Em resposta a ministro do STF, PGR afirma que Mendes usa o cargo para
se proteger e perdeu o referencial de "decência e retidão"
Em discurso na Escola Superior do Ministério Público da União, Janot
defendeu a Operação Lava Jato e recomendou a realização de uma "urgente
reforma no sistema político-partidário", pois a política "não pode
continuar a ser uma custosa atividade de risco propícia para aventureiros sem
escrúpulos."
Na sequência, Janot criticou o que vê como "críticas
injustas" ao Ministério Público e disse que a instituição "não engana
a ninguém e não costuma vender ilusões ou fantasias".
Janot rebateu de forma veemente a informação publicada pela ombudsman
do jornal Folha de S.Paulo, Paula Cesarino Costa, segundo quem os nomes dos
alvos de inquérito oriundos das delações da Odebrecht foram repassados por um
integrante da PGR a jornalistas em uma "coletiva em off". "É uma
mentira, que beira a irresponsabilidade, afirmar que realizamos, na PGR,
coletiva de imprensa para 'vazar' nomes da Odebrecht", afirmou.
Na sequência, Janot não citou Gilmar Mendes, mas seu discurso deixou
evidente que a fala era uma resposta ao ministro, também presidente do Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), que na terça-feira 21 usou o artigo da Folha como
base para suas acusações contra a PGR.
Em um trecho que não estava previsto no discurso (leia a íntegra
abaixo), Janot deixou claro que respondia a Mendes. “Não vi uma só palavra de
quem teve uma disenteria verbal a se pronunciar sobre essa imputação ao Palácio
do Planalto, ao Congresso e ao STF", afirmou segundo site jurídico Jota.
"Procuramos nos distanciar de banquetes palacianos. Fugimos dos
círculos de comensais que cortejam desavergonhadamente o poder político",
disse Janot. Gilmar Mendes, figura próxima ao PSDB, é um assíduo frequentador
de jantares com Michel Temer e outros poderosos de Brasília.
"Ainda assim, em projeção mental, alguns tentam nivelar a todos à
sua decrepitude moral, e para isso acusam-nos de condutas que lhes são
próprias, socorrendo-se não raras vezes da aparente intangibilidade
proporcionada pela posição que ocupam no Estado", afirmou.
Ainda de acordo com Janot, "sempre houve, na história da
humanidade, homens dispostos a sacrificar seus compromissos éticos no altar da
vaidade desmedida e da ambição sem freios". São pessoas, afirmou, que
"não hesitam em violar o dever de imparcialidade ou em macular o decoro do
cargo que exercem; na sofreguidão por reconhecimento e afago dos poderosos de
plantão, perdem o referencial de decência e de retidão".
Para Janot, não é preciso "se impressionar com a importância"
que esses "difamadores" parecem "transitoriamente
ostentar". Para encerrar, disse Janot, "compartilho com os senhores a
advertência do mestre Montesquieu que sempre tive presente comigo: o homem
público deve buscar sempre a aprovação, mas nunca o aplauso. E, se o busca,
espera-se, ao menos, que seja pelo cumprimento do seu dever para com as leis;
jamais por servilismo ou compadrio".
O que disse
Gilmar Mendes
Na terça-feira, Gilmar Mendes acusou a PGR de vazar para a imprensa
nomes de pessoas citadas nas delações da Odebrecht. Para o ministro, a
publicação de informações da Lava Jato que estão sob sigilo é uma forma de
"desmoralização da autoridade pública" e alimenta uma "caça de
escândalos para espetaculização".
"A Procuradoria-Geral da República tem que prestar a este tribunal
as explicações sobre esses fatos. Não haverá justiça com procedimentos à margem
da lei. As investigações devem ter por objetivo produzir provas e não entreter
a opinião pública ou demonstrar autoridade. Quem quiser cavalgar escândalo
porque está investido de poder de investigação, está abusando de seu
poder", disse.
Confira a
íntegra do discurso de Rodrigo Janot
Colegas,
A Lava Jato completou neste mês de março três anos de profícuos
trabalhos. Do que se revelou no curso das investigações, é possível concluir
que existem basicamente duas formas de corrupção no país: a econômica e a
política. Elas não se excluem e, em certa medida, tocam-se e interagem. A
primeira, sempre combatida e bem conhecida do Ministério Público, tem fundamentalmente
uma finalidade financeira: o corrupto busca o enriquecimento com a venda de facilidades.
Normalmente, esse tipo de corrupção encontra-se em profusão nas camadas inferiores da estrutura burocrática
do Estado.
A segunda, até então mais intuída do que propriamente conhecida, é
ambiciosa e mais lesiva. O proveito econômico não está na sua alçada principal,
mas antes o poder. Enriquecer pela corrupção política é mais uma consequência
do que propriamente um objetivo. Busca-se o poder, porque o dinheiro e suas
facilidades chegam de arrasto.
O mérito da Lava Jato foi haver encontrado o veio principal da
corrupção política. Esse tipo de corrupção, como disse, é de altíssima
lesividade social porque frauda a democracia representativa, movimenta bilhões
de reais na clandestinidade e debilita o senso de solidariedade e de coesão, essenciais
a uma sociedade saudável.
Escolhas para altos postos na estrutura do Estado, nas suas autarquias
e empresas passam a não considerar a competência técnica do candidato, mas sua
disposição para trabalhar na engrenagem arrecadadora de recursos espúrios
destinados à máquina partidária que o apadrinhou. Desde o mensalão, essa
realidade já começava a revelar seus contornos com mais nitidez. No entanto,
foi nesses últimos três anos que a dura e inocultável verdade se mostrou por completo:
nosso sistema político-partidário foi conspurcado e precisa urgentemente de
reformas. É necessário abrir espaço para a renovação o quanto antes, pois a
política não pode continuar a ser uma custosa atividade de risco propícia para
aventureiros sem escrúpulos.
Certamente, essa crise política há de encontrar o devido equacionamento
no âmbito do próprio sistema democrático. Serão as forças políticas da sociedade,
dentro da institucionalidade, que, após debate e reflexão, devem apontar caminhos
para que levem à quebra do círculo vicioso em que o país se encontra.
A nós do Ministério Público cabe um papel modesto nesse processo, mas
de grande relevância social. Devemos dar combate, sem tréguas, ao crime, à
corrupção e às tentativas de fraudar-se a lisura do processo eleitoral.
É nesse contexto que o papel dos senhores, Procuradores Regionais
Eleitorais, avulta em importância institucional. Muitos dos desvios do poder
político podem e devem ser prevenidos e reprimidos, quando for o caso, já no
processo eleitoral.
Precisamos intensificar, assim, a fiscalização do financiamento das
campanhas, combater firmemente o caixa 2 e promover obstinadamente a responsabilização
de quem não respeita o fair-play do jogo democrático e abusa do poder econômico
e político para vencer ilegitimamente eleições.
O filtro do processo eleitoral, do qual o Ministério Público é
importante componente, é fundamental para melhorar a qualidade de nossa política. Não é fácil a
nossa missão, bem o sei. Para mim, já se vão 32 anos de árdua labuta nesta
Casa.
Tenho afirmado reiteradamente que o Ministério Público não engana a
ninguém e não costuma vender ilusões ou fantasias. Quem busca atalhos e facilidades,
de fato, não terá aqui o melhor lugar para encontrá-los.
Digo isso porque, mesmo quando exercemos nossas funções dentro da mais
absoluta legalidade, estamos sujeitos a severas e, muitas vezes, injustas críticas
de quem teve interesses contrariados por nossas ações. A maledicência e a má-fé
são verdugos constantes e insolentes.
Não quero deter-me no fato específico, mas não posso deixar de repudiar
com toda veemência a aleivosia que tem sido disseminada para o público nos
últimos dias: é uma mentira, que beira a irresponsabilidade, afirmar que
realizamos, na Procuradoria-Geral da República, coletiva de imprensa para
“vazar” nomes da Odebrecht.
Só posso atribuir tal ideia a mentes ociosas e dadas a devaneios, mas,
infelizmente, com meios para distorcer fatos e desvirtuar instrumentos legítimos
de comunicação institucional. Refutei pessoalmente o fato para os próprios
representantes do veículo de comunicação que publicou a matéria inverídica.
Procuramos nos distanciar dos banquetes palacianos. Fugimos dos
círculos de comensais que cortejam desavergonhadamente o poder político. E repudiamos
a relação promíscua com a imprensa.
Ainda assim, meus amigos, em projeção mental, alguns tentam nivelar a
todos à sua decrepitude moral, e para isso acusam-nos de condutas que lhes são
próprias, socorrendo-se não raras vezes da aparente intangibilidade proporcionada
pela posição que ocupam no Estado.
Infelizmente, precisamos reconhecer que sempre houve, na história da
humanidade, homens dispostos a sacrificar seus compromissos éticos no altar da
vaidade desmedida e da ambição sem freios.
Esses não hesitam em violar o dever de imparcialidade ou em macular o
decoro do cargo que exercem; na sofreguidão por reconhecimento e afago dos
poderosos de plantão, perdem o referencial de decência e de retidão.
Não se impressionem com a importância que parecem transitoriamente
ostentar. No fundo, são apenas difamadores e para eles, ouvidos moucos é o que
cabe e, no limite, a lei. Não somos um deles, e isso já nos basta.
Para encerrar, compartilho com os senhores a advertência do mestre
Montesquieu que sempre tive presente comigo: o homem público deve buscar sempre
a aprovação, mas nunca o aplauso. E, se o busca, espera-se, ao menos, que seja
pelo cumprimento do seu dever para com as leis; jamais por servilismo ou
compadrio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário