger poderosos não é exclusiva de
igrejas. Veja o escândalo atual com o fundador da Fox News, agora demitido,
Roger Ailes, o executivo mais influente da mídia conservadora. Ele é acusado de
assédio por mais de 20 mulheres. Várias pessoas em posições de poder vieram em
sua defesa.
Donald
Trump já defendeu o aborto, quase não menciona religião e tem passado notório
de farras em Nova York. Seu perfil é o oposto do eleitor que seleciona o
candidato por uma plataforma moral. Mesmo assim, mais de dois terços dos
evangélicos brancos parecem dispostos a votar em Trump. Como explicar este
apoio?
A surpresa não é menor entre quem
acompanha os evangélicos. Quando perguntamos a eles como podem apoiar Trump, se
contorcem em explicações que se resumem assim: está tudo errado com o país. Não
dá para ter só batalhas em questões como aborto ou homossexualismo. Os Estados
Unidos precisam de um homem forte que vai libertá-los do caminho do liberalismo
ideológico e moral e do secularismo. Ele fala contra muçulmanos, é atraente
porque ressalta essa história do choque de civilizações. E a maneira como ele
ataca o politicamente correto agrada demais, especialmente a evangélicos. Entenda
que atacar politicamente correto, neste caso, é linguagem em código para atacar
feministas, movimentos negros como o Black Lives Matter, que denuncia a
violência policial contra negros. Estamos vendo maior flutuação nas pesquisas.
No momento, o eleitorado evangélico branco é crucial para Trump. Há décadas, os
republicanos que chegaram à Casa Branca não têm recebido menos do que 70% do
apoio destes eleitores. Trump depende deles.
Porque na grande maioria é tudo mentira para prejudicar os evangélicos, assim como seu blog, desafio a postar a verdade quando vim a tona a farsa montada por essa garota mentirosa.
ResponderExcluirConcordo com o amig😃
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