Um juiz de São Paulo usou termos chulos
para se referir a membros do governo Jair Bolsonaro (sem partido), em sentença
publicada na quinta-feira (16) sobre um processo trabalhista. “A merdocracia neoliberal neofascista está aí
para quem quiser ou puder ver”, afirmou Jeronimo Azambuja Franco Neto, da 18ª
Vara do Trabalho de São Paulo, na decisão.
O magistrado condenou um restaurante a
pagar indenização de R$ 10 mil por danos morais e a comprovar o pagamento do
piso salarial para os funcionários, assim como seguro de vida, de acidentes, e
assistência funerária. Ainda cabe recurso da decisão.
Em sua justificativa para atender ao
pedido feito em ação movida pelo sindicato da categoria contra o
estabelecimento, o juiz cita vários ministros do governo federal e o próprio
presidente.
“O ser humano Weintraub no cargo de
Ministro da Educação escreve ‘imprecionante’. O ser humano Moro no cargo de
Ministro da Justiça foi chamado de ‘juizeco fascista’ e abominável pela neta do
coronel Alexandrino. O ser humano Guedes no cargo de Ministro da Economia
ameaça com AI-5 (perseguição, desaparecimentos, torturas, assassinatos) e disse
que ‘gostaria de vender tudo’. O ser humano Damares no cargo de Ministro da
Família defende ‘abstinência sexual como política pública’. O ser humano
Bolsonaro no cargo de Presidente da República é acusado de ‘incitação ao
genocídio indígena’ no Tribunal Penal Internacional. Eles não estão aí de graça.
Há bilionários e asseclas por trás de sabujos em golpes de estado promovidos em
guerra híbrida, como no desvirtuamento da mecânica jurídica em um verdadeiro
mecanismo neofascista”, afirma no texto.
“[…] Creio que as palavras supra bem
elucidam o que denomino merdocracia, isso mesmo, o poder às merdas. […]No
aspecto do trabalho, são também exemplos da proliferação neofascista a
cadavérica Reforma Trabalhista. […] E aqui nem preciso lembrar as múltiplas
medidas provisórias, melhor designadas de merdas progressivas oriundas do
Presidente da República”, diz.
Ao analisar o caso, o magistrado define
a realidade brasileira como “merdocracia”. “O sufixo "cracia"
significa poder e domínio. Já o substantivo "merda" pode significar
excrementos orgânicos, alguém pejorativamente ou interjeição de sorte no meio
cultural (a ser vítima de diversas censuras, como no caso do filme Marighella,
censurado no Brasil, ou na censura judicial ao Especial de Natal do Porta dos
Fundos). A acepção aqui privilegiada é aquela quando referida a uma merda
feita, uma cagada, ou seja, fez algo errado. Em suma, merdocracia vem a
sintetizar o poder que se atribui aos seres humanos que fazem merdas e/ou
perpetuam as merdas feitas. E tudo isso em nome de uma pauta que se
convencionou chamar neoliberal, ou seja, libertinar a economia para que as
merdas sejam feitas. Mas há a merda fundamental por trás dessa pauta. A
existência do Estado nos marcos da Declaração Universal dos Direitos Humanos
(1948) e da Constituição do Brasil (1988) é voltada à promoção da igualdade e
dos direitos humanos fundamentais, elementos de inteligência odiados pela
ignorância merdocrata”, argumenta.
O texto da sentença também afirma que as
pessoas são “bombardeadas pelas merdas (como no caso das fake news) de modo a
se construir uma identidade fascista. Cada um se torna seu próprio algoz e/ou
algoz dos demais movido pelo ódio ao indesejado”.
Ele também critica o procurador da República
Deltan Dallagnol que, segundo ele, “imbuído da lucratividade com suas palestras
e holofotes (como revela The Intercept Brasil), propagou fazer jejum para o
aprisionamento de Lula em um sistema penal, como já dito, fracassado e racista
no Brasil. Cabe lembrar que Jesus Cristo vivia como mendigo nômade a perambular
na pobreza, amava os odiados, como leprosos e prostitutas, e foi crucificado
pelo sistema penal da época”.
O magistrado argumenta que a
“merdocracia neoliberal neofascista está aí para quem quiser ou puder
ver". "A ela esta decisão não serve, pelo contrário, visa a
contribuir para sua derrocada." Por fim, o juiz afirma o lugar de fala de
sua decisão não é voltado ao mercado e nem ao lucro, mas “ao trabalho humano
digno voltado à igualdade e aos direitos humanos fundamentais”.
Leia a íntegra da sentença
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