Em nova denúncia contra o presidente,
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a três dias do término de seu
mandato, acusa o peemedebista e seus aliados mais próximos de 'ações ilícitas
em troca de propina por meio da utilização de diversos órgãos públicos, como
Petrobrás, Furnas, Caixa Econômica, Ministério da Integração Nacional e Câmara'
Rafael Moraes Moura, Breno Pires e
Beatriz Bulla
O Estado de São Paulo
O procurador-geral da República, Rodrigo
Janot, acusa o presidente Michel Temer (PMDB) de ter atuado como líder da
organização criminosa de seu partido desde maio de 2016. Temer foi denunciado
por Janot nesta quinta-feira, 14.
Esta é a segunda denúncia criminal de
Janot contra Temer. A três dias do término de seu mandato, o procurador-geral
imputa ao presidente organização criminosa e obstrução de Justiça. É a flechada
derradeira de Janot contra Temer.
Em junho, Janot acusou pela primeira vez
o presidente por corrupção passiva no caso JBS. A denúncia, porém, foi barrada
na Câmara em agosto.
Agora, o procurador acusa os integrantes
do chamado “quadrilhão do PMDB da Câmara”. São acusados além do presidente,
seus aliados mais próximos Eduardo Cunha, Henrique Alves, Geddel Vieira Lima,
Rodrigo Rocha Loures, Eliseu Padilha e Moreira Franco.
Segundo a denúncia, eles praticaram
ações ilícitas em troca de propina por meio da utilização de diversos órgãos
públicos, como Petrobras, Furnas, Caixa Econômica, Ministério da Integração
Nacional e Câmara dos Deputados.
Também há imputação do crime de
obstrução de justiça por causa dos pagamentos indevidos para evitar que Lúcio
Funaro firmasse acordo de colaboração premiada. Neste sentido, Michel Temer é
acusado de instigar Joesley Batista a pagar, por meio de Ricardo Saud,
vantagens a Roberta Funaro, irmã de Lúcio Funaro. Os três são denunciados por
embaraçar as investigações de infrações praticadas pela organização criminosa.
Apesar da tentativa, Lúcio Funaro firmou acordo de colaboração premiada com a
Procuradoria-Geral da República, que foi homologado pelo Supremo Tribunal
Federal, e as informações prestadas constam da denúncia.
O PGR pede o desmembramento do Inquérito
4327 em relação às condutas de Joesley Batista e Ricardo Saud, para que sejam
julgadas pela 13ª Vara Federal de Curitiba. Em relação ao inquérito 4483, ele
pede que cópia dos autos seja remetida à Seção Judiciária do Distrito Federal,
para avaliar as condutas de Lúcio Funaro, Roberta Funaro e Eduardo Cunha. Janot
explica na cota da denúncia que uma parte das provas foi obtida a partir dos
acordos de colaboração firmados com Joesley Batista e Ricardo Saud, que
sofreram rescisão por descumprimento das cláusulas, mas isso não limita a
utilização das provas apresentadas.
Organização criminosa
Segundo o PGR, o
esquema desenvolvido permitiu que os denunciados recebessem pelo menos R$ 587
milhões de propina. A denúncia explica que o núcleo político da organização era
composto também por integrantes do PP e do PT, que compunham subnúcleos
políticos específicos, além de outros integrantes do chamado “PMDB do Senado”.
Para Janot, em maio de 2016, com a reformulação do núcleo político da
organização criminosa, os integrantes do “PMDB da Câmara”, especialmente Michel
Temer, passaram a ocupar papel de destaque que antes havia sido dos integrantes
do PT em razão da concentração de poderes na Presidência da República.
O PGR faz um registro histórico das
nomeações e cargos ocupados desde que Lula foi vitorioso nas eleições
presidenciais e precisava de mais espaço no âmbito do Congresso Nacional.
Quanto ao grupo do “PMDB da Câmara”, as negociações de apoio passaram a
orbitar, por volta de 2006, primordialmente em torno de dois interesses: a
prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF); e
a necessidade de ampliação da base do governo em razão do processo do “Mensalão”
que havia enfraquecido o poder político da cúpula do Poder Executivo Federal
integrada por membros do PT.
Esses temas foram negociados por Michel
Temer e Henrique Alves, na qualidade de presidente e líder do PMDB, que
concordaram com ingresso do “PMDB da Câmara” na base do governo em troca de
cargos chaves, tais como a Presidência de Furnas, a Vice-Presidência de Fundos
de Governo e Loterias na Caixa Econômica, o Ministério da Integração Nacional,
a Diretoria Internacional da Petrobras, entre outros. No dia 30 de novembro de
2006, o Conselho Nacional do PMDB aprovou a integração da legenda, em bloco, a
base aliada do Governo Lula.
Com relação à interação entre os núcleos
político e administrativo da organização criminosa, a distribuição dos cargos
ocupados pelos membros deste núcleo (administrativo) no âmbito do governo federal foi sempre um processo
dinâmico, que envolvia constante tensão com o chefe do Poder Executivo federal
e marcado por fortes disputas internas por espaços. Isso porque todos estavam interessados
nos cargos públicos que lhes garantissem a melhor rentabilidade em termos de
arrecadação de propina.
Segundo a denúncia, o papel de negociar
os cargos junto aos demais membros do núcleo político da organização criminosa,
no caso do subnúcleo do “PMDB da Câmara”, era desempenhado por Michel Temer de
forma mais estável, por ter sido ele o grande articulador para a unificação do Partido em torno do governo Lula.
Depois de definidos os espaços que seriam ocupados pelo grupo dos denunciados,
Michel Temer e Henrique Eduardo Alves, este último líder do Partido entre 2007
e 2013, eram os responsáveis maiores pela distribuição interna dos cargos, e
por essa razão recebiam parcela da propina arrecadada por Moreira Franco,
Geddel Vieira Lima, Eliseu Padilha e especialmente Eduardo Cunha.
Eliseu Padilha, Geddel Vieira Lima,
Henrique Eduardo Alves, Moreira Franco e Rodrigo Loures têm relação próxima e
antiga com Michel Temer, daí porque nunca precisaram se valer de intermediários
nas conversas diretas com aquele. Eram eles que faziam a interface junto aos
núcleos administrativo e econômico da organização criminosa a respeito dos
assuntos ilícitos de interesse direto de Michel Temer, que, por sua vez, tinha
o papel de negociar junto aos demais integrantes do núcleo político da
organização criminosa os cargos a serem indicados pelo seu grupo e era o único
do grupo que tinha alguma espécie de ascensão sobre todos.
O procurador-geral informa que, além de
praticar infrações penais no Brasil, a organização criminosa adquiriu caráter
transnacional, o que pode ser demonstrado, principalmente, por dois de seus
mecanismos de lavagem de dinheiro: transferências bancárias internacionais, na
maioria das vezes com o mascaramento em três ou mais níveis para distanciar a origem
dos valores; e a aquisição de instituição financeira com sede no exterior, com
o objetivo de controlar as práticas de compliance e, assim, dificultar o
trabalho das autoridades.
Transição de governo
Explica-se a
rápida ascensão de Eduardo Cunha no âmbito do PMDB e na organização criminosa,
entre outros fatores, por sua atuação direta e incisiva na arrecadação de
valores lícitos ou ilícitos; e pelo mapeamento e controle que fazia dos cargos
e pessoas que o ajudariam nos seus projetos. Em 2015, a relação entre os
integrantes do “PMDB da Câmara” e a ex-presidente Dilma Rousseff estava
fortemente abalada, especialmente pela exoneração de Moreira Franco da
Secretaria de Aviação Civil sem prévio ajuste com Michel Temer.
No início de 2015, Eduardo Cunha decidiu
não observar o acordo de alternância entre PT e PMDB e lançou-se candidato à
Presidência da Câmara dos Deputados numa disputa com o candidato do PT Arlindo
Chinaglia. Esse episódio marcou uma virada importante no relacionamento entre
os integrantes do núcleo político da organização criminosa do “PMDB da Câmara”
e do PT. Os caciques do PMDB achavam que o governo não estava agindo para
barrar a Operação Lava Jato em relação aos “aliados” por que queriam que as
investigações prejudicassem os peemedebistas; já os integrantes do PT da
organização criminosa desconfiavam que aqueles queriam fazer uma manobra
política para afastar a então presidente Dilma do poder e assumir o seu lugar.
Em março de 2016, o PMDB decidiu deixar
formalmente a base do governo e, em abril de 2016, o pedido de abertura de
impeachment da Presidente Dilma Rousseff foi aprovado pela Câmara dos
Deputados. Michel Temer assumiu a Presidência da República em 12.05.2016,
provisoriamente, e, em definitivo, no dia 31 de agosto de 2016. Na sua gestão,
garantiu espaços relevantes aos líderes do PP e do PMDB que já pertenciam a
organização criminosa.
A denúncia também destaca que, ante a
forte atuação parlamentar e responsabilidade por outras indicações políticas,
as quais ainda perduram, a organização criminosa permaneceu praticando crimes
nos anos de 2015, 2016 e 2017. Nesse sentido, aplica-se a lei vigente a partir
de setembro de
2013 (Lei nº 12.850/13). Conduta
permanente, mesmo iniciada antes dessa data, passa a ser regida pela nova lei,
nos termos do enunciado da Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal.
COM A PALAVRA, CEZAR BITENCOURT, QUE
DEFENDE RODRIGO ROCHA LOURES
“Rodrigo Rocha Loures não participou de
nenhum acordo de pagamento ou recebimento de propinas atribuído ao PMDB da
Câmara.Rodrigo era apenas um assessor pessoal do Presidente e não tinha nenhuma
intervenção em atividades financeiras, ao contrário da recente denúncia contra
o PMDB da Câmara. A defesa repudia
veemente mais uma denúncia leviana de Rodrigo Janot!!!”
COM A PALAVRA, DANIEL GERBER, QUE
DEFENDE ELISEU PADILHA
Sobre a denúncia por organização
criminosa feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot ao Supremo
Tribunal Federal, contra o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, o advogado
Daniel Gerber que defende o ministro afirma: “Entendo como equivocada o
oferecimento de uma denúncia com base em delações que estão sob suspeita, mas
iremos demonstrar nos autos a inexistência da hipótese acusatória”.
COM A PALAVRA, O ADVOGADO DELIO LINS E
SILVA JÚNIOR, QUE DEFENDE EDUARDO CUNHA
Sobre a nova denúncia oferecida pela
PGR, a defesa de Eduardo Cunha tem a dizer que provará no processo o absurdo
das acusações postas, as quais se sustentam basicamente nas palavras de um
reincidente em delações que, diferentemente dele, se propôs a falar tudo o que
o Ministério Público queria ouvir para fechar o acordo de colaboração.
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